Hermylla Guedes – sim, ela mudou a grafia do primeiro nome para torná-lo mais ‘acessível’ – nasceu no dia primeiro de janeiro de 1980 na pequena cidade de Cabrobó, no interior de Pernambuco. Neste estado cresceu e é também onde mora até hoje, mesmo após o sucesso nacional conquistado com O Céu de Suely (2006), que lhe rendeu prêmios em São Paulo, Rio de Janeiro, Havana e até em Bratislava, na Eslováquia, além do Grande Prêmio Brasil de Cinema. Desde então somou em sua filmografia mais uma dezena de trabalhos, reafirmando essa como sua maior paixão profissional. Em 2012 marcou presença em dois trabalhos ainda inéditos no circuito comercial: Boca, de Flavio Frederico, pelo qual foi premiada como Melhor Atriz no Cine PE – Festival do Audiovisual, e Era uma vez eu, Verônica, de Marcelo Gomes, pelo qual concorre no 45° Festival de Brasília. Foi sobre estes novos trabalhos, sobre os grandes momentos de sua carreira e sobre seus planos futuros que a atriz conversou com exclusividade com o Papo de Cinema durante sua passagem pela capital federal. Confira!
Era uma vez eu, Verônica foi um filme construído especialmente para você. É muita responsabilidade?
Claro, principalmente se tratando de Marcelo Gomes, que é um diretor maravilhoso, renomado, que gosta de trabalhar com atores. Como o filme é todo voltado para essa personagem, ele é inteiramente ela. Para o trabalho da atriz, esse é um desafio maravilhoso, porque ao mesmo tempo em que você pode errar muito, pode acertar bastante também. É tudo em você.
O filme vive em cima do seu desempenho…
Eu o assisti pela primeira vez aqui em Brasília, e é muito difícil não ficar me criticando. Sempre acho que tenho algo a melhorar. Falo da minha performance, é claro. É difícil até gostar. Mas a recepção do público foi maravilhosa, muito melhor do que a gente esperava. E sabemos que o espectador do Festival de Brasília costuma ser muito sincero, então ter essa aprovação é um estímulo e tanto. As pessoas vieram falar comigo após a sessão, dizendo que tinham gostado, elogiando meu trabalho, e ao mesmo tempo fico sempre na cabeça com um “podia ter sido melhor, podia ter sido diferente”!
Como foi voltar a trabalhar com Marcelo Gomes, diretor do seu primeiro trabalho no cinema, o Cinema, Aspirinas e Urubus, em 2005?
Eu pude aproveitar muito pouco do Marcelo no Aspirinas, era muito coadjuvante. O Era uma vez eu, Verônica, por outro lado, é um grande presente. Criar com o Marcelo esse personagem tão especial me deu muita satisfação. Ele, desde o princípio, sempre tratou esse filme e a personagem com muita sensibilidade, com muito carinho. Ele ofereceu todos os artifícios possíveis para que o resultado fosse orgânico, crível. Ele faz os filmes dele com muita tranquilidade, e isso oferece segurança ao ator.
O filme possui várias cenas de nudez. Foi muito complicado filmá-las?
Quando li o roteiro pela primeira vez, não tive muita noção de como estas passagens resultariam na tela. Tudo fica muito maior do que a gente imagina. Tem mais sexo, mais nudez… o sexo é muito presente. E nunca é gratuito, se encaixa perfeitamente dentro do contexto que o filme propõe. A entrega existe e é precisa, tem que haver uma intimidade, o espectador tem que sentir que aquilo é real, ou quase.
Foi o Marcelo Gomes que lhe indicou ao Karim Ainouz quando ele estava fazendo O Céu de Suely (2006). O que esse filme significou para você?
O Céu de Suely é um marco na minha carreira. Existe uma atriz antes e uma depois desse filme. E depois em todos os sentidos: profissional, reconhecimento do trabalho, consegui ficar mais dentro do mercado. Antes eu trabalha muito menos, agora tenho bem mais oportunidades. E até na pretensão enquanto carreira de atriz. Tudo vinha acontecendo meio que por acaso, e depois do Céu essa dúvida meio que parou de existir. Fiquei mais tranquila em relação a minha profissão. Ao mesmo tempo é um filme muito especial porque foi o primeiro trabalho com entrega e como protagonista. A personagem me deu muito mais do que eu dei para ela. É muito diferente da Verônica, que fiz com outra maturidade profissional. O Céu de Suely é muito mais especial por isso tudo.
Essa entrega em Era uma vez eu, Verônica tem a ver também com o fato de estar dividindo a cena com o João Miguel, que foi seu parceiro em tantos outros projetos?
É sempre muito bom trabalhar com o João. Era exatamente isso que o Marcelo queria, que fosse alguém com quem eu tivesse intimidade, que fosse um parceiro antigo. A gente se conhece, eu já tinha visto o corpo dele, e ele o meu. Já tinha tocado, beijado. Isso tudo para que o espectador acreditasse naquela trepada, naquele sexo. Que aquela relação era real.
Você foi premiada com o Prêmio Guarani, do Papo de Cinema, como Melhor Atriz e como Revelação por O Céu de Suely. Além de já ter ganho vários outros prêmios, está novamente concorrendo em um festival. Como você vê esse tipo de disputa e de reconhecimento?
