Embora já esteja em sua terceira edição, apenas em 2019 a Mostra Sesc de Cinema está aparecendo com o devido destaque dentro do cenário dos festivais dedicados ao cinema brasileiro. Nenhum outro evento similar é tão abrangente e duradouro. Após os 10 dias de programação, entre exibições, conversas, debates e encontros, os filmes selecionados circularão pelos 27 estados da federação, em diversas unidades da instituição, por cerca de dois meses. E um dos grandes responsáveis por essa reviravolta que, definitivamente, coloca a Mostra Sesc no calendário, é Marco Aurélio Fialho, analista audiovisual do departamento nacional, um apaixonado convicto. Além dos 13 anos dentro da instituição, Marco mantém um blog sobre cinema no qual exercita sua veia de crítico. No Papo de Cinema que você confere a seguir, ele fala sobre o afeto como mola propulsora para seu trabalho e as particularidades de uma programação como a da 3ª Mostra Sesc de Cinema. Confira este bate-papo exclusivo com Marco Aurélio Fialho.
Embora estejamos apenas no terceiro dia do evento, gostaria que você fizesse um breve balanço sobre essa novidade que coloca a Mostra Sesc definitivamente no mapa.
Primeiramente, estou vendo tudo com entusiasmo, está para além do que esperávamos em termos de participação. Até porque, para mim, quando você imagina um festival de cinema é imprescindível pensar nos encontros. Atualmente precisamos mais do que nunca estar próximos, agregando valor, inclusive para encontrar soluções, já que o país não caminha de forma coletiva, mas guiado por interesses egoístas, tacanhos e que não buscam o bem comum. O cinema é, em si, o bem comum, pois feito em equipe. Todo o processo cinematográfico é coletivo. Então, esse caráter gregário é de vital relevância. O veículo ideal para promover harmonia entre as pessoas é o cinema.
Aqui muito se fala sobre a capilaridade do Sesc, o fato de instituição estar no Brasil todo. E parece que esse evento chama a atenção da cadeia cinematográfica para o trabalho que vocês fazem, não?
No âmbito interno discutimos muito sobre o fato do nosso trabalho não aparecer tanto externamente. Estou há 13 anos no Sesc e isso me incomoda bastante, pois tais atividades não têm a repercussão que elas merecem, de fato. Isso eu digo, claro, em termos de visibilidade para o público de fora, aquele que não é beneficiado ou que não está diretamente ligado. É importante que tenhamos reconhecimento quanto ao que a instituição faz, não somente no que diz respeito à cultura. A Mostra Sesc de Cinema não acaba aqui, pois vai acontecer nos 27 estados do Brasil.
Por que escolher Paraty para esse evento inaugural?
Nosso entendimento é de que Paraty é um local neutro, especialmente por não ser uma capital. É uma cidade com um atrativo visual, que é cinematográfica. A decisão foi estratégica, pensando no que isso vai agregar para os Sesc do Brasil inteiro. Era também importante trazer uma parte da imprensa que vai reverberar o agora posteriormente em suas localidades. Estamos bem felizes em saber que essa mostra acontecerá por cerca de dois meses nos 27 estados do Brasil. Nenhum outro festival tem essa possibilidade. E isso para a gente é muito significativo.
E o Sesc é uma instituição que tem um trabalho forte no que diz respeito ao audiovisual…
Sou muito orgulhoso desse trabalho que o Sesc desenvolve com o audiovisual. Mas a minha ideia sempre foi aumentar a atuação. Até então nunca tínhamos conseguido chegar à realização de uma mostra com configuração de festival, entrar de verdade no calendário dos eventos de cinema. Sinto que a 3ª Mostra Sesc de Cinema é um divisor de águas no nosso posicionamento da cadeia do audiovisual. A partir dela ganhamos outra visibilidade.
Além da atuação no Sesc, você tem um trabalho como crítico de cinema. Essa função te ajudou como um dos condutores da 3ª Mostra Sesc de Cinema?
Como tenho de estar nove horas diárias no Sesc, pelo menos durante a semana, minha atividade de crítico se desenvolve praticamente no fim de semana. Sou convidado para as cabines de imprensa, mas não consigo ir por conta do meu compromisso com a instituição. A crítica, então, desempenho paralelamente, por pura paixão. Quando comecei a estudar cinema, minha ideia era enveredar pela escrita, não pela produção. Acabei fazendo um documentário, até porque a faculdade te empurra nessa direção do fazer. Mas tinha um orgulho especial quando os professores me elogiavam por conta da qualidade dos meus trabalhos escritos. Minha vocação sempre foi bem mais direcionada ao pensar sobre cinema. Cada pessoa tem um papel dentro desse panorama.
E já deu pra tirar aprendizados desses três dias?
É muito difícil, Marcelo, porque acredito que a gente ainda não teve tempo para pensar o panorama. Para mim, especificamente, é difícil realizar o festival porque ele envolve questões para além do cinema. Você tem de pensar numa estrutura e precisa de parceiros. E no que diz respeito à configuração do festival, ainda refletimos sobre isso bem mais internamente. Então é árduo realizar um evento desse porte dentro de uma instituição bastante complexa. Você que presta serviço para o Sesc sabe que existe toda uma carga burocrática, e isso dificulta um pouco as coisas. Tentamos fazer tudo com antecedência, mas inevitavelmente coisas acontecem de última hora. Porém, no fim das contas, o que nos importa é que as pessoas estejam felizes. A palavra festival já denota celebração. Sigo esse norte no âmbito pessoal. Minha vida é celebrar, com minha esposa, meus amigos e colegas de trabalho. E não há nada que celebre mais a vida do que o cinema. Estar aqui, realizando essa mostra, é o maior momento da minha vida.
Paralelamente à programação da Mostra, há o encontro dos técnicos do audiovisual do Sesc, profissionais que trabalharam em suas respectivas curadorias regionais. E os encontros de vocês sempre são permeados por uma afinação que salta aos olhos. É esse o bom e o tom da equipe?
Em 2018, quando fizemos nosso encontro anual, trouxemos para a dinâmica a escritora Bernadette Lyra, pessoa que é puro afeto. Então, até nesse tipo de escolha nos orientamos pelo carinho que marca as nossas atividades. Tento passar a esses quase 30 profissionais a minha paixão pelo trabalho e o pensar cinema dentro e fora do Sesc. A única coisa que tenho a transmitir a eles é a minha dedicação. Conhecimento todo mundo vai buscar de maneiras distintas, mas esse compartilhamento da paixão é imprescindível ao desempenho de qualquer atividade. Isso contagia. Nos 13 anos que estou no Sesc, sinto que essa é minha maior contribuição ao grupo. E eles me dão um retorno 20 vezes maior. Tudo isso só me faz ficar mais empolgado e apaixonado pelo que faço. Fico até emocionado ao falar disso.