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Crítica

Stella (a revelação Rebecka Josephson, de apenas 12 anos) é a filha caçula de uma família aparentemente moderna. Estamos em um país desenvolvido, em que as atividades escolares e sociais ocupam quase tanto tempo na vida de adolescentes como nas das crianças, todos se preparando para uma sociedade cada vez mais contemporânea e competitiva. Os pais possuem cada um seu emprego, os filhos estão sempre envolvidos em um compromisso ou outro, e os momentos juntos são tão raros quanto superficiais – o indivíduo ganha uma dimensão tão grande que logo o conjunto é substituído pelo unitário, e uma vez que as aparências se mantenham, pouco mais irá importar. Porém o que fazer quando uma ameaça – tanto a este leve equilíbrio quanto a alguém em especial – começa a se impor sem que ninguém a perceba? Assim, praticamente de mãos atadas, a protagonista de My Skinny Sister vê seu drama crescer e se desenvolver de forma angustiante.

O ponto de vista é o da pequena Stella, mas logo somos convidados a perceber a dinâmica dessa família de acordo com as prioridades da irmã mais velha, Katja (Amy Deasismont, também uma presença interessante, principalmente por saber lidar com as alternâncias de humor de sua personagem com impressionante habilidade). Atleta dedicada, é a estrela da escola – e grande esperança dos pais – por seu talento na patinação do gelo. Sua dedicação é tamanha que não hesitará em colocar tudo de lado para superar qualquer dificuldade e obter o máximo de si na próxima competição. E nesse processo colocará em risco a própria saúde, uma vez que decide simplesmente parar de comer. A anorexia na adolescência é um perigo silencioso e de difícil diagnóstico, e no caso aqui apresentado a única que a percebe é justamente a irmã mais nova – a gordinha, ainda desajeitada, que está recém começando a descobrir o mundo e já terá que lidar com uma responsabilidade muito maior do que a que se julga capaz.

A diretora e roteirista Sanna Lenken até então só havia trabalhado na televisão e em curtas-metragens. Sua estreia em longas com Min Lilla Syster (título original) é feita com bastante segurança e fôlego de veterana. Muito do mérito, é preciso concordar, esteve na escolha das protagonistas, duas apostas mais do que certeiras. Mas há também a história que escolheu para investigar, um assunto próximo ao universo dos personagens e que merece, de fato, um olhar mais profundo. A discussão que levanta é de extrema valia. Mas, melhor ainda, são os desdobramentos que a trama propõe. Como os pais devem agir em casos assim? Qual o papel dos adultos mais diretamente envolvidos, como professores e instrutores de atividades físicas? E na cabeça de alguém ainda tão jovem e inexperiente, como Stella, quais serão os efeitos de se passar por uma situação como essa em que a salvação – ou a perdição – pode estar ao alcance de um prato de comida?

Sem evitar questões mais nebulosas e assumindo com coragem cada possível cenário para o enredo que aborda, My Skinny Sister é um filme necessário e muito bem construído. A relação que se estabelece entre as duas irmãs, um misto de medo e confiança, desespero e vergonha, é de fácil identificação com uma audiência muito maior, o que aumenta ainda mais sua relevância junto ao público ao qual se destina. Premiado no Festival de Berlim 2015, resgata um cinema social e familiar desde sua primeira ordem, mostrando que boas histórias podem ser contadas até nas realidades mais simples, sem necessidade de grandes investimentos ou reviravoltas mirabolantes. O sucesso, aqui, resume-se a saber com precisão o que e como dizer. E isso, acredite, faz toda a diferença.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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