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Olivier Rabourdin é um ator experiente: desde o começo dos anos 1990, já atuou em quase cem filmes e séries, incluindo o drama religioso Homens e Deuses (2010), pelo qual foi indicado ao prêmio César, a saga Busca Implacável (2008 – 2012), a comédia Meia-Noite em Paris (2011) e o polêmico Benedetta (2021). Em novembro, ele veio a São Paulo e ao Rio de Janeiro, junto à comitiva do 12º Festival Varilux de Cinema Francês, para apresentar um suspense de grande sucesso na França: Caixa Preta (2021), de Yann Gozlan.
Na trama, Rabourdin interpreta Victor Pollock, responsável pelo serviço de segurança aérea do maior instituto aeronáutico da França. Quando o voo Paris-Dubai cai misteriosamente, ele é encarregado de encontrar os motivos da queda. Apesar de ter à disposição Mathieu (Pierre Niney), garoto prodígio das escutas de segurança, prefere retirá-lo do caso. O que Pollock teria a esconder? Para qual lado estaria jogando? Mathieu parte numa investigação própria, encontrando segredos sombrios por trás do acidente.
O Papo de Cinema conversou com o ator francês a respeito do filme, exibido em dezenas de cidades brasileiras, pelo Festival Varilux, até o dia 8 de dezembro:

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Olivier Rabourdin. Foto: Frédéric Stucin / Libération

Você fez alguma pesquisa ou laboratório para viver um especialista em segurança aérea?
Não. Eu nem tinha muito conhecimento técnico sobre o tema. Tudo depende do papel, na verdade. No caso de Homens e Deuses, por exemplo, era realmente útil passar um tempo com os monges. Todos os atores do filme viajaram ao local, aprenderam a cantar a liturgia. Neste caso, o principal conflito do meu personagem diz respeito a uma relação humana entre Pollock e Mathieu, interpretado por Pierre Niney. Não se compreende a princípio porque ele tem atitudes tão ríspidas com o rapaz, mas isso será esclarecido no final. Não existe nenhum dilema técnico que justifique um mergulho aprofundado na segurança aérea.

Pollock é um personagem ambíguo: só descobrimos no final de qual lado ele está. Era importante preservar essa ambiguidade na sua interpretação?
Na verdade, neste filme eu trabalhei muito perto de Yann Gozlan. É o segundo filme que faço com ele, depois de Asfalto de Sangue (2017). Existia uma relação de cumplicidade: eu seguia cada indicação dele. Em Caixa Preta, Mathieu interpreta um alter-ego de Yann, que é um homem meticuloso, concentrado, teimoso, obcecado pela perfeição. Quando filmo com ele, já tenho uma ideia como será o personagem, e obviamente é interessante deixar o máximo de ambiguidade possível para aprofundar o mistério. Mas para chegar lá, fui seguindo cada indicação de Yann. Ele fornece direções muito precisas aos atores, e gosto de tentar chegar exatamente no ponto que ele pede. É um desafio atingir a nota exata que ele deseja. 

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Olivier Rabourdin e Pierre Niney em Caixa Preta

Ele deu referências da literatura ou de outros filmes, exigiu muitos ensaios?
Não trabalhamos com referências, apenas na construção cena a cena, conforme ela era filmada. Para a cena da gravação em vídeo, discutimos bastante o objetivo e o tom daquele registro, pausa por pausa. Gravamos uma primeira vez, num cenário específico, de maneira bem rápida. Yann não gostou, e preferiu refazer. Depois do fim das filmagens, passamos um dia a mais no cenário da casa dele, refazendo esta cena e acertando o tom da fala até ficar perfeito. Isso me deixa tranquilo: trabalhar com um diretor que, mesmo após a cena terminada, ainda se dá a liberdade de dizer “Vamos refazer”, porque não ficou à altura do que ele esperava. Isso já ocorreu uma vez com Xavier Beauvois em Les Gardiennes (2017), onde eu interpreto um homem que parte para a Primeira Guerra Mundial e volta com uma dispensa. Tem uma cena onde eu conto esse percurso, com uma voz bem forte. Filmamos uma parte no verão, e outra no inverno, para indicar a passagem dos anos. Quando voltei no inverno, ele me disse: “Sabe, eu revi essa cena, e me enganei na abordagem. Vamos precisar fazer de novo, de outra maneira”. Para mim, isso é uma alegria. Adoro diretores perfeccionistas a esse ponto, ao invés de dizer: “Bom, é só uma cena, talvez não tenha ficado perfeita, mas seguimos em frente”. Com Yann, eu sei que, quando ele diz que ficou bom, ele está realmente contente com o resultado. Então eu me sinto seguro.

