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Marcelo Machado nasceu em Araraquara, interior de São Paulo, no dia 8 de junho de 1958. Formado em Arquitetura pela USP, começou sua aventura pelo universo das imagens ao fundar, em 1981, ao lado dos colegas Fernando Meirelles e Paulo Morelli, a produtora Olhar Eletrônico. Desde então passou pela TV Gazeta, TV Cultura, MTV Brasil, pela agência de propaganda DPZ e pelo canal de televisão Multishow. Especializado em documentários, realizou obras sobre o arquiteto Oscar Niemeyer, sobre o artista Keith Haring e sobre o músico Claudio Zoli. Em 2005, assinou a co-direção do seu primeiro longa-metragem, Ginga, ao lado de Hank Levine e Tocha Alves, uma investigação sobre o futebol brasileiro. Em 2012 lançou nos cinemas talvez seu trabalho mais aplaudido até o momento: Tropicália, que recuperava imagens raras do movimento tropicalista além de apresentar entrevistas inéditas com nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Tom Zé. E foi sobre esse longa que o cineasta conversou com o Papo de Cinema. Confira!

 

O Tropicália foi um filme muito bem recebido pela crítica. Mas como você avaliaria a recepção do público durante sua exibição nos cinemas?

Durante a exibição a recepção do público foi muito quente e emocionada. Houveram várias sessões com longos aplausos no final, coisa difícil de se ver no cinema. Nos festivais em que estive presente, as salas estiveram sempre cheias e muitas vezes lotadas. Filas na porta em Telluride (USA), Lisboa (Portugal) ou Buenos Aires (Argentina). Acho que o filme tem méritos, mas acredito que a genialidade dos músicos que são os protagonistas dessa história abriram muitas portas. Principalmente dos corações.

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Tropicália está chegando agora em home video. Você acredita que este novo formato possa facilitar uma redescoberta da obra?

Não dá para falar em redescoberta de um filme que foi lançado em Setembro e está saindo em DVD em Dezembro. Ele vai chegar ainda quente na maioria do público. E acho que nosso doc tem uma cauda longa, pode existir ainda por muito tempo.

 

Muito antes da estreia no Brasil Tropicália já havia sido premiado internacionalmente. Como foi levar um documentário tão brasileiro, tão verde e amarelo, para ser exibido em lugares distantes como os Estados Unidos ou a Coréia do Sul?

Foi com orgulho, com alegria, com muita emoção. É uma delicia fazer parte dessa adoração que as plateias ao redor do mundo tem pelo Brasil e sua música. Eu já sabia disso, é verdade, mas viver isso, estar presente e ser aplaudido ou cumprimentado por isso foi maravilhoso. Os ingleses usam a expressão “soft-power”, que são as formas com que um país pode se afirmar perante os outros que não seja pelas armas ou pela diplomacia. Nós temos uma imagem de alegria e criatividade que é internacionalmente reconhecida. Justa ou injustamente. Temos as portas abertas e significamos algo que ainda estou tentando entender direito o que é. Digo isso porque acho que o país ainda é muito injusto socialmente, descuidado com seus patrimônios materiais ou imateriais, descuidado com o ambiente, com sua gente e até com sua memória e imagem. E mesmo assim, somos tão queridos. Quase incompreensível.

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Cena do documentário Tropicália

Neste mesmo ano outros filmes que abordavam este movimento, como Jorge Mautner – O Filho do Holocausto e Futuro do Pretérito – Tropicalismo Now, também percorreram o circuito dos festivais e chegaram a um público ávido por saber mais sobre o assunto. A que você justificaria esse interesse atual?

Acho que nossos filmes vem numa onda que já rola há alguns anos de documentários musicais. É o reconhecimento dessa força que descrevi antes. Estamos documentando uma expressão cultural reconhecida internacionalmente, mas talvez pouco conhecida aqui dentro. Estamos trazendo os personagens e a estórias das nossas adolescências para as telas porque sabemos que há um público interessado em conhecê-las, mais e mais. Acredito também que os outros diretores dividem comigo o mesmo amor à música.

 

Um dos maiores méritos de Tropicália é a incrível pesquisa de imagens e os depoimentos, muito variados e bem distribuídos ao longo do enredo. Como foi possível conseguir esse material e como foi o processo de organizá-lo num único roteiro?

Primeiro nos cercamos dos melhores pesquisadores que existem no Brasil hoje, a Eloá Chouzal e o Antonio Venâncio. Eles tem feito pesquisas para muitos longas metragens, e com sua experiência abriram diversos caminhos. Depois me dediquei bastante, lendo tudo o que encontrei sobre o assunto. Isso me levava a fazer relações, conexões e a ter ideias novas de onde e como pesquisar. Ficava pedindo sempre mais e melhor. É o caso da cena inicial, um programa ao vivo na RTP (Radio e Televisão Portuguesa) que encontrei lendo as cartas que o Caetano escreveu para o Pasquim. Ele se referia ao programa e tive imediatamente a ideia de buscar esse material que estava fácil de encontrar, bastando apenas procurá-lo. Outras coisas vieram dos principais diretores e realizadores do cinema brasileiro no período, não só usando os filmes, mas o material bruto de pessoas como Silvio Da-Rin, Eduardo Escorel e Leon Hirszman. Recorri também ao material bruto de outros projetos, como as entrevistas feitas por Pedro Vieira para seu documentário com o Rogério Duprat, ou o depoimento da Rita Lee gravada por Carlos Ebert e Marcello Bartz.

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Tropicália acabou de ser premiado pela APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte, e certamente será lembrado como um dos melhores longas nacionais produzidos neste ano. Reconhecimentos assim justificam todo o esforço gerado para a realização de um trabalho como esse?

Claro que eu e toda equipe estamos felizes com o prêmio e sentindo que valeu muito à pena o esforço, a ‘ralação’, esse trabalho que, ao contrário dos longas de ficção, não é bem pago. Fizemos com amor e muita dedicação e tínhamos sempre uma ambição de não repetir fórmulas, de buscar novas formas de narrar. Principalmente, tendo vindo do vídeo e da televisão, era a vontade de fazer “um filme”, de fazer cinema com suas características próprias, para a tela grande, com o tempo estendido. Então, sem falsa modéstia, nós merecemos e vamos comemorar junto com o Futuro do Pretérito, com quem dividimos esse prêmio.

 

(Entrevista feita por email em Dezembro de 2012)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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