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Alçada para a fama há cerca de quinze anos, ao adaptar em um longa-metragem um curta que havia feito alguns anos antes, a cineasta Kimberly Peirce é o nome por trás do sucesso de Meninos Não Choram (1999), filme que deu o primeiro Oscar de Melhor Atriz para Hilary Swank. Desde então, a diretora realizou alguns episódios do seriado lésbico The L Word (2006) e realizou o subestimado Stop-Loss: A Lei da Guerra (2008), um filme com Channing Tatum e Joseph Gordon-Levitt, porém feito muito antes dos dois se tornarem astros de verdade. Peirce volta agora, literalmente, ao olho do furacão ao comandar a refilmagem do clássico Carrie: A Estranha, baseado no livro de Stephen King levado às telas pela primeira vez em 1976. A nova versão, estrelada por Chloë Grace Moretz e Julianne Moore, arrecadou nas bilheterias internacionais o dobro do seu orçamento total, e chega finalmente ao Brasil cheio de expectativas. Foi principalmente sobre esse trabalho que o jornalista Mateo Anderson conversou com a cineasta, nesse bate-papo exclusivo editado por Robledo Milani e publicado com exclusividade no Brasil pelo Papo de Cinema. Confira!

 

Qual foi a sua primeira reação quando ficou sabendo da oportunidade de rodar uma nova versão de Carrie: A Estranha?
Adorei a adaptação cinematográfica do De Palma. Então, por respeito ao meu amigo e colega, como o cineasta que fez um clássico a partir desse material, liguei para ele e expressei o meu interesse em fazer a versão contemporânea. E ele disse: “Você tem que dirigir!”.

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Kimberly Peirce, Chloë Grace Moretz e Julianne Moore

O que nessa história a atraiu a ponto de querer dirigi-la?
Quando reli o livro genial de King, o que me impressionou foi a força da trama, como era uma narrativa divertida e como ele entretém com todos os seus personagens. Queria levar o público a conhecer a Carrie o mais profundamente possível – seus anseios mais profundos e sua tentativa de se passar por uma adolescente normal em meio à zoação dos colegas; sua descoberta e prática dos seus poderes fantásticos; sua ligação estranha e profunda com sua mãe religiosa e protetora, Margaret; e os conflitos fatais que surgem quando Carrie se aventura pelo mundo para se tornar mulher.

 

Como você vê a Carrie?
Eu a vejo como alguém que é pobre, retraída, inocente e desesperadamente curiosa em relação ao mundo.

 

O que você achou da interpretação de Sissy Spacek no filme original de 1976?
Achei a Sissy Spacek espetacular! E sou amiga do Brian De Palma e amei o que eles fizeram. Então, rodarmos este filme não quer dizer que o deles não tenha sido fantástico. Aliás, muito pelo contrário.

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Kimberly Peirce e Chloë Grace Moretz no set de Carrie (2013)

Por que você escolheu Chloë Moretz para o papel da protagonista Carrie neste novo filme?
Muitas jovens tentam ser atrizes todo ano, mas a Chloë é alguém com um currículo consistente no cinema e que fez ótimos trabalhos. E ela tem muita presença na tela! Então, por isso nós a escalamos desde o princípio…

 

E como foi trabalhar com ela?
Chloë Moretz é maravilhosa! Obviamente, qualquer diretor vai dizer isso sobre a sua estrela, mas o que é único nela é que é uma atriz fantástica que interpretou lindamente essa garota que amadurece e se torna adulta precocemente. Ela está prestes a desabrochar, e essa é a história do desabrochar de uma garota. Então, nós também tivemos a sua juventude a nosso favor.

 

O que significa para você, como cineasta, dizer que teve a juventude da atriz a seu favor?
Bem, temos toda a sua juventude; mas aí, precisamos transformá-la… No nosso primeiro encontro com a Chloë no set, duas coisas nos impressionaram: como ela era naturalmente jovem e, ao mesmo tempo, incrivelmente segura. Ela já tinha trabalhado com Martin Scorsese, Tim Burton e conseguiu se destacar naqueles papeis incríveis; mas esse seria um desafio dramático para ela, porque teríamos de transformá-la de menina em mulher, e na garota incrivelmente segura de si como a Carrie final.

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No set de filmagens de Carrie (2013)

Como você descreveria a relação de Carrie com a mãe, Margaret?
A relação profunda de mãe/filha entre Margaret e Carrie é o coração e a alma do filme, pois Margaret tenta impedir a filha de crescer e usar os seus poderes. Daí, o quadro se abre para incluir todos os demais personagens que contribuem empurrando Carrie para o seu fatídico fim. Eu queria fazer uma versão emocional, moderna e muito divertida dessa história.

 

Como você a encorajou a passar por essa transformação?
Dizendo que ela tinha que ter dentro de si uma adolescente rebelde. Isso a deixou intrigada… E, em termos dramáticos, ela tinha mesmo!

 

E o que você tem a dizer sobre Julianne Moore, que interpreta a mãe de Carrie?
É um sonho trabalhar com a Julianne! Ela possui muita experiência e domínio do seu ofício. E também tem instintos fantásticos, um lado selvagem e uma disposição para ultrapassar seus limites indo aonde a gente quer e precisa que ela vá para dar vida à personagem. Como diretora e roteirista, você escreve o material, imagina como ele será interpretado e, se tiver sorte, você consegue um ator do calibre e talento da Julianne para levá-lo a um lugar ainda mais profundo, realista e específico do que tinha imaginado. Ela está hipnotizante e é a alma deste filme junto com a Chloë.