É interessante você falar sobre o prazer da repetição, porque alguns atores preferem o frescor das primeiras tomadas, e dizem que a atuação fica mecânica quando se repete muito.
Depende muito do projeto. Caixa Preta é um filme sobre uma pessoa extremamente meticulosa, capaz de escutar algo que ninguém mais ouve. Então isso exige uma precisão e um rigor excepcionais na direção, na atuação, além do tratamento sonoro, claro. Outros filmes precisam de mais espontaneidade: em Homens e Deuses, existe uma cena onde estou sozinho na minha cela, e me sinto mal. Essa cena nunca existiu no roteiro. Eu estava ali, no cenário, porque era um lugar agradável do monastério. O assistente veio me dizer: “Vai colocar o seu figurino. Xavier tem uma ideia de cena”. Então, cheguei e Xavier me disse: “Olha só. A câmera vai ficar ali, você está sozinho na sua cela. É noite, e você começa a se sentir mal. Você tem dez minutos”. Fizemos numa tomada só. Então isso depende do projeto: a maneira de trabalhar deve ser adaptada ao filme, ao tema e à abordagem. O que me interessa, enquanto ator, é adaptar a minha maneira de trabalhar às necessidades de cada projeto. 

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Yann Gozlan, Pierre Niney e Olivier Rabourdin nas filmagens de Caixa Preta

Não conhecemos os posicionamentos de Pollock antes da tragédia do voo Dubai-Paris. Chegou a construir o passado deste homem?
Um pouco. Imaginamos estas relações juntos. Pollock tem um vínculo muito particular com Mathieu. Ele percebe que o rapaz é extremamente talentoso. Em determinada cena, descobrimos que Mathieu cometeu um erro grave no passado, e foi provavelmente Pollock quem disse: “Ele fica com a equipe. Todo mundo pode cometer erros. Eu confio nele e acredito que ele deva ficar”. Por isso, no fundo, é tão estranho que no começo dessa investigação, Pollock se recuse a ter Mathieu trabalhando no caso. 

O filme explora a paranoia, o medo do outro. Como percebe estes aspectos na trama, especialmente a islamofobia?
Na França, atualmente, o medo do outro se transformou no pretexto perfeito para se dizer absurdos e evitar os verdadeiros problemas. Nas campanhas eleitorais, a preocupação principal dos cidadãos diz respeito ao poder aquisitivo. Por isso tivemos os coletes amarelos: as pessoas mal conseguem sobreviver do jeito que as coisas estão, e se aumentarem os impostos e a gasolina, não poderão mais comer. Mas uma parcela dos políticos desvia do problema evidente para dizer: “Na verdade, o problema é a imigração e o islamismo, que não se encaixam na nossa cultura”. Essa é uma grande besteira, não tem sentido nenhum. Só serve para tirar a atenção dos problemas reais. Algo semelhante ocorre em Caixa Preta. Ocorre o acidente devido a uma falha do avião. Isso ocorre com frequência: uma empresa entrega seu produto rápido demais, mesmo que ainda não esteja pronto. Quando é a Apple entregando algum celular que ainda tem alguns problemas, isso atrapalha. Quando se trata de um avião, é algo criminoso. Por isso, encontraram rapidamente uma desculpa: um islamista fazendo um atentado. É o pretexto ideal para que todos se concentrem nesse aspecto. Basta incluir um “Allahu Akbar” na pista sonora e pronto: todos acreditam que compreenderam as causas. O filme tem um conteúdo realmente político.

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Por este fator, acredita que devemos desconfiar da segurança dos produtos à disposição, incluindo os aviões nos quais voamos, ou isso diz respeito apenas à ficção?
Eu acredito que problemas como esse acontecem de verdade. Teve a história horrível do voo Rio-Paris, e se eu compreendi bem, ele sofreu o acidente porque aparelhos de medida sofreram uma pane. De repente, os pilotos não sabiam mais em que altura estavam. Teve o Boeing 737 Max, com um problema no motor e um sistema de controle que se desestabilizou. Então o avião começou a descer, e o piloto não controlava mais os dispositivos. Então, de fato, histórias como essas acontecem. Isso não ocorre todos os dias, felizmente, mas nestes casos, uma única vez já é demais. Algumas coisas precisam ser perfeitas, incluindo os aviões. Não dá para dizer: “Nossos aviões são ótimos, só de vez em quando tem algum aparelho que quebra”. Eu não embarcaria nesse avião jamais!

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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