Nascida no Rio de Janeiro em 1966, Bianca Byington iniciou sua carreira artística muito cedo, ao integrar o coro infantil da primeira montagem do musical Os Saltimbancos, de Chico Buarque, com apenas onze anos de idade. Dois anos depois estreou no cinema, no longa Tormenta (1980), de Umberto Molo, num desempenho que foi reconhecido com o kikito de Melhor Atriz Coadjuvante no Festival de Gramado. Desde então sua relação com o cinema tem sido cheia de altos e baixos, e entre diversos projetos no teatro (sua confessa paixão maior) e a televisão (onde já participou de mais de três dezenas de novelas e seriados), tem aparecido em filmes que marcaram época, como Garota Dourada (1984), Estorvo (2000) e o lusitano Viúva Rica Solteira Não Fica (2006), grande sucesso de público em Portugal. Sua última aparição foi como protagonista do drama Noites de Reis, de Vinícius Reis, exibido no Festival de Brasília 2012. E foi durante essa ocasião que o Papo de Cinema encontrou a atriz, que revelou detalhes sobre os bastidores desse projeto e sobre outros trabalhos ainda inéditos. Confira!
Nos acostumamos a vê-la ligada à comédia, seja na televisão ou no teatro, e em Noites de Reis temos uma surpresa, pois você está num personagem dramático. Como você recebeu esse convite?
Engraçado o que você disse. Quando o diretor Vinícius Reis me chamou, também tive essa reação. Nunca tinha feito algo tão dramático e fiquei bem assustada em um primeiro momento. Mas claro que aceitaria, é o que a vida me ofereceu, então vamos lá! E era uma turma muito bacana. Tivemos vários encontros para irmos nos sintonizando, nos conhecendo melhor. Eu tinha muitas questões a respeito, estava achando tudo muito sem ação, não no sentido de movimento, mas via essa personagem muito paralisada, com ela era tudo muito interno. O luto, a dor, foi esquisito lidar com esses sentimentos. Acho que no fim conseguimos um lugar menos paralisado para essa mulher. Tinha muita cena, no roteiro inicial, dela de olho fechados. Minha reação inicial era de que essa pessoa precisava abrir os olhos. Naquela mesma época eu estava fazendo uma turnê no teatro com uma comédia. Interrompi, fui fazer o filme e depois retornei à peça. Isso foi muito interessante enquanto atriz, trabalhar em dois registros opostos.
Seus personagens sempre são muito fortes. E esse filme você trabalha muito com o silêncio, de forma muito contida. Como foi o seu preparo pessoal?
Foi um longo caminho. Até porque tinham todas essas simbologias pessoais de estar voltando a Parati. Comecei a trabalhar com apenas 13 anos, parei de estudar e saí de casa. E agora voltar a minha cidade com esse filme tão intimista e com essa mulher sofrendo. Tive que fazer várias conexões. Fiquei bastante sozinha lá, longe das pessoas, foi muito meditativo. Fiz aniversário durante as filmagens, 45 anos, e lembro que era domingo e fiquei super quieta, não comemorei. Foi um momento especial de concentração, de parar e fazer algo quieto. Foi legal.
Como foi essa parceria com Enrique Diaz e Flavio Bauraqui?
Com o Enrique foi algo mais longo, até porque tivemos esses encontros antes, e fiz uma peça com ele há muitos anos, diria que foi cerebral. Os nossos personagens são muito separados no filme. Tiveram uma intimidade, mas não se conhecem mais. Somos muito parecidos. Temos um entendimento parecido. O Bauraqui eu não conhecia. Nos encontramos uma vez e fizemos algo mais sensorial. Se conhecer fisicamente sem se conhecer realmente.
Durante o lançamento do filme 360 (2011), conversei com Maria Flor e ela disse que conheceu Ben Foster, com quem atua no filme, no dia em que Fernando Meirelles disse “ação”. Foster queria o resultado do primeiro encontro na cena. Você acredita nesse tipo de trabalho, ou acha que tem que ter uma preparação anterior?
