Escolhido para representar o Brasil no Oscar 2022, Deserto Particular (2021) vem angariando elogios e prêmios por onde passa – recentemente venceu o Mix Brasil e o Cine PE. Um dos destaques desse longa-metragem é o jovem ator Pedro Fasanaro. Ele interpreta Robson, jovem gay que mora com a avó evangélica numa cidadezinha do interior da Bahia e que tem a sua rotina alterada drasticamente com a chegada de um quase estranho vindo dos confins do Sul do Brasil em busca da misteriosa Sara (quem será ela?). Aproveitando a passagem do ator pelo Cine PE, onde estávamos para fazer a cobertura do evento, conversamos com Pedro Fasanaro a respeito de como foi a escolha dele para esse papel protagonista, de que modo se deu a preparação do elenco e, de quebra, perguntamos a ele como está o coração desde que o filme foi eleito pela Academia Brasileira de Cinema para ser o Brasil na maior festa de Hollywood. Preparados? Pois, fiquem com nossa entrevista exclusiva com Pedro Fasanaro.
Como foi esse processo até ser escolhido para interpretar um dos protagonistas do filme?
Vi uma chamada no Instagram procurando atores com determinadas características e enviei meu material. Alguns dias depois o Aly Muritiba entrou em contato comigo, trocamos algumas ligações e pouco tempo depois ele me convidou para um café no Rio de Janeiro. Já confirmamos ali mesmo que o trabalho iria rolar. Fui descobrir que o Antonio Saboia iria ser o outro protagonista justamente nesse café. O Antonio chegou repentinamente um pouco tempo depois de mim. Não o conhecia pessoalmente, mas foi ali a primeira vez em que nos encontramos.
E, de cara, você teve acesso ao roteiro inteiro ou o contato com o personagem foi gradual?
Foi um processo muito mais gradual de contato com o personagem. Só recebi o roteiro inteiro um tempo depois da confirmação de que estaria no filme. De início, apenas sabia que era preciso um atuante de aparência que não definisse um gênero.
E como foi a preparação de vocês, especialmente a tua e a do Antonio Sabóia?
Tivemos uma preparadora muito foda, que foi a Nara Chaib Mendes. Ela é incrível. Nos trouxe técnicas para construirmos memória, o subtexto, meio que moldando o psicológico desses personagens. Eu tinha encontrado o Antonio Saboia somente na vez do café. Chegávamos em horários diferentes aos ensaios, a Nara nos vendava e passávamos horas conversando sem nos ver, como se não estivéssemos no mesmo espaço. Dessa forma fomos construindo um imaginário. Fomos para a Bahia, nos esbarrávamos vez ou outra pelo hotel, mas deixamos o primeiro beijo, o primeiro toque, o primeiro encontro, para o dia de gravação da cena. Então nesse dia houve uma catarse, um gozo para os dois, pois vínhamos construindo isso há algum tempo. A expectativa estava altíssima.
E você tinha alguma preocupação pelo fato do filme, que aborda questões relativas à representatividade LGBTQIA+, ser dirigido por um homem branco, hétero, cis?
Tinha minhas preocupações, sim. Quando li o roteiro, vi que era um filme muito delicado que, como você disse, seria dirigido por um homem branco, hétero e cis. Tive certo receio de não ter tanta voz. Mas, rapidamente percebi que o Aly é uma pessoa super flexível, ele estava super aberto para conversar. Mas, obviamente que isso passou pela minha cabeça em algum momento.
E os processos de ensaio e filmagem alteraram muito do que estava previsto no roteiro?
Houve alterações, fomos construindo coisas no processo. Muita coisa acabou sendo reorganizada, pois íamos sentindo na prática. Nossa preocupação era que fosse um trabalho justo e que não acabasse vilanizando (sic) qualquer personagem. De certa forma, gosto de contemplar que os dois são vítimas de algo maior. Então era preciso que eles fossem representados de maneira justa. Não estamos falando de alguém salvando alguém, mas de dois humanos se descobrindo, aprendendo, tentando entender o que é justo para cada um deles.
A divulgação do filme não enfatiza o componente LGTBQIA+ e o Aly Muritiba disse em algumas ocasiões que isso é proposital, para que alguém desavisado, que não iria assistir ao filme por preconceito, seja fisgado por essa história humana. O que você acha dessa estratégia?
Eu acho ótima. Recentemente, estávamos numa pré-estreia em São Paulo e um amigo levou o pai para assistir ao filme. Quando ele chegou com o pai, fiquei um pouco receoso (risos). Mas, achei ótimo. E no final do filme, o pai estava super feliz e emocionado. Seria muito preguiçoso da nossa parte ficar rodando apenas dentro da nossa bolha. Esse filme precisa chegar a outros espaços, justamente para que consigamos o mínimo de transformação que buscamos. Para isso é preciso acessar outras camadas. Essa é uma estratégia de divulgação necessária. Se chegássemos levantando bandeiras, talvez não atingiríamos esse público.
E como foi essa história do filme ter sido visto pelo Pedro Almodóvar?
Estamos fazendo campanha nos Estados Unidos para o Oscar a fim de que, pelo menos, os votantes consigam assistir ao filme. Recentemente, ele foi exibido no Hollywood Brazilian Film Festival e pessoas incríveis estavam por lá. E aí fiquei sabendo que o Pedro Almodóvar estava entre eles. É muito louco, pois sempre esperamos por algo assim, mas nunca imaginamos que possa acontecer. É uma sensação de missão cumprida.
Como você reagiu ao saber que o filme seria o representante do Brasil do Oscar 2022?
O prêmio já está aí, independentemente de a gente chegar lá (no Oscar) ou não. Esse reconhecimento já é um prêmio enorme. Há poucos anos eu nem achava que poderia fazer cinema, pois não haviam personagens para mim. A bicha, nordestina e não binária. Realmente achava que não era para mim. Tanto que estava lá fazendo meu teatro super na boa. E agora estar nesse filme, escolhido para representar o Brasil, para mim é uma loucura muito grande. Muita alegria e gratidão, torcendo muito, mas já ganhei o prêmio.
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