Crítica
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Sinopse
Chappie é uma criança talentosa e especial, cercada de diferentes influências – algumas boas, outras ruins – e ele terá que confiar no que sua alma diz para encontrar seu lugar no mundo. A única diferença de Chappie para as outras crianças é que ele é um robô, o primeiro com a capacidade de pensar e ter sentimentos próprios. Em uma sociedade na qual a segurança é feita por máquinas, essa habilidade pode o colocar em perigo, já que para as forças do governo um ser que pensa por si mesmo é um risco para a ordem das coisas.
Crítica
É preciso ter paciência para conseguir apreciar o que Neill Blomkamp tenta realizar em Chappie, sua nova ficção científica que o leva de volta ao seu país de origem, a África do Sul. Se na obra prima Distrito 9 (2009) e no bom Elysium (2013) o diretor deixava claro qual era a mensagem logo em seus primeiros minutos, dessa vez só compreendemos tudo o que o cineasta pretende com a história quando ela chega ao seu final. São 90 minutos de um filme um tanto bagunçado e com personagens que beiram o cartunesco para chegarmos aos 30 minutos finais, nos quais o longa-metragem realmente se salva. A pergunta que você pode se fazer é: vale a pena investir duas horas para apenas trinta minutos de satisfação? Se você gosta de ficção científica e tem apreço pelos trabalhos anteriores de Blomkamp, a resposta é sim.
A trama, assinada pelo diretor ao lado da esposa Terri Tatchell, nos coloca em uma Johanesburgo futurista, onde a força policial humana está paulatinamente dando lugar a robôs. Eles fazem o trabalho mais perigoso e tem conseguido ótimos resultados ao reduzir a violência na cidade. O sucesso é tamanho que a empresa Tetravaal, responsável pelos policiais robóticos, recebe encomenda de mais unidades, o que deixa a CEO Michelle Bradley (Sigourney Weaver) satisfeitíssima com o trabalho do criador dos androides, Deon Wilson (Dev Patel). Ele, no entanto, ainda deseja mais para seus robôs. Uma inteligência verdadeira, não artificial. Depois de muito trabalho, ele consegue seu intento, mas é rechaçado pela chefe. Contrariando ordens, Deon atualiza uma unidade rejeitada e cria um robô que pensa por si, batizado de Chappie (voz de Sharlto Copley). No meio do caminho desta revolucionária experiência, Deon é sequestrado por um trio de bandidos mequetrefes que planeja utilizar a força policial robótica para seu proveito. Se não bastasse isso, o invejoso engenheiro da Tetravaal Vincent Moore (Hugh Jackman) quer de todas as formas descontinuar a invenção de Deon e colocar nas ruas a sua versão robótica policial, que necessita um humano a controlando. Em linhas gerais, isso é Chappie.
Em entrevistas, Blomkamp comparou seu trabalho como uma mistura entre Robocop: O Policial do Futuro (1987) e E.T.: O Extraterrestre (1982), mas com bom humor. Chappie nunca chega perto de suas referências em matéria de qualidade e até seu senso de humor não funciona tão bem – a não ser o ridículo cabelo de Hugh Jackman, as piadas jogadas no roteiro não se sustentam.
Como o título já pressupõe, a real força do filme está em Chappie e ele demora demais para se desenvolver a ponto de que nos importemos com seu bem estar ou futuro. Na primeira hora, ele é um robô como todos os outros (talvez mais azarado) e a partir da sua consciência adquirida, é um bebê que precisa aprender a se comportar. Sob o poder do trio de bandidos, Chappie aprende malandragens, mas tem no seu criador a bússola moral para não fazer maldades. Como não distingue certo do errado, é manipulado facilmente e suas ações deixam o povo temeroso em relação aos até então confiáveis policiais robôs. Só nesta segunda metade do filme e, principalmente na meia hora final, é que Chappie diz a que veio e se transforma em um herói interessante de ser acompanhado. Sua relação com seu criador ou com sua “mãe” Yolandi (Yo-Landi Visser) transforma-se no coração da história e suas ações mostram o quão humano aquele robô se tornou.
Esta é a parte que salva Chappie. As discussões a respeito da consciência humana e se é possível uma máquina conseguir refletir e sentir como uma pessoa real são os pontos altos do filme. Da mesma forma, existe uma inversão proposta nos últimos vinte minutos – que não será revelada aqui para não estragar surpresas – mas que nos faz questionar se o contrário é possível. Esta mudança de foco, nada previsível, é uma feliz surpresa do filme, que deixa o espectador sair do cinema se perguntando a respeito das possibilidades daqueles experimentos finais.
Este desfecho nos faz querer perdoar os personagens inverossímeis – Ninja, o chefe do trio de bandidos, muda completamente de comportamento em pouquíssimos minutos, se transformando quase em um herói sem mostrar qualquer sinal de mudança até pouco tempo antes – e a bagunça narrativa do filme como um todo. Um exemplo claro é a forma como o vilão de Hugh Jackman é claramente desperdiçado. O personagem é esquecido por boa parte da história, nunca sendo realmente desenvolvido. É fácil tentar imaginar o filme sem sua presença, inclusive. O mafioso Hippo (Brandon Aurent) poderia muito bem ser o nêmesis final sem qualquer tipo de prejuízo para a trama. Uma pena o desperdício de Jackman, visto que o ator raramente encara personagens de moral desviada e, pior, acaba sendo esquecido em detrimento de uma dupla de rappers (Ninja e Yo-Landi) que nunca vão além do aceitável em suas atuações. Sharlto Copley, ator preferido de Blomkamp, ao menos cativa como a voz do protagonista e se Dev Patel não tem muitos desafios, também não decepciona.
Para os fãs de efeitos visuais, Chappie é tão bem sucedido neste quesito que nunca duvidamos que o robô está ali, conversando e se relacionando com os atores. Parece real, sujo. Muito mais próximo de um Johnny 5 de Short Circuit: O Incrível Robô (1986) – que era um boneco real – do que um dróide digital da nova trilogia Star Wars. É verdade que o desenho de produção parece ter se apropriado demais de trabalhos anteriores, visto que o Moose – robô criado por Vincent Moore – é muito parecido com ED-209 de Robocop.
Irregular, mas com boas discussões a respeito da consciência humana (e até da alma), Chappie pode não ser uma ficção científica infalível, mas tem material suficiente para gerar interesse. Faltaram uma ou duas revisões no roteiro para polir algumas arestas e o melhor aproveitamento do elenco escalado. Espera-se que Neill Blomkamp tenha maior cuidado em sua incursão pela saga Alien, quando realmente colocar Sigourney Weaver para trabalhar, em uma produção que deve ser lançada em 2016.
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