Cada trabalho tem a sua linguagem. Não sou dessas que gosta de fazer laboratório, e ficar pirando. Sou muito da hora. Mas no cinema acho que isso é mais interessante, porque você tem realmente aquele momento. No teatro não dá para trabalhar assim. Você tem que laborar. Então acho bacana esse tipo de coisa. No fundo você sabe e se prepara internamente de alguma maneira e se abre para o momento presente.
Cinema, teatro, televisão… você consegue separar bem? Quais são suas preferências?
Amo o teatro. É o que comecei a fazer pequena e é o lugar para onde sempre volto. Onde tenho o controle das coisas. Agora mesmo estou começando a dirigir e produzir. É o lugar que conheço, gosto e sei fazer. Cinema fiz muito pouco. Acho incrível, mas preciso confessar que acho muito chato. Você de cinco em cinco anos faz um filme, meio que não te pertence direito.
Você consegue pensar em uma carreira cinematográfica ou é algo de aproveitar as oportunidades?
Sou hippie (risos), nunca tive empresário, vou indo ao sabor da vida. Parei de estudar mesmo no colégio aos 13 anos, não tenho nem o primeiro grau completo. Sou uma pessoa empírica. Vou indo sem planejamento.
Como você vê a presença da mulher do cinema brasileiro?
Não saberia fazer nenhuma teoria sobre isso. Acho surpreendente quando as mulheres ganham destaque, porque são raros bons papeis femininos. Há muito tempo a maioria dos filmes brasileiros são em cima da figura masculina, e a mulher acaba assumindo apenas uma posição mais sedutora. Protagonista feminina é difícil de encontrar. Não sei, não estou assistindo a todos os filmes, mas é algo que me deixa curiosa.
Qual foi sua impressão ao assistir pela primeira vez Noites de Reis? O que você tem achado da reação do público?
Fiquei muito orgulhosa do filme porque sei que ele passou por vários cortes, eram diversas as possibilidades. Adorei as escolhas que o diretor fez, achei um filme muito simples, despretensioso. Dentro dessa coisa longa, mas sem blá blá blá, tem uma força nessa simplicidade.
Olhando um pouco para trás, sobre os seus filmes anteriores, tem alguma lembrança especial em relação a um?
Tem um que adoro que fiz com Mauro Lima, que nunca foi lançado, Deus Junior (1999). Esse filme é genial, mas a versão original dele tinha o que, umas seis horas, então era inviável. Ele não conseguiu ser exibido em lugar nenhum. Acabou sendo feito um segundo corte, acho que de umas três horas, e passou uma vez em um festival – foi quando consegui assistir. É um trabalho que adoraria que as pessoas vissem.
E vamos ver mais Bianca Byington nos cinemas?
Tenho um projeto junto com o Vinícius e com o Chico Diaz. Ele vai revezando de irmãos (risos). Está sendo escrito um roteiro bem legal e vamos filmar. Estou trabalhando em um roteiro que quero escrever junto com umas pessoas também. Dirigir ainda não, acho muito complicado. Mas quero muito dirigir teatro. E tem ainda o longa do Matheus Souza, a comédia Eu Não Faço a Menor Ideia do que eu To Fazendo com a Minha Vida, com a Clarice Falcão, em que faço uma participação rápida. Esse foi feito há uns dois anos, mas acho que agora chega aos cinemas. Tá pra estrear em breve.
E a sua experiência profissional em Portugal?
Foi o Zé Fonseca, um diretor que é figurão, deve estar com quase 80 anos – aliás, como todos os diretores de Portugal (risos). Ele me conheceu um dia em Gramado, com Tormenta (1982) e ficou com uma fixação em mim. Pula uns 20 anos e ele me liga para me fazer um convite. E lá fui, fiquei três meses em Portugal. O filme foi Viúva Rica Solteira Não Fica (2006), uma experiência muito rica, que me deu um enorme prazer.
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