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31º Cine Ceará :: “Uma coisa boa que conseguimos é estar em sintonia com um destaque nacional”, comenta o diretor Wolney Oliveira

Publicado por
Robledo Milani

Wolney Oliveira é bastante ocupado. Ele não só é o nome à frente do Cine Ceará, um dos mais importantes festivais de cinema de todo o Brasil, como também é um cineasta bastante ativo, com longas premiados no país e no exterior, além de outros tantos projetos em andamento. No meio de tantas obrigações, ele encontrou um tempo para conversar com o Papo de Cinema no último dia de programação do 31º Cine Ceará, poucas horas antes da premiação, para falar um pouco sobre a edição desse ano, os desafios para a sua realização, as perspectivas para 2022 e, além disso, também comentar um pouco sobre seu trabalho como realizador. É sempre um prazer conversar com alguém tão motivado e com tantas boas notícias a serem ditas. Confira!

 

Qual foi o maior desafio para a realização do 31º Cine Ceará?
Independente do cenário, claro que nesse é pior ainda, por causa da questão econômica e política do país, sempre é difícil a captação de recursos. E um evento como o Cine Ceará, que acabou de completar 31 anos, dos quais eu dirigi, produzi e captei recursos de 29. Nesse ano, em particular, estou ao mesmo tempo junto dos meus editores acompanhando o processo de pós-produção do meu próximo longa, o Memórias da Chuva. Esse longa é resultado de um prêmio Aldir Blanc do Ceará, construído pela classe com a Secretaria de Cultura do Estado – um dos maiores editais do Brasil para o audiovisual nesse ano. Ou seja, além de estar cuidando do festival, tenho esse projeto. Esse ano foi mais estressante por isso. Tenho até 31 de janeiro para entregar o longa pronto, que não está nem no primeiro corte – ou seja, tenho menos de dois meses para finalizar.

Wolney Oliveira em frente ao Cineteatro São Luiz, em Fortaleza

Além do Memórias da Chuva, você está envolvido também com outros projetos para 2022, certo?
Tenho outros dois filmes em andamento. Por incrível que pareça, apesar de toda essa loucura que a gente vive, no ano que vem estarei lançando três, quatro filmes. Primeiro acontecerá a distribuição do Soldados da Borracha (2019), que finalmente irá estrear no circuito comercial. Acabamos de ganhar o prêmio Margarida de Prata como melhor longa documentário, o reconhecimento mais importante oferecido pela CNBB. Foi o décimo quarto prêmio que este longa já ganhou. No dia 02 de junho irei lançar, no Cineteatro São Luiz, o longa Vozão: Coração do Meu Povão, documentário sobre o Ceará Sporting Clube, dirigido por mim e pelo Joe Pimentel. No final de abril tem que estar pronto o Memórias da Chuva, uma história sobre a história de Jaguaribara, uma cidade de 9 mil habitantes que foi coberta pelas águas do Castanhão, o maior açude da América Latina, que abastece Fortaleza. E em março eu estarei retomando a edição, no segundo corte, de Lampião, O Governador do Sertão.

 

São todos documentários?
Sim, todos documentários. A última ficção que fiz foi o A Ilha da Morte (2010), e desde então tenho tido uma preguiça danada de fazer outra (risos). É muita gente envolvida. Documentário são sete, oito na equipe, e era isso. Mas também não quer dizer que não volte à ficção. Tenho um projeto de refilmar Os Últimos Cangaceiros (2011), mas dessa vez uma versão ficcional. Um road movie do cangaço.

 

Desde quando você está envolvido com Lampião, O Governador do Sertão?
Esse era o meu projeto mais antigo. Era a ideia original, quando comecei a filmar, em 2005, até que apareceu o casal Durvinha e Moreno. Por isso decidimos fazer um filme sobre quem ainda estava vivo, e assim nasceu Os Últimos Cangaceiros (2011). Pra quem tá morto, tem tempo. Então, em 2022 estarei envolvido com a finalização de três longas e com o lançamento de um que já está pronto. Além disso, o 32º Cine Ceará será de 24 a 30 de junho. Vai ser bem mais cedo, dentro do calendário, pois no ano que vem, além de ser de eleições, tem Copa do Mundo – que dessa vez será em novembro, por causa do calor em Qatar. Final do ano vai ser um horror. Então, quanto antes fizermos nosso festival, melhor. Mas para 2023 a ideia é voltarmos para final de setembro, que é nossa data original.