Festivais e prêmios são sempre muito importantes. Acredita-se que o prêmio possa ser o maior reconhecimento pelo seu trabalho. É muito bom, também, estar competindo com colegas que você admira, como a Simone Spoladore, que também está aqui em Brasília. É um tipo de escola, também. Mas a gente tem que estar sempre preparada, tanto para o sim quanto que para o não. Nunca se sabe ao certo o que vai acontecer, nem antes, e nem depois da premiação.
Como foi participar de um filme mais comercial como Assalto ao Banco Central (2011)?
A intenção ao fazer o Assalto era exatamente essa, de que as pessoas pudessem ter mais acesso ao meu trabalho. O filme tinha um apelo maior, que desperta mais a atenção do grande público. Trabalhar com o Globo Filmes é um outro processo, muito diferente deste estilo independente feito lá em Pernambuco. E eu queria experimentar isso. O ritmo é muito diferente, é industrial, não artesanal, como estou acostumada a fazer. Eu gosto mais desse nosso modo, mas foi uma experiência válida, que valeu muito à pena. Pra mim foi maravilhoso, a oportunidade de trabalhar com o Marcos Paulo. E o Assalto é diferente de um Se Eu Fosse Você 2 (2009), por exemplo, que é algo que não me apetece muito. Estou sempre aberta aos filmes mais comerciais, mas é preciso ter uma história pra contar.
O que um filme precisa ter para despertar a sua atenção e aceitar participar dele?
Não é tão difícil pra mim, enquanto atriz, escolher um filme, porque todo trabalho é novo, é como se fosse o primeiro. Mas o fundamental é que seja uma personagem que pode me oferecer mais a mim do que eu a ela. Quando ela me emociona e tem algo a ser dito. Vou pela trajetória dessa personagem no filme. E às vezes é uma questão de mercado, também, pode ser que não tenha nada em vista e você precisa trabalhar. A situação hoje em Pernambuco está muito melhor, com muitos projetos acontecendo ao mesmo tempo, mas antes não era assim, a gente não tinha muitas opções. Era esperar surgir o convite e agarrá-lo com todas as forças.
Em que pé está O Grande Kilapy, que há tempos se ouve falar?
Ele passou agora no Festival de Toronto. Não sei quando irá estrear. Foi um filme curioso, feito por um angolano, filmado em Lisboa e estrelado por um brasileiro (Lázaro Ramos). Meu papel é pequeno, faço uma portuguesa, e nem precisei fazer sotaque algum porque será dublado depois. Era uma personagem bacana, e a oportunidade de ter um trabalho internacional foi que me atraiu. É muito bom quebrar fronteiras. Isso é algo que busco sempre, fazer um filme fora de Pernambuco, fora do Brasil. Isso, para um ator nordestino, que ainda mora em Olinda, que é onde eu moro, é como matar um leão a cada dia. Você está sempre se superando.
Outro filme seu, o Baixio das Bestas (2006), esteve também competindo em Brasília num resultado super polêmico, foi premiado entre aplausos e vaias. Como foi essa experiência?
Essa é uma das tarefas do cinema, provocar o debate. É importante provocar as pessoas em algum nível, não pode ser somente entretenimento. E geralmente esses filmes menores, mais independentes, possuem esse olhar mais provocador, sobre os diferentes Brasis. Baixio das Bestas é um filme muito polêmico, com certeza. Ele cumpre muito bem esse papel.
E o Era uma vez eu, Verônica também sabe provocar?
Esse é um filme que tem muito a acrescentar a quem o assiste. Pra mim, só vale ver um filme quando ele inquieta. E, geralmente, os filmes que faço são aqueles que gosto também de ver. O cinema que faço é o que acredito. E Verônica vai provocar as pessoas, elas irão se identificar. Os problemas da personagem são universais, são muito humanos.
Cinema, televisão e teatro, como você se divide entre estes três meios?
Eles são muitos diferentes, e confesso que não sei fazer todos eles. Tenho certeza que a minha praia é o cinema, e com diretores como o Marcelo, que dá suporte, que te ajuda a criar os personagens. A televisão tem um ritmo muito diferente, esse lance de não ter processo, não ter vivência me perturba muito. Me dá muita insegurança não saber o que vai acontecer com o teu personagem. E o palco é um exercício necessário, mas a plateia me perturba. A câmera não, mas a plateia, sim.
Como você planeja a sua carreira cinematográfica?
Da forma mais natural e tranquila possível. E não está sendo difícil, o que chega pra mim tem sido muito bacana. Eu tenho é que fazer mais cinema, que é o que gosto mesmo de fazer. Televisão e teatro tenho que fazer mais, a gente só aprende praticando. Mas cinema é a minha paixão.
E quais seus próximos projetos?
Tenho alguns ainda para estrear. Tem o do Alceu Valença, que ele dirigiu e que se chama A Luneta do Tempo, está finalizado e é com o Irandhir Santos. Tenho um outro convite, mas nada certo, é só uma paquera. Fora o Boca, O Grande Kilapy e o próprio Verônica. Tem muito de Hermila Guedes por vir, espero que as pessoas não se cansem (risos).
(Entrevista realizada no dia 22 de setembro em Brasília)
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Olá, Leonardo! Nos perfis da atriz no IMDb e na Wikipedia, a informação que consta é a data de 01/01/1980!
Ao contrário do exposto na entrevista, a data de aniversário da Hermylla Guedes é 27/11.