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Sinopse

Alfa tem como protagonista um jovem que, após cair de um penhasco e se perder da sua tribo, precisa sobreviver em meio a paisagens selvagens e encontrar o caminho de casa. Atacado por uma matilha, ele consegue ferir um dos lobos, mas decide não matar o animal. O jovem cuida dele e os dois começam uma relação de amizade.

Crítica

Ambientado na Europa de 20.000 anos atrás, Alfa se fundamenta numa jornada de amadurecimento. Organizados tribalmente, os humanos caçam para garantir a subsistência dos seus. Nesse cenário, construído desde o princípio com um maneirismo visual contraproducente, pois saturado e artificial, o protagonista é o jovem Keda (Kodi Smit-McPhee), filho do líder, cuja bravura é posta à prova. O cineasta Albert Hughes ensaia debruçar-se sobre um conflito geracional, vide os sintomáticos insucessos do menino em atividades, como o abate de um javali imponente, que supostamente atestariam sua capacidade de encabeçar o povo. Todavia, a fragilidade dramática não demora a se impor, minando, para começo de conversa, a profundidade da tensão potencialmente instaurada entre pai e filho. É tudo articulado de maneira trôpega e inocente. Conflitos esmaecem sem deixar rastros. Um evento traumático muda os rumos da trama, mas não a sua fragilidade.

Alfa é asfixiado pela vontade pouco justificada de oferecer planos “belos” acima de tudo. A fotografia a cargo de Martin Gschlacht reforça a prevalência do caráter postiço, com um excesso inexplicável de contraluzes e silhuetas desenhadas pelo resplandecer do horizonte de cartão postal. Tampouco a rusticidade desse mundo guiado pelos mais fortes é devidamente encenada, já que as coisas caminham pela senda do sentimentalismo. O incidente que faz Keda ficar para trás provoca virada. Ele não tem mais o olhar atento e protetor do pai. Portanto, a necessidade faz com que aprenda sobre a natureza e suas leis nem sempre justas. Obrigado pela fome, o garoto deixa de lado a piedade que outrora simbolizara seu bom coração, a excepcionalidade de uma ética com outros seres vivos. Há, então, uma contradição maquiada de pragmatismo, vide a força que o longa-metragem faz para delinear o protagonista como alguém fora da curva. E dá-lhe fundo verde mal disfarçado.

Recorrendo a diálogos sofríveis e reiterativos, Hughes amplifica o piegas com a entrada em cena do lobo. Corroborando a vanguarda aludida pela narração inicial, há a representação da domesticação de certos bichos. Passada a fase de ressalvas e agressividade, o selvagem companheiro lupino cada vez mais se assemelha a um cão, chegando ao cúmulo de buscar um graveto e leva-lo ao novo amigo. Alfa possui uma narrativa pueril, cujo investimento maior é numa grandiloquência visual que pretensamente deveria revestir de magnitude essa caminhada rumo ao engrandecimento do protagonista. O realizador aposta suas fichas principais no desenho da amizade de Keda e Alfa, oferecendo momentos bobos, com direito a sobe som frequente para acentuar o tom melodramático. Afora a improbabilidade da travessia daquela paisagem nevada, existe a praticamente nula dramaticidade, com instantes de tensão rapidamente soterrados para dar lugar a congêneres.

Com arte e maquiagem frágeis, Alfa transborda artificialidade. Da portentosa (mas vazia) direção de fotografia à condução do elenco quase inexpressivo, pouco se salva. A interação de Keda com o pai é um subterfúgio, bem como os inúmeros sacrifícios ao longo do caminho. Uma perna praticamente gangrenada e fraturada não é problema diante da tenacidade do rapaz determinado a sobreviver e voltar à família. Nesse sentido, o lobo é seu espelho, pois também ferido, mas valente e resoluto. O cineasta sequer é capaz de desenvolver o dilema básico quando a alcateia reaparece. Combalido por uma inconsistência praticamente integral, o filme cai na trivialidade, trabalhando seus personagens a partir do que lhes é superficial, preterindo qualquer aprofundamento em prol de uma fábula corriqueira e apelativa, imageticamente carregada de signos que a banalizam bastante, reduzida pela tentativa de emocionar o espectador, sem conteúdo condizente com a tarefa.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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