 

Qual a tua avaliação sobre o 31º Cine Ceará, já tendo terminado o evento?
Uma coisa que o Cine Ceará conseguiu, e que é muito bom, é estar em sintonia com um destaque nacional. Ou seja, para atrair a atenção da imprensa e do mercado como um todo, o melhor é termos apenas filmes inéditos em competição. E isso nós conseguimos. Não adianta vir até aqui para assistir a filmes que já foram vistos em outros festivais. Então, nesse ano, até por questões orçamentárias, contamos com apenas seis longas, mas todos 100% inéditos no Brasil. Os dois cearenses eram premières mundiais. E foram selecionados porque se tratava de filmes competentes, de diretores jovens e reconhecidos. Não porque eram do Ceará. Se fossem de São Paulo ou do Rio de Janeiro, ninguém faria nenhum comentário. Enfim, nos últimos cinco anos, todos os longas do Cine Ceará são inéditos. Em 2021, o único que não era inédito era o de encerramento, O Marinheiro das Montanhas, do Karim Ainouz, que já tinha sido exibido na Mostra SP.

Wolney Oliveira, em seminário durante o 31 Cine Ceará

Na real, então, são três longas cearenses.
São dois longas do Ceará na mostra competitiva, um na sessão de encerramento e mais três na mostra Olhar do Ceará, que é local. São seis no total. Nesse último ano, foram produzidos dezessete longas aqui no estado. Foram treze documentários, entre eles o Memórias da Chuva, três ficções e um de animação. Então, o Cine Ceará conseguiu uma coisa muito boa para o festival, para o público e para a crítica especializada. Isso em relação aos longas. Já na mostra de curtas, tivemos quase 900 filmes inscritos. Nos últimos três anos temos selecionado de 12 a 15 por edição. Para a nossa surpresa, ou melhor, felicidade, tivemos 87 filmes do Ceará inscritos na Olhar do Ceará. Entraram 17 curtas e 3 longas na regional. São quase cem filmes inscritos. Desses todos, teve também um curta local na mostra nacional, o Foi um tempo de poesia, do Petrus Cariry. Isso tem a ver com o fato de que o Ceará é um dos poucos estados, e Fortaleza uma das poucas cidades, que conta com dois cursos de formação superior de Cinema, o da Universidade Federal do Ceará e o da UniFor. Fora outros tantos cursos técnicos que temos por aqui. Fui aluno da primeira geração da escola de cinema de Cuba, e hoje já temos vários cineastas que passaram por lá lançando seus filmes. É um cenário culturalmente falando muito criativo, e nós somos parte disso.

 

O Cine Ceará se coloca como um panorama de toda essa produção.
É uma grande vitrine. O Armando Praça, que tá de novo com o Fortaleza Hotel, ganhou em 2019 com o Greta. O Petrus Cariry, que falamos há pouco e está com dois filmes nesse festival, foi premiado com quase todos os longas e curtas anteriores dele. O maior desafio é sempre a captação de recursos. Todo ano é uma luta.

 

Para 2022, você já anunciou as datas. O que mais você pode nos adiantar?
Apesar de toda a crise, provavelmente 2022 vai ser o ano do boom da produção cinematográfica brasileira. A Ancine acabou de anunciar um edital de quase 700 milhões de reais. Há um outro de R$ 500 milhões já previsto para março do ano que vem. Se a Lei Paulo Gustavo for aprovada, são mais R$ 3,2 bilhões. O cinema brasileiro teria R$ 4,4 bilhões para que filmes sejam feitos no próximo ano. Benzadeus! Tomara que dê certo. Já o governo do estado anunciou que irá lançar o Prêmio Ceará de Cinema e Vídeo, de R$ 11 milhões, e o programa da Ceará Filmes e de uma Lei Estadual do Audiovisual, que é uma cobrança antiga nossa. O Cine Ceará sempre foi o principal levantador e animador dessa questão da política audiovisual do estado. A Film Comission de Fortaleza foi lançada há pouco também. Diante disso, o que posso confirmar é que no ano que vem iremos promover um seminário sobre todas as Film Comissions que atuam no Brasil. Mas ainda estamos pensando em outras coisas extras que vamos desenhar.

Wolney (de máscara branca) ao lado de Bruno Gularte Barreiro, diretor de ‘5 Casas’, melhor filme do 31 Cine Ceará

A pandemia mudou a forma de pensar o Cine Ceará?
Uma coisa que gostei muito, enquanto diretor do festival, mas sei que para os realizadores – e eu também sou diretor – você exibir o filme no Canal Brasil, de uma certa maneira, perde o ineditismo. Mas se tem um lado bom dessa pandemia para os festivais foi esse alcance. Alguns longas do Cine Ceará puderam ser vistos pela televisão por pessoas de todo o país. Claro, tem que ser assinante, mas o Canal Brasil tem quase 15 milhões de assinantes. Eu sou a favor de manter isso no ano que vem, independente de pandemia ou não. Tomara que já esteja tudo normal, que possamos ver o Cineteatro São Luiz lotado. As expectativas, portanto, são as melhores. Vamos ter muitos filmes, e muita gente para assisti-los.

O Papo de Cinema está em Fortaleza a convite do 31º Cine Ceará

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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