“Minha paixão pelo cinema está no meu DNA”, afirma o cearense Halder Gomes, cineasta responsável por um dos sucessos mais surpreendentes do cinema nacional em 2013: Cine Holliúdy, longa baseado no curta homônimo do mesmo diretor e que, após passar mais de um ano percorrendo o circuito dos festivais, estreou em circuito limitado no nordeste brasileiro e, mesmo assim, somou mais de 100 mil espectadores em menos de um mês. Gomes é também roteirista, editor e produtor de títulos como Bezerra de Menezes (2008), Área Q (2011) e As Mães de Chico Xavier (2011). Sem se prender a um rótulo específico, por seu último trabalho recebeu elogios até de Fernando Meirelles, realizador indicado ao Oscar por Cidade de Deus (2002). E foi no meio de toda essa inesperada euforia que Halder Gomes conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!
Como nasceu a história de Cine Holliúdy?
Cine Holliúdy nasceu das minhas memórias lúdicas e inocentes da infância vivida no interior do Ceará, na década de 70. Os cineminhas e seus filmes de kung fu, Hercules, Tarzan, etc… me fascinavam, assim como as artes marciais, que seria minha profissão por mais de 20 anos – sou mestre 4° grau em Tae-kwon-do. Em 2004, rodei o curta O Artista Contra o Cabra do Mal, que era um pequeno recorte do que viria a ser o longa. O sucesso foi tanto que todo mundo que via queria mais. Esta demanda espontânea me fez ir em frente e fazer o longa.
Apesar de ser uma comédia, o filme trata de temas sérios, como a preservação da memória e da cultura nas pequenas cidades do interior do Brasil. Por que a escolha desse formato para abordar tais assuntos?
Pois é, o filme fala de algo muito triste e melancólico, com muito humor e otimismo. Creio que só o humor cearense poderia lidar com esta ambiguidade. A escolha foi tentar passar este universo e seu momento através do olhar ingênuo de uma criança, que assim como eu, na época, não conseguia entender que estava vivendo o fim de uma era.
Como foi feita a seleção do elenco?
O protagonista, Edmilson Filho, já estava mais que definido, afinal ele foi o ator do curta e virou um ícone. Muitos outros eu já tinha em mente e escrevi os personagens com referências de quem os interpretaria. Outros, fiz teste até encontrar o perfil desejado. Fiz muita preparação com os não atores mirins selecionados.
Como nomes como Roberto Bomtempo e Falcão foram atraídos pelo projeto?
A Miriam Freeland – esposa do Bomtempo – faz a protagonista feminina, e então o convidei também e ele topou. O Falcão faz parte do elenco de humoristas nossos muito especiais que temos no filme. São ícones do nosso humor – Falcão, João Netto, Karla Karenina, Luciano Lopes, “Bolachinha”. Não faria sentido ter estas joias em casa e não tê-los no filme. Foi uma forma até mesmo de tributo a estes artistas que são nossos embaixadores.
Além de diretor, você é também produtor de filmes que fogem do convencional, como Bezerra de Menezes (2008), um sucesso de bilheteria focado no público espírita, e Área Q (2011), uma coprodução internacional. Como você define cada novo passo de sua carreira no cinema?
Não me prendo a rótulos. Faço tudo que considero interessante e que me desafie ao extremo. Fui competidor nas artes marciais, e este sentimento está no sangue. Por outro lado, já vivi muitas vidas em uma só – surf, tae-kwon-do, artes plásticas, etc… e isto me dá um background muito amplo de vivências pra criar histórias.
Cine Holliúdy resgata nomes importantes do cinema nacional, como Mazzaropi e Os Trapalhões, ao mesmo tempo que homenageia títulos de destaque do cenário internacional, como Cinema Paradiso (1988). Essas foram mesmo suas referências no desenvolvimento deste projeto ou houveram outras?
Sou fã dos cantores populares da década de 1970 (Marcio Greyck, Odair José, Paulo Sérgio, Fernando Mendes, Evaldo Braga, Diana…). Os escuto sempre e fazem parte da trilha musical da minha vida. Queria homenageá-los no filme, coisa de fã, mesmo. Márcio Greyck faz uma participação especial, e tem muitas músicas desta geração no filme. Tem também referências a Bruce Lee e outros tantos, assim como de muitos filmes. O filme é muito original, pois é um mundo particular que vivi. É um filme autoral, e estas referências fazem parte desta autoralidade. Cresci rindo do Didi e vendo seus filmes, assistindo e imitando Bruce Lee. O filme transita por este universo eclético de referências.
Após a passagem por tantos festivais e exibições especiais, o que esperar de Cine Holliúdy agora que ele finalmente está chegando ao circuito comercial?
Agora já não é mais esperar. O filme abriu no início de agosto nos cinemas cearenses com 55% de todos os ingressos vendidos no estado. Sozinho, fez mais do que Wolverine: Imortal, O Homem de Aço, Os Smurfs 2, Meu Malvado Favorito 2, Turbo, etc juntos… Algo completamente fora dos padrões de mercado, com um elenco sem protagonistas globais! A média por cópia ficou próxima de 2 mil ingressos no primeiro fim de semana, com mais de 100 mil ingressos vendidos somente no Ceará antes do final do mês. Agora nosso foco é o lançamento nacional. A esta inicial, de lançar primeiro em casa, surtiu efeito e ganhamos confiança para o restante do país.
(Entrevista feita com o diretor por email em 11 de agosto de 2013)