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Nascido no interior mineiro, Vladimir Brichta foi morar na Bahia ainda muito cedo, e de lá traz suas principais referências como artista. Seu nome é uma homenagem ao jornalista político Vladimir Herzog, morto durante a ditadura militar no Brasil, mas esse lado sério de sua personalidade tem ficado mais restrito. Brichta tem usado muito do seu bom humor nos últimos anos, participando de novelas e seriados que lhe tornaram popular pela comicidade ou pelos ares de galã. No entanto, ele está disposto a mostrar que pode ir além dessa primeira impressão, e após dar os primeiros passos nesse sentido no teatro, chegou agora a vez do cinema. Em 2013 foi protagonista do drama A Coleção Invisível, premiado em festivais no Brasil e no exterior, e se prepara para aparecer em outros três longas-metragens do mesmo gênero em 2014. E foi sobre esse trabalho mais recente, e também sobre seus próximos projetos, que o ator conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!

 

Faz quase um ano que A Coleção Invisível está circulando pelos festivais. Foi comentado muito como o filme tem crescido junto ao olho do público. Como é que você analisa essa jornada?
Isso é curiosíssimo. É um filme que está pronto, mas não é como o teatro, que a cada apresentação você pode refazer. A Coleção Invisível está pronto, mas de fato possui vida nesse sentido, de ir achando seu público. Então isso faz sentido, o filmamos em 2011 e o finalizamos no final daquele ano. De lá para cá, estivemos em Havana, na Mostra de São Paulo, fomos premiados em Gramado e em Lisboa ganhamos como Melhor Filme.

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Vladimir Brichta, Ludmila Rosa e Paulo Cesar Pereira na apresentação de A Coleção Invisível no Festival de Gramado

Além de Lisboa, A Coleção Invisível circulou também por outros festivais da Europa, não?
Sim, estivemos também na Holanda e em Berlim. O filme está achando sua maneira de se comunicar onde quer que seja exibido. Aqui no Brasil já entrou em cartaz, e há um espaço muito bacana na Bahia que o proprietário possui também várias salas em Portugal, e ele adorou o nosso trabalho e acabou virando parceiro. Não temos a Globo Filmes por trás, não tivemos um orçamento impressionante que viabilizasse um belo lançamento, mas estamos andando aos poucos. São parcerias como essa que importam. É uma história que está tocando as pessoas e fazendo com que tudo caminhe.

 

Seu personagem tem um perfil diferente daquele que você costuma fazer na TV e também no cinema, que geralmente tem um lado cômico muito forte. Como foi investir nesse outro tom de atuação?
A questão entre o humor e o drama na minha vida torna essa discussão recorrente. Comecei a carreira no teatro, em Salvador, no início dos anos 1990. Naquela época, o que eu fazia era drama. Os principais trabalhos, nos quais me destaquei e fui premiado, eram dramáticos. Quando fui para a televisão, em 2001, iniciei fazendo humor em novelas. A peça A Máquina, um espetáculo ímpar, chegou a ser premiado como Melhor Musical em um festival, e em outro ganhou como Melhor Comédia. Então essa coisa “não classificada” talvez seja o que mais me agrade. Experimentar diversos gêneros, e às vezes nem reconhecê-los em um trabalho. Porém, na última década, o humor esteve muito presente, principalmente na televisão, que possui mais impacto que qualquer outro veículo. Em 2010, percebi que estava saudoso do drama, e fui fazer uma peça chamada Hamelin. Não era um dramalhão, e sim um texto seco, mas de verdade, incômodo, que buscava um resgate em direção ao drama. Bernard Attal (diretor de A Coleção Invisível) acabou assistindo a esse espetáculo em Salvador. Talvez já tivesse algum interesse em mim, mas bateu o martelo, certamente, depois da peça, me convidando logo em seguida. Este é o primeiro drama que faço no cinema, o que resgata um pouco o início da minha carreira no teatro, e ao mesmo tempo é experimentar o novo. Foi uma oportunidade de contar uma história linda, independente do gênero. Depois de doze anos de televisão fazendo humor, sinto que seja importante mostrar ao público esse meu outro lado.

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Vladimir Brichta e Alinne Moraes em Fica Comigo Esta Noite

Como foi assumir um papel de protagonista ao lado de um elenco de nomes tão fortes?
Fiz Fica Comigo Esta Noite (2006), e aquele foi um filme que me dava essa sensação verdadeira de ser protagonista. Mais seis anos se passaram, e finalmente tive com A Coleção Invisível uma nova oportunidade de protagonizar um filme. Curiosamente depois disso, filmei outros dois longas como protagonista. De alguma forma me abriu esse caminho. É um presente que ganhei.

