Crítica
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Sinopse
Início dos anos 70. Harvey Milk é um nova-iorquino que, para mudar de vida, decidiu morar com seu namorado Scott em San Francisco, onde abriram uma pequena loja de revelação fotográfica. Disposto a enfrentar a violência e o preconceito da época, Milk busca direitos iguais e oportunidades para todos, sem discriminação sexual. Com a colaboração de amigos e voluntários (não necessariamente homossexuais), Milk entra numa intensa batalha política e consegue ser eleito para o Quadro de Supervisor da cidade de San Francisco em 1977, tornando-se o primeiro gay assumido a alcançar um cargo público de importância nos Estados Unidos.
Crítica
É particularmente difícil tecer uma crítica à Milk: A Voz da Igualdade. E isso se deve ao fato deste ser um filme absolutamente perfeito! Realizado no momento certo, pelos artistas ideais e tratando de um tema mais do que pertinente, com um enfoque adequado e sem concessões, é um caso raro em que a soma dos elementos reunidos conseguiu criar algo ainda mais emblemático. Indicado em 8 categorias do Oscar 2009, inclusive nas principais, como Filme, Direção, Ator, Ator Coadjuvante e Roteiro Original, provavelmente não irá receber todo o reconhecimento que merece. Mas isso não será problema – o verdadeiro impacto que um longa como esse provoca só pode ser percebido em sua totalidade na expressão que deixa e no sentimento que provoca em cada um dos seus espectadores.
Apesar do título, não está se falando aqui de leite, e sim da vida e dos feitos realizados por Harvey Milk, um homem que chegou aos 40 anos sem ter feito nada de muito importante, mas que, ao falecer, pouco menos de uma década depois, deixou um legado que até hoje repercute. Milk foi nada menos do que o primeiro homossexual assumido a ser eleito a um cargo político nos Estados Unidos – e, provavelmente, em todo o mundo! Sua intenção era simples: mudar o mundo da porta de sua casa. E o que fez foi realmente impressionante.
Ao conhecer Scott, um rapaz uns 15 anos mais novo, Harvey recebeu a inspiração que há muito ansiava e decidiu mudar: largou o emprego que o entediava, abandonou Nova York e seguiu para São Francisco ao lado da nova paixão. Lá, uma vez estabelecido com uma pequena lojinha de revelações fotográficas na Rua Castro, não encontrou um ambiente tão receptivo quanto imaginava. Mas, ao invés de se esconder, fez o contrário: saiu do “armário” com todas as forças e colocou a boca no mundo. E para se fazer ouvir criou barulho do modo certo – candidatando-se ao cargo de supervisor municipal, algo como um vereador. Assim, ele queria ser alguém no governo que iria se importar com sua causa e com a dos seus iguais. Finalmente alguém que ouviria o que esta minoria tem a dizer e que não poderia mais ficar calada.
Só que os movimentos de Milk foram ouvidos muito mais longe do que ele poderia ter esperado a princípio. E se sua jornada política não foi das mais fáceis, ao menos nunca desistiu – e nem os seus companheiros. Só que uma pedra aparentemente inofensiva se meteu no seu caminho – um outro colega, também supervisor novato, o religioso Dan White. E foi este homem que, motivado mais pela inveja e insegurança do que pelo preconceito ou discriminação, que terminou por assassiná-lo, ao lado do prefeito da cidade, meros 11 meses após ambos terem tomado posse de seus mandatos. Milk teve pouco tempo para fazer o que pretendia. Mas as mensagens que deixou e a repercussão dos atos que conseguiu executar não só atingiram seus objetivos como também marcaram toda uma geração.
Milk: A Voz da Igualdade não é só bem-sucedido em mostrar a verdadeira face deste homem singular como também é um impressionante relato político. A trajetória desta personalidade é observada com muito equilíbrio entre o distanciamento que os fatos exigem e a aproximação que as emoções pedem. Escrito pelo jovem Dustin Lance Black, este texto é sábio em não cair nos clichês mais óbvios – como a suspeita de uma conspiração pela sua morte ou em endeusá-lo, isentando-o de falhas e defeitos – alternando momentos íntimos e conflitos pessoais com posições ousadas e reveladoras.
Outros méritos podem ser identificados por todos os lados. A direção de Gus Van Sant é sóbria e respeitosa, ajustada ao que quer contar sem resvalar no melodramático. O elenco de coadjuvante, que vai de Josh Brolin à Emile Hirsch, passando por um exagerado Diego Luna e um carismático James Franco, oferece o suporte ideal à uma das performances mais intensas e impressionantes do ano: Sean Penn, que, no papel principal, é protagonista de uma verdadeira transformação. Ele não interpreta Harvey Milk, simplesmente. Ele o vive com toda a vontade e força que um papel como este pode exigir. E o faz com tanta propriedade e direito que é quase impossível reconhecê-lo. Assim como Daniel Day-Lewis no ano anterior, era o dono da interpretação mais estonteante daquela temporada!
Comovente, perturbador, necessário, honesto. São poucas as palavras que fazem jus a uma obra como Milk: A Voz da Igualdade. Sua real relevância só poderá ser sentida daqui a alguns anos, repetindo um processo semelhante àquele visto com O Segredo de Brokeback Mountain (2005) – você consegue lembrar quem levou o Oscar no lugar do romance dos caubóis gays? Militante sem ser irresponsável, justo sem ser enfadonho, abrangente sem ser irrelevante, este é um filme cujos efeitos merecem ser observados com cuidado. Talvez o que é dito aqui não lhe atinja hoje ou amanhã, mas aguarde, pois o discurso aqui é universal e um dia fará sentido não só a um ou dois, mas a todos por inteiro.
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