Petrônio Lorena e Tiago Scorza são amigos há anos, e juntos decidiram estrear no cinema. Após realizarem o curta O Som da Luz do Trovão, em 2005, que circulou por festivais no Brasil e no exterior, ambos decidiram retomar ao mesmo tempo para produzirem o longa de estreia deles: O Gigantesco Imã. O primeiro, também músico, assina ainda a trilha sonora, enquanto que os dois, juntos, além da direção, ficaram responsáveis também pelo roteiro e fotografia. E após mais de dez anos, o filme está finalmente pronto e estreando na mostra competitiva do XIX Cine PE, em Recife. O Papo de Cinema já conferiu o filme e conversa agora com os dois cineastas. Confira!
Qual foi o primeiro contato que vocês tiveram com a história de Evangelista Ignácio de Oliveira?
TIAGO: O primeiro contato com Evangelista aconteceu com o Petrônio, quando ele tinha 12 anos de idade em Serra Talhada, cidade natal de ambos. Ele via aquele senhor de cabelos desarrumados, roupas largas, andando pra baixo e pra cima, o que chamou a sua atenção. Na cidade, todos conheciam as histórias de Evangelista. Anos mais tarde, eu e Petrônio nos conhecemos e iniciamos um projeto de documentário em parceria. Acontece que estávamos com viagem marcada para Paraíba, onde filmaríamos com um cordelista. De última hora, esse poeta desmarcou com a gente. Como já estávamos com tudo pronto para viajar e filmar, fomos buscar um novo filme para fazer. Foi então que veio a ideia do filme com Evangelista. Conseguimos contatá-lo e daí o nosso destino mudou para Serra Talhada, no sertão pernambucano. Nessa viagem aconteceu o primeiro contato com ele, aí nós já no papel de realizadores. Foram 5 dias de filmagem, quando produzimos o primeiro material para o curta.
PETRÔNIO: Depois as filmagens continuaram no Rio de Janeiro, para filmamos seu voo de asa delta.
TIAGO: Mal sabíamos que parte desse material seria usado futuramente no longa metragem com o mesmo “personagem”.
PETRÔNIO: Primeiramente, fui conversar com o personagem para sentir a possibilidade de realizar o filme. Isso aconteceu numa época de férias, no fim de 2002. Mantivemos o plano. Em Janeiro seguinte, Tiago chegou. Durante a filmagem tivemos a colaboração do artista plástico Lourival Cuquinha, do cineasta Jura Capela e de outros artista de Recife e Olinda, onde nos hospedamos e conseguimos equipamento emprestado. Vale salientar que todo a fase de produção de imagem e som, tanto do curta quanto do longa, foi custeada por nós. Apenas a fase de Finalização e, agora, a distribuição estão contando com apoio da Fundarpe.
Antes de virar longa, essa história foi contada em um curta-metragem. Porque esta experiência dupla em ambos formatos?
PETRÔNIO: O curta ficou baseado nas obras de Evangelista. Aquelas que já funcionavam. No longa a intenção foi de mostrá-lo realizando a obra, junto com as pessoas que o ajudaram nas realizações. Os cientistas informais, assim como ele. São aqueles que ele imanta.
TIAGO: Nós consideramos que o curta foi um trabalho bem sucedido, pois rodou festivais, ganhou prêmios e até hoje ainda é exibido. Acontece que, pela limitação de tempo de um curta metragem, muitas obras do nosso protagonista ficaram de fora e nós, como realizadores, tínhamos vontade de filmar mais com Evangelista, que diariamente tem ideias novas e cria objetos diferentes. Daí, partimos para o projeto do longa metragem.
O Gigantesco Imã compreende um período de 10 anos da vida de Evangelista, correto? Como vocês conseguiram passar tanto tempo ao seu lado?
TIAGO: Sim, correto. Iniciamos as primeiras filmagens no ano de 2003 e as últimas ocorreram em 2013. Dentro desses 10 anos, houve diversos momentos de filmagens, uns maiores e outros menores. Teve também, entre 2005 e 2006, a carreira do curta em festivais. A partir de 2008, começamos a filmar o longa. Então, mantivemos contato com o Evangelista durante todo esse período e até hoje em dia. Ontem, ele esteve presente à exibição aqui no Cine PE. Já são 12 anos agora.
Acredito que muitas histórias tenham ficado de fora na edição final. Teve alguma que vocês queriam incluir e não tiveram como por outros motivos?
TIAGO: Sim, teve. Um exemplo é o projeto dele de construir um sistema de moto contínuo. Filmamos o início da empreitada, mas infelizmente Evangelista desistiu da obra. Tínhamos algum material filmado, mas estava incompleto. Apesar dos nossos apelos, Vanja (apelido que usamos com ele), recusou-se a retomar o projeto e a sequer falar sobre o assunto. Então, acabou ficando de fora da edição final.
PETRÔNIO: Ele tem umas histórias ligadas a visões, falar com espíritos, encontros com entidade do bem e do mal. Queríamos colocar isso mas poderia dar um ar de piada. Não seria legal expor ele a uma visão folclorizada.
O Gigantesco Imã está concorrendo no XIX Cine PE. Como receberam a notícia dessa seleção e qual a importância de circular por festivais de cinema antes de ser exibido no circuito comercial?
TIAGO: Recebemos a notícia com muita satisfação, claro, pela visibilidade que o filme ganha sendo exibido em um festival como o Cine PE. É a oportunidade de exibi-lo em salas sempre cheias e debater o trabalho com críticos, jornalistas, estudantes de cinema e público em geral. Isso tudo vai fazendo com o que o filme seja conhecido. Quando chegar a hora de exibir comercialmente, essas exibições em festivais podem nos ajudar a abrir portas e facilitar talvez um contato com um distribuidor/exibidor. Vale dizer que também não é uma garantia de exibição, pois muitos filmes, inclusive premiados em festivais, tem ainda dificuldade de entrar em cartaz. Mas já é um bom começo.
O que um filme como O Gigantesco Imã tem a dizer ao Brasil de hoje?
TIAGO: Criem, inventem, ousem. Fujam dos padrões e desconfiem sempre da verdade absoluta. Pensem por si próprios. Acho que aprendemos isso com Vanja ao longo desses 12 anos.
PETRÔNIO: A verdade é uma questão de ângulo e aqueles que você menos desconfia são os que mais podem te surpreender.
(Entrevista feita como parte da cobertura especial do XIX Cine PE)
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