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Sinopse

Professora primária, Poppy parece estar sempre de bem com a vida, vestindo roupas coloridas e tentando enxergar as coisas pelo lado positivo. Tal conduta a faz ser irresponsável ocasionalmente, pois ela tenta levar na brincadeira coisas sérias. Scott, seu professor de auto-escola, por exemplo, não suporta os desvios de atenção dessa sonhadora inveterada.

Crítica

Tudo que nos acontece pode ser interpretado de duas maneiras: positiva ou negativa. Agora, o que dizer de uma pessoa que leva tudo na brincadeira e busca sempre pelo lado ‘alegre’ das situações? Absoluta felicidade ou extremo medo e insegurança? Este é o dilema enfrentado diariamente pela protagonista de Simplesmente Feliz, novo trabalho do aclamado realizador inglês Mike Leigh. O título nacional, aliás, é uma péssima escolha, porque Poppy (interpretada pela até então desconhecida Sally Hawkins, de O Sonho de Cassandra2007) é tudo menos ‘simples’. Aliás, ela até está atrás desta ‘simplicidade’, ao mesmo tempo em que precisa lidar com seus demônios internos. Assim como qualquer um de nós. E talvez seja por isso que este filme é tão tocante.

Poppy é uma professora primária que lida com uma turma de trinta crianças e com suas descobertas, aventuras e receios. Já com trinta anos, continua solteira e dividindo um apartamento com uma amiga da faculdade. As irmãs mais novas são opostas entre si: enquanto uma é irresponsável e alternativa, a outra vive no interior, num casamento convencional e grávida do primeiro filho. Nem tudo está ótimo, mas nossa personagem principal vai levando sua vidinha ‘mais-ou-menos’, e enquanto espera que algo lhe aconteça – quem não torce por isso? – segue arriscando coisas novas, como aulas de direção ou de flamenco. Mas sem levar nada muito a sério, sempre com uma piada na ponta da língua. Mas nem todo mundo consegue encarar tão na boa alguém constantemente visando o lado colorido da realidade.

Eu conheço pessoas como Poppy. E certamente você também. São aquelas que estão sempre sorrindo, felizes, polianas. Mas, por trás disso tudo, lá no final, se percebe um sorriso meio amargo, uma insatisfação permanente que é abafada a todo custo. Como seria ter que encarar frente a frente os problemas, não como gostaríamos que eles se apresentassem, mas sim do jeito que verdadeiramente são? Uma atitude assim é muito mais uma defesa do que uma aceitação natural das coisas. É um escudo – “não adianta tentar me abalar com tudo de ruim que há aí fora, porque estou fechadinha aqui no meu próprio mundo, e nada poderá me colocar para baixo!”. O que é mostrado é uma mensagem para o exterior. Mas como ficar nos momentos em que se deve enfrentar aquilo que está lá dentro?

Um dos desempenhos mais premiados do ano, Hawkins foi também uma das maiores decepções das indicações do Oscar deste ano, ficando de fora das finalistas. Pode-se afirmar com tranquilidade que foi uma das injustiçadas da temporada. Por sua atuação ganhou o Urso de Prata do Festival de Berlim e o Globo de Ouro e o Satellite de Melhor Atriz em Comédia ou Musical, além dos prêmios dos críticos de Boston, Los Angeles, Nova York e São Francisco. Ela consegue alternar com muita tranqüilidade entre o bom astral constante e o desespero abafado que deve permanecer calado – a ponto de provocar irritação por sua imensa capacidade em contemporizar os fatos. Outro destaque é o ator Eddie Marsan (Hancock, 2008), como o instrutor da auto-escola, um homem que é o completo oposto de Poppy, uma alma amargurada e perseguida pelo que há de pior. Os duelos entre eles valem cada cena.

Simplesmente Feliz era também uma aposta certa para Melhor Direção, com o veterano Mike Leigh, que teve que se contentar apenas com a lembrança para Melhor Roteiro Original – a única da produção. É um trabalho muito mais discreto e subliminar do que o visto em duas de suas outras indicações, os poderosos Segredos e Mentiras (1996) e O Segredo de Vera Drake (2004), mas ainda assim merecedor de vários aplausos. Este é um filme que chega de mansinho, e demora para mostrar suas reais intenções. Mas quando o faz, nos atinge como um soco no estômago. E com um sorriso no rosto.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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