André Ristum levou para casa o kikito de Melhor Direção por A Voz do Silêncio (2018), ou seja, garantiu uma das láureas mais cobiçadas do Festival de Gramado. Não é para menos. Sua precisão no que diz respeito às nuances das relações, à abordagem delicada de temas espinhosos, como as várias facetas da loucura, é realmente digna de reconhecimento. André começou a a carreira como assistente de produção de filmes italianos, quando morava na Europa. Estudou cinema dos Estados Unidos e foi editor/diretor na TV Cultura. Essa experiência acumulada se percebe na forma sensível dele conduzir os dramas em seus trabalhos, especialmente nos longas-metragens. A Voz do Silêncio é o seu terceiro. Antes dele vieram O Outro Lado do Paraíso (2014) e Meu País (2011), todos centrados em relações familiares, tema obviamente bastante caro ao realizador. Conversamos com André no dia posterior à estreia do seu filme no Festival de Gramado. Este Papo de Cinema exclusivo você confere a seguir.
Como foi o seu trabalho especificamente com a Marieta Severo nesse filme?
Com base no nosso conhecimento sobre a personagem, dá para dizer que ela tem uma patologia, uma questão psiquiátrica, não sei bem como definir. Todavia, não tem noção disso. Isso vai invadindo a sua vida de uma forma real. Então, a Marieta precisava construir uma coisa com a qual não tinha um relacionamento próximo. A Marieta estudou, leu a respeito, viu filmes de ficção e documentários. O desafio era tentar entender a condição. Não se sabe onde está a realidade e onde está a loucura. A personagem mistura muito, pois para ela tudo é real.
Houve muitos ensaios antes das filmagens?
Fizemos uma preparação com o Luiz Mário Vicente, que foi imprescindível. Nesse processo, trabalhamos bastante a questão dos relacionamentos. Houve uma dinâmica específica da Marieta com a Stephanie, até porque elas contracenam o filme inteiro, mas, curioso, também teve uma da Marieta com Arlindo, e eles não contracenam. Fizemos essa preparação para que eles desenvolvessem o laço, até porque conversam pelo telefone e precisam disso.
O filme é cheio de nuances. Como atingir um equilíbrio entre o que se fala e o que se cala no roteiro?
Esse equilíbrio vai sendo encontrado aos poucos. O roteiro sempre é mais do que o resto. E aí você vai tirando, já a partir dos ensaios, mas é um processo que continua no set e que vai até a montagem, circunstância em que a gente acaba lapidando ainda mais. Começamos com bloco de mármore e termina com uma estátua. O esforço é para encontrar a natureza da história.
Apesar da distância entre alguns personagens, é tudo uma grande família. A ideia era realmente fazer com que as histórias fossem peças de um quebra-cabeça?
É realmente um grande quebra-cabeça. Um dos alicerces do filme é a família e suas relações, como a cidade grande esgarça um pouco esses laços, nos afasta de certos valores. Acabamos sendo empurrados a um cotidiano de atropelos. Não temos tempo para coisas que, no meu humilde entender, são muito importantes. Esse filme tem uma arquitetura de roteiro complexa, na qual tentei inserir vários assuntos e temas que mexem comigo. Os elos familiares, a loucura sob vários aspectos, até para discutir quem estabelece os parâmetros da loucura.
Como se deu a escolha do elenco, repleto de talentos tão diversos?
Compor o elenco foi incrível. O trabalho com Alessandra Tozzi, produtora de elenco, foi sensacional. Já tinha alguns atores e atrizes em mente desde a fase da escrita do roteiro. Queria muito a Marieta para essa personagem. O papel da Stephanie foi escrito para ela. Já tinha feito com o Arlindo um especial do Chitãozinho e Xororó e desde lá disse que gostaria de tê-lo num filme meu. Tenho com o Nicola uma parceria de muitos anos. Adoro o Marat nos filmes do Marco Dutra, tanto que botei na cabeça que um dia trabalharia com ele. Foi assim.
(Entrevista feita ao vivo, em agosto de 2018, durante o Festival de Gramado)
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