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O Melhor Verão das Nossas Vidas :: Murilo Bispo e Bela Fernandes falam sobre retrato da surdez na comédia romântica

Publicado por
Bruno Carmelo

Além da presença de Giulia Nassa, Bia Torres e Laura Castro (as BFF Girls) nos papéis principais, a comédia romântica O Melhor Verão das Nossas Vidas (2020) está repleta de participações especiais de ídolos adolescentes, conhecidos tanto por seus talentos de cantores e atores quanto pela presença nas redes sociais.

Entre eles estão Murilo Bispo e Bela Fernandes, que interpretam irmãos na trama. O primeiro vive Théo, um jovem cantor e compositor do litoral de São Paulo, inscrito no mesmo concurso musical do qual participam as protagonistas. A segunda vive Carol, jovem garota surda que sonha em dar o primeiro beijo, até conhecer o desajeitado, porém gentil, Júlio (Enrico Lima). O Papo de Cinema conversou com a dupla sobre a participação no projeto, já em cartaz nos cinemas:

 

 

A Giulia, Laura e Bia aceitaram o convite para o filme às escuras, sem poderem ler o roteiro antes. O mesmo aconteceu com vocês?

Bela Fernandes: Para mim, a oportunidade surgiu enquanto eu gravava a novela, e pensei que por causa deste outro compromisso, não daria certo. Marcamos uma reunião, quando o Adolpho (Knauth, diretor) me contou meio por cima qual seria a personagem. Ele gosta de surpresa, e quer que todo mundo leia pela primeira juntos, no mesmo lugar. Ele me convenceu quando disse que minha personagem seria surda. Então eu pedi ao SBT para me liberar das gravações durante alguns dias. Mas só li o roteiro inteiro quando todo mundo se encontrou.

Murilo Bispo: Comigo, foi bem parecido. Só me disseram qual era o arquétipo do personagem, e como ele se encaixava na história inteira. Para mim, isso fez sentido logo de cara, por ser um músico. Como eu venho de um universo musical, a conexão foi direta.

De fato, o Théo parece muito próximo de você, Murilo, mas a Carol representa um desafio novo à Bela.

Bela Fernandes: A Carol vai marcar muito a minha carreira profissional. Ela também me marcou pessoalmente. Sei que vou aprender muito com esta experiência, por poder embarcar no mundo dos surdos, conhecendo as coisas de que eles gostam ou não gostam. Eles lidam com a surdez sem problemas, porque têm a língua própria. As pessoas que veem de fora têm pena deles, mas os surdos vivem a deficiência com tranquilidade. Percebi isso tanto em pessoas que nasceram surdas quanto naquelas que se tornaram surdas mais tarde. Estudei um pouco de libras, mas claro que me concentrei só nas falas que usaria para o filme. Eu precisaria de tempo demais para aprender tudo! Eu até mostrei para a minha galera nos Stories um aplicativo que converte em linguagem de sinais a palavra que você escreve.

Murilo Bispo: Eu aprendi um pouco de libras também, mas as relações familiares são baseadas 100% em empatia, e isso vale para o Théo e a Carol. O fato de ele ter uma irmã surda torna a conexão entre os irmãos ainda mais importante e necessária naquela trama. Acho que a gente conseguiu representar bem essa questão no filme.

 

 

Existiram ensaios com os dois juntos para criar essa intimidade?

Bela Fernandes: Nem tanto, sabia? Acho que confiaram que daria certo entre nós dois! Eu fiz mais ensaios com a Giovanna Chaves, que faz a vilã, e com o Enrico Lima, que interpreta o personagem com quem eu mais contraceno. Por isso, ensaiei muito com ele. Entre o Murilo e eu já tinha uma sintonia, acho que nem precisava muito ensaiar.

Murilo Bispo: Inclusive, a primeira cena que fizemos juntos não tinha diálogos. É o momento em que quase rola um atropelamento na rua. Ali a gente se conectou muito bem, conversamos bastante sobre a cena. Na hora da gravação, deu tudo certo.

De que maneira o Théo, enquanto músico, se relaciona com o seu trabalho?

Murilo Bispo: Eu tentei imprimir muito do meu estilo próprio, mas sem descaracterizar o viés litorâneo do Théo. Ele tem uma leveza, aquela coisa do violão sempre na mão. Eu quis trazer algumas nuances, e pensei todos os arranjos das músicas com o produtor musical, o Áureo Gandur. A gente sentou juntos, pensou e gravou juntos. Mas a linguagem litorânea é distante da minha, porque eu venho do interior de São Paulo, e tive muito pouco de litoral na minha vida pessoal.

 

 

Como foi a experiência de trabalhar num filme feito para a linguagem das redes sociais?

Murilo Bispo: Eu estava conversando sobre isso com um diretor amigo, que está fazendo um filme bem mais estático, dramático. Ele disse que a dificuldade era praticamente a mesma entre fazer um filme mais estático e outro acelerado como esse. No caso do filme acelerado, você tem teoricamente mais dificuldade de entregar a profundidade dos personagens. O meu desafio pessoal, dentro desse registro, era fazer do Théo um personagem complexo sem ter tanto tempo para desenvolvê-lo. Para a Carol, deve ter sido ainda mais desafiador criar a personagem surda num universo de cortes tão rápidos.

Bela Fernandes: É um filme muito moderno. Ele reflete o que acontece hoje em dia, é muito realista. São os problemas que acontecem na nossa vida, mas a gente traz uma mensagem importante de maneira leve, gostosa. É esta a melhor forma de falar com a galera teen, que é o público-alvo do filme.

Nas primeiras exibições, quais foram as reações de espectadores surdos? Hoje os cinemas são cada vez mais equipados para deficientes.

Bela Fernandes: Desde que eu falei que iria interpretar uma personagem surda, recebi várias mensagens me parabenizando, e citando amigos e familiares surdos. Uma vez, durante uma live, uma garota me pediu “Bela, faz algo em libras, porque eu sou surda e não consigo entender”. Então eu percebi que tinham pessoas surdas me acompanhando também, e seria legal eu levar as libras para os meus fãs. Consegui me comunicar com eles através de algumas frases em libras. Durante a pré-estreia em São Paulo, eu conversei com o pai de um garoto que usa o mesmo aparelho que eu uso no filme. Ainda não tive contato com espectadores surdos, mas espero muito por este momento. Seria incrível. Graças a Deus, até agora, todas as respostas foram muito positivas.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.

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