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Crítica


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10 votos 8.4

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Sinopse

A trama acompanha a história de Claire Simmons , que fica fascinada com o suicídio de Nina, uma integrante do seu grupo de apoio para pacientes com dor crônica e começa a investigar a sua vida. Aos poucos, ela desenvolve uma relação inesperada com o ex-marido de Nina, Roy.

Crítica

Às vezes um papel certeiro e duradouro pode tirar a versatilidade de uma estrela. Por anos, Jennifer Aniston viveu variações de sua Rachel da sitcom Friends. Também pudera. Foram dez anos à frente do seriado. Seus papeis no cinema nunca foram tão desafiadores neste sentido. Talvez, no máximo, em Por um Sentido na Vida (2002), um momento de maior introspecção, mas que não fez tanto barulho. Pois se havia alguma dúvida de seu potencial dramático, ela se dissipa neste Cake: Uma Razão para Viver, bom filme que, apesar de não ser um dos melhores dos últimos tempos, explora o talento da atriz. Não à toa ela foi indicada a tantos prêmios e quase concorreu ao Oscar deste ano pelo papel.

Aqui ela é Claire, uma advogada viciada em remédios para dor que sofre de depressão. O motivo não é revelado de cara e, apesar de não ser uma surpresa, é conduzido de forma interessante para que entendamos a personagem do jeito que ela é: fria, fechada, sarcástica com a própria dor e a dos outros. Ela frequenta um grupo de terapia em que uma de suas companheiras (Anna Kendrick) se suicida, levando a protagonista a querer entender os motivos que levaram a garota a tomar decisão tão drástica e deixar a família. Não à toa, Claire acaba se envolvendo um pouco no drama do viúvo. Mas será que esta não é apenas uma fuga para sua própria dor e falta de perspectiva? Ou será que ela também sente tendências suicidas.

O roteiro de Patrick Tobin não dá uma resposta fácil para o dilema enfrentado na tela. Claire é um barril de pólvora pronto para explodir a qualquer momento. Quem lhe confere um pouco de humanidade é sua empregada, Silvana (Adriana Barraza, incrível e indispensável), que se preocupa com a patroa como se fossem melhores amigas. E são mesmo. Uma entende a outra, numa química impressionante entre atrizes tão distintas. Até entendermos por completo o que ocorreu no passado da protagonista, só sabemos que sua dor, física e emocional, é tão grande que ela fere os outros sem pestanejar. E o pior: sem se dar conta, muitas vezes. Seu jeito seco esconde uma tristeza profunda que nem o sexo casual com um dos empregados da casa faz com que ela esqueça. Nem seu ex-marido (Chris Messina) consegue se aproximar dela, ainda que seja visível o quanto um gosta do outro, ainda que de um jeito torto (mais por ela do que por ele, é claro).

E é claro que para criar uma figura tão ímpar é preciso um intérprete de talento, o que nos traz de volta à questão de Jennifer Aniston. Ela engordou, não utilizou maquiagem para ficar bonita (pelo contrário, apenas para fazer marcas no corpo que podem remeter ao seu trauma) e incorporou a personalidade gélida que seu alterego pede aqui. Cada movimento é dolorido para a personagem, o que é perceptível não apenas nas caras de dor que Aniston (extremamente oportunas e realistas, vale ressaltar), mas também no seu timbre de voz, que de autoritário passa para o sofrido, uma voz de quem não consegue articular direito as palavras muitas vezes. Além de tudo, é difícil adivinhar o que Claire está pensando. Ela simplesmente age por instinto, ciente da sua condição física, parecendo querer causar mais dor a si, como se dissesse para o espelho que merece tudo aquilo que está acontecendo.

O diretor Daniel Barnz traça um retrato interessante da depressão, ainda que utilizar Anna Kendrick em aparições fantásticas para a personagem de Aniston pareça um tanto quanto apaziguador para o intenso drama que se revela. O espírito ou miragem da conhecida morta serve como papel questionador do que Claire fará a partir de então com a própria vida: afinal, ela vai querer aprender a lidar com a dor ou vai fazer o mesmo e se jogar de uma ponte? Aniston traz uma personagem à beira do precipício que parece não se importar mais com a própria vida. Afinal, de que adianta sobreviver após tantos traumas e uma intensa dor física que mal faz com que ela ande direito?

A resposta que muitos querem saber é positiva: sim, Aniston merecia estar entre as indicadas a Melhor Atriz no Oscar deste ano. Porém, Cake: Uma Razão para Viver mostra muito além e é quase uma metáfora da carreira da atriz. Afinal, quando ela vai acordar e parar de viver de forma cíclica em torno dos mesmos problemas? Com este papel, a eterna Rachel parece ter finalmente acordado para o bom cinema. Agora, se você quer saber se Claire também desperta, a saída é procurar o cinema mais próximo. E, acima de tudo, entender que sentimentos não são brincadeira. Se forem guardados a sete chaves, podem causar mais danos do que qualquer acidente, não dando chance para um simples e delicioso bolo resolver.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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