 

Você faz parte da mesma geração de talentos baianos que Lázaro Ramos e Wagner Moura. Mas, ao contrário deles, sempre investiu mais na televisão do que no cinema. Por quê?
Somos muito amigos, de fato. A geração é enorme, posso citar diversos nomes que são referência para mim, e que sei que sou para eles. Nós três participamos do filme A Máquina (2005), o que nos uniu ainda mais. Em relação a cinema, eles começaram antes, e eu fui direto para a televisão. Eles fizeram muito cinema, não posso me comparar. Sou um grande admirador do trabalho deles. Pelo o que produziram, sou grato por ser amigo e ter uma trajetória no teatro parecida. No entanto, somos conhecidos igualmente, nossa popularidade é bastante similar, mas quando o assunto é cinema sinto que tenho muito mais a aprender com eles do que ensinar. A Coleção Invisível, no entanto, é um filme que me deixa muito orgulhoso e que me faz de alguma forma pensar que estou também neste mercado, seja como protagonista ou não, e que sou capaz.

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Vladimir Brichta, Gustavo Falcão, Wagner Moura e Lázaro Ramos no elenco de A Máquina

O único longa em que vocês estão juntos é A Máquina. Não há algum projeto para juntar os três amigos?
Os dois estão indo para trás das telas, Wagner está no estrangeiro. Está difícil (risos). Agora que estou chegando, eles estão indo embora! Mas isso vai acontecer algum dia. Seria um grande barato. Espero que aconteça antes que o trio elétrico que vamos puxar um dia juntos na Bahia (mais risos).

 

Você fala da Bahia com um carinho enorme, mas de fato nasceu em Minas Gerais, certo?
Sim. Nasci em Diamantina, no interior de Minas Gerais, mas cresci e me criei em Salvador. Cheguei na Bahia com apenas quatro anos, só que saí de Minas com um. Antes passei três anos na Alemanha, enquanto meu pai fazia doutorado.

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Vladimir Brichat, Ludmila Rosa e o diretor Bernard Attal

A Coleção Invisível possui uma relação muito própria com a Bahia. Ele é, de certa forma, um reencontro com as tuas origens?
Este filme é um resgate, um reencontro. Fiquei muito feliz quando li o roteiro, que me deixou com muita vontade de fazer. Tinha uma série de coisas em vista, das quais acabei largando mão pra realizar esse trabalho. Estava certo que o faria. Queria contar essa história, reconheci o olhar urbano daquele personagem, que é um pouco do meu olhar. Cresci em uma fazenda de cacau, mas de qualquer forma sou um cara urbano, de Salvador, assim como esse personagem. E não é muito comum em filmes baianos ter esse retrato urbano, da classe média. É um filme pós-Jorge Amado, um passo seguinte. Quando a história chega no universo do Jorge Amado, aquilo tudo está dizimado. 

 

Você tem algum outro filme que esteja trabalhando?
Há um projeto pronto, um filme que fiz em 2012 e que se chama Minutos Atrás, de Caio Sóh, inspirado em sua peça. São apenas três atores, eu, Otávio Müller e Paulo Moska, sendo que Paulinho faz um cavalo que puxa uma carroça. É um filme doido, bem conceitual. Só Deus sabe no que dará. Nos jogamos de corpo e alma. Filmamos em duas semanas e não houve uma única cena sequer que tivemos que voltar para resolver problema de foco, por exemplo. Saíamos correndo e o câmera atrás da gente. É inspirado em uma história que, a grosso modo, são dois indivíduos andarilhos que discutem a morte, o medo, a fome, a saudade, etc. Tem Dom Quixote, Sancho Pança, algo dos Trapalhões na Serra Pelada. Tudo deve ficar pronto até o final do ano, então imagino que a produção esteja de olho nos festivais e mostras. Outro filme que fiz no início desse ano se chama Muitos Homens Num Só, é o primeiro longa de ficção da Mini Kerti. É inspirado na obra de João do Rio, Memórias de um Rato de Hotel. São lembranças reais de um ladrão que existia no início do século passado, uma falsa autobiografia, assinada com nome falso, que anos depois descobriram que o autor se chamava Artur Maciel. Era um ladrão célebre que os jornais o tratavam como Dr. Antônio. Juntando com outras obras de Rio, fizemos um filme de época, mas é também uma história de amor. Faço par com Alice Braga. Ele está sendo montado, e deve ficar pronto para o final do ano que vem.

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Jorge Furtado, Vitoria Strada, Francisco Cuoco, Adriana Esteves e Vladimir Brichta no set de Beleza

E há também um projeto no Rio Grande do Sul, não?
Sim, esse é algo com o qual estou envolvido de corpo inteiro, tem me dado muito prazer. Estamos filmando Beleza, do Jorge Furtado. O trabalho é todo no Rio Grande do Sul, e estou pela primeira vez ao lado da minha esposa, a Adriana Esteves. Estamos muito emocionados, muito empolgados, acreditamos muito nesse projeto. E trata-se do primeiro drama do Furtado, então vou ensinar para ele um pouco como fazer drama em cinema (risos).

(Entrevista feita ao vivo em Gramado, no Rio Grande do Sul)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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