Uma das atrizes mais talentosas e reconhecidas do cinema nacional, Ecleidira Maria Fonseca Paes – ou apenas Dira Paes, como o Brasil aprendeu a conhecê-la – está de volta às telas em dois novos trabalhos. O primeiro, já em cartaz, é a aventura juvenil O Segredo dos Diamantes (2014), de Helvécio Ratton, escolhido como Melhor Filme pelo Júri Popular no Festival de Gramado. O segundo, ainda inédito, chama-se Órfãos do Eldorado (2015), de Guilherme Coelho, e está sendo apresentado em primeira mão durante a 18° Mostra de Cinema de Tiradentes, no interior de Minas Gerais – aliás, ela é a grande estrela homenageada pelo evento neste ano. E foi sobre estas duas novidades, entre mais de cinquenta trabalhos já realizados também na televisão e no teatro, que a atriz conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!
Como você recebeu o convite para participar de O Segredo dos Diamantes?
Olha, foi o próprio Helvécio que me ligou para falar que tinha uma participação especial no filme que estava fazendo e que queria muito que eu fizesse. Tenho o maior carinho pela filmografia dele, me identifico com o diálogo que tem com suas raízes, com o cinema mineiro e também com sua personalidade enquanto cineasta. O curioso é que nunca havíamos trabalhado juntos, e o modo como ele aborda os temas de sua região, é algo que me identifico muito, pois também me esforço para ver o meu estado natal, o Pará, nas telas. Minhas Gerais é um estado que filmei pouco, então foi bom estar lá. Voltei depois para fazer outro filme lá, o Redemoinho (2015), do José Luiz Villamarin, que deve ser lançado no decorrer desse ano. Foi uma coincidência muito bacana. Diria que bateu um vento mineiro na minha vida (risos).
Como foi trabalhar com o diretor Helvécio Ratton?
Acompanho o Helvécio desde o primeiro filme, sou fã do A Dança dos Bonecos (1986). Vi todos os seus primeiros longas, e alguns deles inclusive em Gramado, onde este último foi também premiado. Foi uma honra ter sido escolhida por ele e estar ao seu lado nesse projeto. Tivemos um fotógrafo maravilhoso, o Lauro Escorel, que é outro mestre! Ou seja, tivemos ao nosso dispor uma equipe só de feras, gente com muita história. Realmente me senti muito bem, com segurança pra fazer esse trabalho. Fico encantada quando tenho a chance de estar ao lado de uma turma que está na ativa desde o meu começo, desde Ele, O Boto (1987). É um pessoal que viveu uma geração muito especial do cinema brasileiro, e que segue produzindo bastante até hoje. É gente que te conhece desde começo. Não teria como ser melhor.
Em O Segredo dos Diamantes, você trabalhou ao lado do ator Matheus Abreu. Outro filme seu importante foi 2 Filhos de Francisco (2005), que também teve que atuar com crianças e adolescentes. É preciso ter um cuidado especial nestes casos?
Ah, sim, com certeza. A criança sabe muito mais do que a gente, sempre. O que aprendi é que quando estou em um filme com criança, tenho que ser passiva. Você não levanta a questão, na verdade tem é que esperar dela a bola. Ela que faz o gol, que é dona do jogo. Nós devemos ir pela borda, fazendo o meio de campo. Estou aproveitando esse paralelo com o futebol, mas é um pouco isso, mesmo. Ela é a dona da situação. No caso d’O Segredo dos Diamantes, foi muito especial por causa da sensibilidade do Matheus, e a habilidade dele como ator mirim, que está começando sua carreira, com um frescor que é contagiante, e nos beneficiamos todos um pouco disso.
Você é uma das homenageadas da Mostra de Cinema de Tiradentes com o ainda inédito Órfãos de Eldorado. O que pode adiantar sobre esse novo trabalho?
