Nascido em 1970 em São Paulo, José Eduardo Belmonte mudou-se com apenas quatro anos de idade, junto com a família, para a Capital Federal. Lá formou-se em Cinema na Universidade de Brasília e começou a trabalhar em seus primeiros projetos. Após alguns curtas-metragens, fez seu longa de estreia, Subterrâneos (2003). Seus trabalhos seguintes foram premiados no Festival de Brasília (A Concepção, 2005, e Meu Mundo em Perigo, 2010) e no Festival do Rio (Se Nada Mais Der Certo, 2008), entre outros. Seu primeiro projeto comercial, no entanto, viria somente com Billi Pig (2012), estrelado por Selton Mello e Grazi Massafera. Agora ele está de volta aos cinemas com o thriller Alemão (2014), estrelado por Caio Blat, Cauã Reymond e Antonio Fagundes, filme que promete ser o mais assistido de toda a sua filmografia. Foi durante o lançamento deste projeto que o diretor conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!
Como surgiu a ideia do filme Alemão?
Na verdade a ideia do projeto não é minha, é do Rodrigo Teixeira (produtor, responsável por títulos elogiados do cinema nacional, como O Cheiro do Ralo, 2006, e de longas internacionais premiados, como Frances Ha, 2012). Eu, na verdade, estava envolvido em um outro projeto, mas ele me chamou para conversarmos, mostrou o projeto e comecei a achar interessante todas as possibilidades que poderiam surgir a partir daquele conceito. Sabe, foi uma das maiores ações policiais recentes feitas no Brasil, mas ao mesmo tempo o ponto de vista era muito íntimo, quase claustrofóbico. Era um tema que me interessava, que fala sobre grandes temas, muito pontuais e que revelam bastante sobre nossa sociedade. Sem falar nas questões filosóficas que o filme aborda, como o sacrifício, confiança. Então abracei e fui dar o meu melhor, mas como diretor contratado.
Os cinco protagonistas de Alemão são bem diferentes entre si, mas ainda assim complementares. E há ainda outras participações importantes. Como foi feita a seleção do elenco?
Foi uma grande combinação, num processo bem colaborativo. Procurei trazer algumas pessoas com quem eu já havia trabalhado, ouvi muitas sugestões, fiz uma grande pesquisa e até alguns testes. Foi um prazer enorme poder contar novamente com o Otávio Müller, por exemplo, que é um parceiro de anos, assim como o Cauã Reymond, um dos melhores profissionais com quem já trabalhei. E descobrir a entrega de Caio Blat, o talento do Marcello Melo Jr, que tá recém começando… Gosto de fazer escolhas heterogêneas, combinando humor com uma dramaticidade mais intensa. Queria pessoas com vivência do universo que seria abordado, que trouxesses suas próprias experiências para o grupo. Isso possibilitou uma conjunção de vários fatores, uma mistura bacana de atores que representavam diversas correntes com quem eu gostaria de trabalhar.
Você citou o Cauã Reymond, que foi protagonista de um dos seus trabalhos mais celebrados, Se Nada Mais Der Certo (2008). Como foi retomar essa parceria?
O Cauã é um presente. Ele pode não aparecer tanto tempo em cena dessa vez, mas como atuou também na produção do filme, estava sempre presente. Alemão foi um projeto em que ele acreditou, investiu e ajudou em todos os sentidos para que chegasse às telas do jeito que é hoje. É um grande parceiro, além de um excelente amigo.
Outra participação muito comentada é a do Antônio Fagundes…
Fagundes foi uma sugestão também do Rodrigo Teixeira, que produziu o outro filme dele recente, o Quando Eu Era Vivo (2014). E não tem como dizer não para um nome como o do Fagundes, certo? Ele é uma verdadeira aula, só de estar ao lado dele, vendo-o trabalhar, como desenvolve o personagem, você aprende muito. É um ator de muito know how, de uma generosidade incrível, com muito repertório. Ninguém é lenda por acaso, tem que ter feito muito para merecer o respeito que desfruta hoje. É impressionante observar como ele trabalha o texto, a agilidade do processo pessoal dele. Foi muito bom ter podido contar com ele no nosso filme.
Você começou fazendo filmes muito autorais, mas aos poucos foi abrindo seus trabalhos a um público mais amplo. Por que essa mudança?
Todo mundo quer que seus filmes sejam vistos, não? Então não foi algo ao acaso, aleatório. Essa mudança de rumo foi consciente, porém não radical. Foi sendo construída aos poucos, sem pressa. Em última instância, não vejo Billi Pig ou Alemão como projetos sem autoria, afinal fui eu que os fiz, e do jeito como queria. Então também são autorais. O que acontece é que agora não sinto mais tanta vontade de experimentar, de ficar muito restrito a um gueto. Queria, sim, sair daquele canto em que tinha me escondido e fazer um cinema mais comercial, de maior retorno.
Quais são suas principais referências no cinema?
Pode ser curioso, mas gosto muito de filmes clássicos. Para o Alemão, por exemplo, fiz uma maratona de grandes faroestes, filmes de Howard Hawks, John Ford, John Huston… Era impressionante pensar no público que eles alcançavam com títulos pesados, com muita violência, obras fortes e que ainda hoje são comentadas. Cinema, na verdade, busca público, é interessante pensar nisso, não podemos ignorar. O que busco é esse diálogo com o espectador, ao mesmo tempo em que quero me inserir no mercado de forma mais autoral, com a minha marca. Estou tentando fazer essa equação, vamos vez se consigo. Não é bom ficar parado, fazer sempre as mesmas coisas. Uma mente dinâmica é tudo, já dizia isso desde a época do A Concepção (2005)…
Você já está envolvido em novos projetos, certo?
Sim, agora mesmo estou no meio das filmagens de um road movie, um filme de estrada com a Ingrid Guimarães, o Fábio Assunção e a Alice Braga. Tem também a Rosane Mullholand, outra parceira querida. É uma comédia dramática que começa no interior de São Paulo e segue até Goiânia. O título provisório é A Magia do Mundo Quebrado, mas certamente irá mudar. A ação é sobre um pai que vai com seu filho buscar a mãe, e no meio do caminho o carro quebra e acabam aceitando carona de duas garotas, operadoras de telemarketing. Não sei se será um sucesso ou não, claro que a presença da Ingrid abre uma expectativa, mas teremos que esperar para ver. Foi a mesma coisa quando a Grazi entrou em Billi Pig, o projeto muda. Procuro sempre tirar um aprendizado disso tudo, pois se o filme será autoral ou comercial é algo que só descobrimos depois que é exibido. É um mistério ainda para mim, quem decide, mesmo, é o público.
Como tem sido a repercussão do Alemão?
Olha, é um filme que me deu muito prazer ter feito. O processo foi ótimo, estar no set, ao lado dos atores, com uma história tão forte em mãos. E não só isso, mas também quando ficou pronto, com os primeiros retornos que estamos tendo dos espectadores, tem sido muito legal, meu recompensador. Uma experiência ótima, bem gratificante. Então, sendo ou não sucesso de bilheteria, as lembranças já teriam sido ótimas, mas com esse retorno impressionante está melhor ainda. Estamos quase batendo na marca do um milhão de espectadores, e isso é muito importante na carreira de um diretor no Brasil. É um divisor de águas. Então estou muito contente, e acho que a audiência que vai assistir ao cinema nacional aprovou nossa história.
(Entrevista feita por telefone direto de Goiânia no dia 02 de abril de 2014)