A Mostra Internacional de Cinema de São Paulo terá a sua 47ª edição entre os dias 19 de outubro e 01 de novembro. Período em que a Terra da Garoa se transforma na capital latino-americana do cinema, com a exibição de cerca de 360 filmes vindos praticamente do mundo todo (quase 100 países). Contando com o retorno valioso do patrocínio da Petrobrás, empresa estatal tradicionalmente parceira da cultura no Brasil – mas que ficou alguns anos afastada dessa vocação por conta das políticas dos últimos governos federais -, o evento é comandado por Renata de Almeida, uma batalhadora incansável para que a Mostra continue sendo uma janela imprescindível ao contato do público brasileiro com alguns dos grandes destaques em festivais internacionais, além das descobertas de pérolas pinçadas pela curadoria. Nós do Papo de Cinema sempre gostamos de bater um papo com a Renata um pouco antes do evento começar, até para saber o que esperar dessa verdadeira maratona da qual somos fãs. Confira abaixo o resultado do nossa conversa com a Renata de Almeida, diretora da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Podemos comparar a Mostra ao Carnaval, no sentido de que agora vocês estão prestes a colocar o desfile na avenida, mas o espetáculo é fruto de um trabalho que dura o ano todo?
É exatamente igual ao Carnaval. Às vezes até nos perguntamos se tem sentido esse trabalho todo para 15 dias de evento (risos). A partir de agosto não tenho mais fim de semana, pois as coisas vão afunilando. Estamos num processo meio de reconstrução de tudo, mas claro que as coisas estão melhores. A Mostra está outra vez enorme, voltamos a ter o patrocínio da Petrobrás, que há quatro anos não estava conosco, então temos de estar felizes, mas estamos muito cansados (risos). A Mostra começa para os outros, mas para a gente parece estar no final (risos).
Chama positivamente a atenção o retorno da Petrobrás, retomando a sua vocação de apoio à cultura. O quão importante ter um suporte dessa estatura para a Mostra acontecer?
Todos os parceiros são muito importantes. Nosso evento é feito como uma colcha de retalhos. Mas, claro, o retorno da Petrobrás, que foi durante tantos anos parceira, é um sonho. Aliás, durante a coletiva de imprensa eles revelaram que o acordo se estenderá no ano que vem. É fundamental conseguir trabalhar com o mínimo de segurança que seja. Quando encontro colegas de outros festivais e digo que não sei o orçamento do evento, as pessoas acham a coisa mais inacreditável do mundo. A Mostra é elástica, consegue ter o tamanho condizente com os apoios, e o grande desafio é compreender esse cenário e não ficar no vermelho. Em alguns anos precisamos pedir empréstimo. Mesmo no ano passado, com a impossibilidade de utilizar a Lei Rouanet, conseguimos realizar o evento por conta da fidelidade de diversos parceiros, como a SPCine, o SESC, e até os próprios patronos e membros do setor. Neste ano, voltamos ao gigantismo de 360 filmes, de 96 países, um júri internacional, algo impossível nos últimos quatro anos.
A história de quase 50 anos da Mostra é fundamental na hora de negociar os filmes? Imagino que a credibilidade dessa trajetória seja um trunfo, correto?
São 47 anos sem aprontar com ninguém (risos). Em muitos momentos, a única coisa que temos na vida é a palavra. E a nossa precisa valer. A Mostra tem mantido a palavra nesses anos todos, inclusive com parceiros e patrocinadores. Construímos várias relações de parceria, seja com os donos dos filmes, com o público, com os patrocinadores, entre os outros públicos. Esse é o segredo que faz a Mostra resistir por 47 anos.
Os dois maiores eventos cinematográficos do Brasil, Mostra e Festival do Rio, são liderados por mulheres. Como você percebe esse cenário?
É uma coincidência feliz. A maioria dos festivais tem realmente lideranças masculinas. Sobre o Festival do Rio, neste ano ele aconteceu quase grudado na Mostra. Você é a segunda pessoa que me pergunta sobre essa questão. Mulher tem isso de fazer várias coisas ao mesmo tempo. Não sei se é o resultado da habilidade que a sociedade nos impõe ou se é uma característica natural. Fora do Brasil são frequentes as lideranças masculinas em grande festivais. Cannes, Berlim, Veneza e San Sebastian são chefiados por homens. É curioso que no Brasil tenhamos esse panorama.
E a 47ª edição da Mostra é a que consolida a volta à normalidade pós-pandemia, especialmente pelo retorno a uma quantidade gigante de filmes e atividades. É por aí?
Com certeza. Se temos retorno de patrocínio, isso tem de ser revertido ao público. O aporte financeiro tem sentido apenas se ele se reverte em benefício ao público. É preciso repartir com quem nos prestigia. A Mostra voltou a ter neste ano duas grandes retrospectivas, principalmente a do Michelangelo Antonioni, pois ela não estava pronta. Tivemos de buscar as cópias restauradas em diversas fontes, um trabalhão danado para um recorte caro. Porém, sempre tivemos essa preocupação com a valorização da história do cinema. Conseguimos voltar agora com essa característica forte. Cada filme tem seu lugar e que bom que haja tantos eventos dando visibilidade.
Qual é o conselho que você daria para quem for conferir a Mostra neste ano?
A melhor coisa é entrar no site, pesquisar os títulos com calma, ler sinopse e se informar. Pede dica para os amigos, até porque a Mostra é um ótimo lugar para amizades. Há grupos de whatsapp da Mostra, já teve gente que encontrou futuros marido e esposa nas filas, famílias foram formadas a partir desses encontros. Mas, principalmente, tire um tempo para estudar o site e se permitir descobrir algumas pérolas que estão ali. Se aventure. Se você não conseguir entrar numa sessão, sem tristeza, não perca tempo com a tristeza e entre na sala ao lado, se arrisque que você pode ter ótimas surpresas.
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