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Gabriella Wilde e Kimberly Peirce no set de Carrie (2013)

Julianne e Chloë a surpreenderam de alguma maneira?
Ah, sim! Com a Chloë, é o seu nível de inocência e, não importa o quanto se escreva sobre as descobertas que ocorrem na sua idade, a verdade é que ela própria também está descobrindo e sentindo tudo pela primeira vez. E sem dúvida com a Julianne, é sua experiência e domínio do seu ofício, e sua disposição para ultrapassar os seus limites. O amor da sua personagem pela filha, e vice-versa, é o coração e a alma deste filme, e se você não tem duas atrizes como Julianne Moore e Chloë Moretz que compreendem o que significa esse amor e constroem essa relação, ele não funcionaria.

 

Você expande algumas personagens no seu filme que antes não tinham um arco muito significativo?
Sim, expandimos personagens como a Sue, e também outros elementos que estão no livro e que foram acentuados graças à tecnologia. Torço para que o resultado seja emocionante e único! Eu me apaixonei pelo livro e realmente vi uma oportunidade de dar melhores contornos a alguns desses personagens que tinham um começo e um fim, sem ter uma parte intermediária, como a Chris e o Billy. Acho que você deveria sempre tentar dar a cada personagem a maior autenticidade possível e uma motivação legítima para que o público acredite nele – especialmente nos seus vilões.

 

O bullying e a violência têm um papel-chave na história…
O bullying e a violência são parte da sociedade atual e eram temas que certamente já me interessavam antes, como em Meninos Não Choram (1999).

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Durante o lançamento de Carrie (2013) em Los Angeles

E Carrie: A Estranha é também muito divertido!
É, porque é possível fazer uma boa história de personagem que nos divirta nos cinemas, enquanto também reflita questões importantes da nossa cultura. Então, espero que o nosso filme o leve numa experiência divertida enquanto também aborda esses temas.

 

Para você, o que é fazer um filme?
Sem dúvida, o meu tipo de cinema tem a ver com imersão e personagem. Acho que o nosso filme é totalmente embasado nas relações entre os personagens. E é muito divertido podermos amplificar tudo ainda mais com ângulos fantásticos para ajudam a levar o público nessa aventura incrível, mantendo a sua verdade emocional!

 

Você acredita que ser mulher a ajudou a se identificar melhor com a Carrie e sua história?
Gosto de pensar que cineastas de qualquer gênero podem fazer os mesmos tipos de filmes; mas, sem dúvida, um cineasta se baseia nas próprias experiências. Eu ainda tenho mãe, e há questões da relação mãe/filha nesse filme que são magníficas. E também me identifico com a menina adolescente que se revolta! Então, você se aproveita do que pode da sua experiência, mas também segue adiante para contar a sua história.

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Julianne Moore, Kimberly Peirce e Chloë Grace Moretz na pré-estreia de Carrie (2013)

Foi uma grande responsabilidade contar uma história que tem tantos fãs de suas encarnações passadas?
A princípio, não via a ligação entre o meu trabalho e um remake de terror, mas quando reli o livro, ele me impactou num profundo nível pessoal. Assim como meus demais filmes, essa é uma narrativa movida pela protagonista, ainda assim, é também uma peça de elenco muito rica. Carrie atrai inúmeros personagens vibrantes que auxiliam e obstruem o seu caminho. E à medida que ela entra em conflito com cada um deles, seus destinos colidem num clímax violento maravilhosamente físico e emocional. O que me animou a fazer Carrie: A Estranha foi poder dar continuidade a esse tipo de obra e ampliá-la explorando o gênero terror, a fantasia e os efeitos visuais num cenário novo e emocionante.

 

Você gostou da oportunidade de trabalhar com efeitos visuais neste filme?
Para qualquer cineasta, é emocionante poder brincar com ferramentas mais modernas e maiores, mas o principal para mim é permanecer sempre enraizada na história e nos personagens. Espero que todos se apaixonem e odeiem a Carrie, a sua mãe, os demais personagens e a história, intensificados pelos efeitos.

 

Como você rodou a famosa cena em que despejam sangue sobre Carrie durante a festa de formatura?
Em geral, a gente cobre sequências de ação com várias câmeras, porque você, normalmente, só tem uma ou duas chances. Nós precisávamos que o banho de sangue fosse o mais impactante, apavorante e divertido possível. Então, foram meses de pesquisa e desenvolvimento, testando dezenas de banhos de sangue e encontrando todo o tipo de problema possível. Um balde virado direto erra o alvo; mas, usando uma calha, o que garantiria o alvo certo, a cabeça da pessoa acaba funcionando como um guarda-chuva, fazendo o líquido espirrar se abrindo para todos os lados. O sangue fino escorre rápido; o sangue espesso é nojento e pegajoso; sangue de menos acaba logo; sangue demais é uma avalanche. Nós gastamos de 3 a 5 galões, definimos a altura do despejo em 1,5m, escolhemos o ângulo de jorro de 45 graus e acertamos sua viscosidade e densidade até chegarmos ao visual certo. E ainda assim, não tínhamos nenhuma garantia de que tudo funcionaria quando Chloë estivesse naquele palco. Todos nós prendemos a respiração, e tudo funcionou! Todos me perguntam o volume de sangue que nós usamos para fazer o filme… eu diria que uns 1000 galões!

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O que você achou de toda a experiência?
As pessoas me perguntam se temo pelo resultado. É um risco, mas você mergulha fundo, dá tudo de si e torce para que a sua experiência, paixão, instintos e os de todos aqueles que você reuniu nessa jornada criem algo que seja divertido, surpreendente, apavorante e espetacular. Estou profundamente curiosa e empolgada em dar vida a essa coisa que todos nós amamos.

(Entrevista cedida com exclusividade no Brasil ao Papo de Cinema pela Sony Pictures)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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