Órfãos do Eldorado é um filme que tive muita honra de fazer. Foi filmado em Belém, no meu estado, nos meus cantos, e isso foi maravilhoso. São lugares que conheço muito bem, que estão marcados na minha vivência. Essa possibilidade de trazer pro filme esse encanto amazônico foi fantástica! Tem uma encantaria literária amazônica, que muito vem do Milton Hatoum e de sua literatura. Já conhecia a obra, e quando o Guilherme Coelho me chamou fiquei muito feliz. Gosto da literatura dele, e antes mesmo de saber que estaria num filme baseado nela já nutria muita curiosidade por ele. Uma vez cheguei a assistir a uma palestra dele só para conhecê-lo melhor, e fiquei encantada com o discurso dele. É uma figura árabe, mas ao mesmo tempo tão amazônica. É algo que conheço porque aquela região, que é de onde venho também, sempre teve um influência muito grande da imigração sírio-libanesa. Isso foi fundamental para entender o que o Guilherme queria do livro, e também no filme. O resultado foi um conto de fadas, só a chance de reencontrar o Daniel de Oliveira, vivendo aquele desafio, foi incrível. O meu personagem representa todas as figuras do feminino, mãe, amante, irmã, companheira… dentro desse universo, a Florita representa toda essa gama, o que foi um desafio maravilhoso.
Você é uma das atrizes mais premiadas do Brasil, já tendo sido reconhecida nos festivais de Brasília, Gramado, Ceará, Cuiabá… o quão importante são os prêmios para a carreira de um artista?
Confesso que me sinto muito lisonjeada, e até um pouco tímida. Quando olho para a minha filmografia, sei que são 30 anos que se passaram, mas não estão nas minhas costas pesando. São como se fossem 30 anos a serem conquistados ainda, entende? Afinal, essa é uma filmografia real, concreta, e essa homenagem que vou receber em Tiradentes é também uma homenagem ao cinema brasileiro e por quem transitou por ele durante todo esse tempo. Isso tudo conta muito da própria história do nosso cinema. É o meu berço, onde fui criada, o que ajudou a me formar. Sou uma pessoa que nunca ficou sem estar em um set desde que começou. Tenho uma admiração profunda pela Mostra de Tiradentes, pois afinal de contas eles conseguem dar uma continuidade a um festival que existe há 18 anos e discute profundamente o cinema brasileiro, seu fundamento artístico, mercadológico, antropológico e de futuro. Estão sempre com metas a serem alcançadas. A curadoria do festival é muito preparada, além de acontecer em um lugar lindo. E tem ainda a democracia do festival, com o público na praça, ao mesmo tempo em que mantém uma seriedade em termos de discussão. O que é o cinema brasileiro hoje? Tudo isso está sempre na pauta, o que nos dá uma felicidade enorme.
Qual a importância de um filme como O Segredo dos Diamantes no cenário cinematográfico nacional?
É um infanto-juvenil, bem feito e envolvente, e isso é raro no nosso cinema. Vou te contar uma história: fui assisti-lo com meu filho de 6 anos, e desde então ele só fala dos diamantes! Fiquei muito feliz que meu filho assistiu e ficou muito orgulhoso de mim! Tenho circulado bastante por esse universo recentemente. Estive também na peça Caligrafia, com o Flavio Bauraqui, e cada apresentação era uma surpresa diferente. Me sinto dialogando com um público que é sedento por novidades, por aventura. E além do mais tem esse passeio pelo interior de Minas Gerais, por estas cidades históricas que tão importantes são para o nosso país. Acho que é um ótimo começo. O cinema serve muito para educação, como troca de imagens para uma criança, pois preenche um universo com coisas substanciosas. É uma ótima maneira de apresentar uma aventura infanto-juvenil. E além do mais, é um divertimento no qual que você também acompanha seu filho, é indicado para todos os públicos e idades. O adulto também percebe a graça da trama. E muito bacana quando a família está em primeiro lugar, com este filho lutando pelos pais, algo muito bonito. Sem falar que são três crianças lindas e muito talentosas. Esse filme me deixou muito feliz!
(Entrevista feita por telefone direto de São Paulo no dia 15 de janeiro de 2015)