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Crítica


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Sinopse

A fim de terminar de escreveu seu próximo livro, um arquiteto muito famoso viaja com sua esposa à Itália. No entanto, os viajantes acabam conhecendo dois irmãos que discutem liberdade, amor e arte como indissociáveis.

Crítica

Nascido em Nova York, mas naturalizado francês, Eugène Green é um dos nomes mais cultuados do cinema autoral contemporâneo, mesmo tendo uma filmografia relativamente curta e de início tardio – o cineasta só começou a filmar a partir dos anos 2000, quando já tinha mais de 50 anos. De seus cinco longas, La Sapienza é o primeiro a receber um lançamento comercial no Brasil, bem como em diversos outros países pelo mundo, sendo a grande chance de apresentar a um público mais amplo seu estilo peculiar e fascinante. Uma narrativa de cunho obviamente erudito e que exige comprometimento do espectador, mas que não se desvia para um pretenciosismo que possa afastá-lo da obra. Em seu novo filme, o cineasta propõe uma viagem por um caminho duplo, em que as vias do intelectual e do emocional correm, a princípio, em sentidos contrários, para se cruzarem durante o percurso. Lembrando um pouco o que Abbas Kiarostami fez em sua obra-prima Cópia Fiel (2010), Green apresenta discussões sobre a arte para traçar paralelos com debates filosóficos mais profundos sobre a condição humana, ainda que as abordagens dos dois cineastas sejam distintas. Se Kiarostami extrai intensidade das interpretações, principalmente de Juliette Binoche, Green imprime um tom quase artificial, em que a estranheza inicial causada pelo formato de atuação escolhido, aos poucos é moldada para algo que se aproxima mais do público e gera a identificação com os personagens.

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A história acompanha Alexandre Schmidt (Fabrizio Rongione), um renomado arquiteto francês em crise profissional e existencial, que decide viajar para a Itália com o intuito de terminar um livro sobre o arquiteto barroco Francesco Borromini. Acompanhado por sua esposa, Aliénor (Christelle Prot), psicóloga que trabalha com projetos sociais, Alexandre decide fazer uma parada na vila de Stresa, onde o casal conhece os irmãos Goffredo (Ludovico Succio) e Lavinia (Arianna Nastro), garota que sofre de uma rara condição, em que é acometida por cansaços súbitos que a deixam debilitada por dias. Os jovens exercem um fascínio imediato sobre Aliénor, que decide ficar na cidade para cuidar de Lavinia e envia Goffredo, que pretende cursar a faculdade de arquitetura em Veneza, para acompanhar Alexandre no resto da viagem. Inicia-se, então, uma jornada de descobrimento e reinvenção para os quatro personagens, sempre marcada por embates nos mais variados âmbitos. Não à toa Green recorre ao barroco, para ele o último momento da civilização em que o homem convivia com a razão e com o espírito de forma harmoniosa, como ambientação para gerar o choque e sublimar os conflitos que serão trabalhados. Além da batalha entre racionalidade e espiritualidade, temos o conflito do passado contra o presente (apresentado nos planos iniciais que contrastam a arquitetura da Itália antiga com as fachadas industriais da França atual), da juventude e da maturidade (nos debates de Alexandre e Goffredo) e até as diferenças de estilos entre Borromini e seu rival, Bernini, que encontram espelho na personalidade ambígua de Alexandre. Apesar de admirar o primeiro, é com o segundo que encontra semelhanças. “Borromini é o Barroco místico, que propõe a quem entra no espaço interno uma experiência pessoal. Bernini é o barroco racional, que respeita o poder, a hierarquia e as regras. Eu sou Bernini”, diz Alexandre.

Até mesmo nas escolhas estéticas de Green existe um confronto, como entre os movimentos fluídos e sem cortes que acompanham cuidadosamente todos os detalhes arquitetônicos dos locais visitados e o jogo constante de plano/contraplano nas cenas de diálogos. Essa última característica se mostra um elemento fundamental do cinema do diretor, que filma seus personagens olhando diretamente para a câmera, em planos que vão fechando em seus rostos a cada corte, causando a sensação de comunicação direta entre eles e o público, que é praticamente obrigado a participar dos embates. Através da idiossincrasia de sua narrativa, o cineasta consegue extrair um humor refinado, que serve de alívio ideal para a erudição da história e também aproveita para ironizar o drama burguês, como na citação a Madame Bovary (os ricos também sofrem) ou na dinâmica dos pseudointelectuais que vivem na pensão em Roma. O rigor visual imposto pelo cineasta, com seus enquadramentos simétricos, milimetricamente elaborados, assim como as atuações não naturalistas do elenco, formam as ferramentas para potencializar as palavras de seu texto. Palavras que surgem em profusão, especialmente na descrição do trabalho e da vida de Borromini, mas que nunca soam maçantes e professorais, pois são ditas com extrema paixão por Alexandre. Paixão ausente no relacionamento evidentemente problemático com sua esposa. A frieza da relação do casal se mostra o conflito principal a ser resolvido no longa, e através da troca de experiências com os jovens irmãos italianos, Alexandre e Aliénor encontrarão a força para enfrentar fantasmas do passado e retomar o prazer pela vida.

O despertar de Alexandre, quando finalmente percebe o tom paternal de sua relação com Goffredo, surge após uma sequência, brilhantemente orquestrada por Green, reconstituindo a morte de Borromini. Neste ponto do longa, a artificialidade das atuações já se mostra menos engessada, e isto gera sequências mais emocionais – como o encontro entre Aliénor e um imigrante iraquiano, figura marcante interpretada pelo próprio Green – evidenciando a qualidade dos atores. Rongione, colaborador habitual dos Irmãos Dardenne, e Prot, musa de Green, estão perfeitos. Enquanto Succio e Nastro transmitem o frescor e a inocência necessários para seus papéis.

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A reflexão de Green termina traduzindo o desejo de Goffredo, repetido diversas vezes durante o longa: “Quero ser arquiteto para construir espaços e preenchê-los com pessoas e luz”. E é exatamente o que o cineasta faz, ao encher a sala de cinema e iluminar a tela com a beleza arrebatadora de suas imagens para afirmar que o amor é a chave para a verdadeira sabedoria – ou sapiência, como no titulo. E que essa sabedoria está em desfrutar a vida com paixão.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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Grade crítica

CríticoNota
Leonardo Ribeiro
9
Alysson Oliveira
8
MÉDIA
8.5

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