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“A cada 15 segundos, é preciso ter uma coisa nova. Esse é o ritmo do adolescente”. Enquanto apresentavam O Melhor Verão das Nossas Vidas (2020) à imprensa, o diretor Adolpho Knauth e o comediante Maurício Meirelles foram claros em suas pretensões: fazer um filme sobre a juventude ultraconectada do século XXI, com celulares em mão e conexão Internet o tempo inteiro. Por isso, era preciso que a linguagem fosse ágil, leve, picotada.

Na história, três amigas e membros de uma banda pop (Giulia Nassa, Laura Castro e Bia Torres, as BFF Girls) escapam ao período de recuperação na escola para viajarem ao Guarujá, onde um concurso musical pode lançá-las ao estrelato. Enquanto se divertem com o dono da pousada (Maurício Meirelles), descobrem pretendentes amorosos e enfrentam a inveja da vilã da escola (Giovanna Chaves). O Papo de Cinema conversou com Knauth e Meirelles sobre a comédia teen que chega aos cinemas nesta quinta-feira, dia 23:

 

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As BFF Girls e Maurício Meirelles

 

O projeto foi criado especificamente para as BFF Girls?

Adolpho Knauth: Na verdade, esse argumento já existia com uma protagonista só. Quando eu conheci o projeto das meninas, conversei com o Cadu Pereiva, roteirista do filme, e adaptamos para três personagens. Fui à Sony Music apresentar o projeto, e ele foi muito bem aceito. O importante era fazer com que as três se relacionassem com todos os outros personagens e se desenvolvessem ao longo da trama. Alguns outros personagens já existiam, como o Théo (Murilo Bispo) e a Helô (Giovanna Chaves). No caso do Denis, ele existia, mas era bem diferente. Percebemos que era possível trabalhar melhor a comédia com ele, feita por um adulto, e adaptada ao nosso público.

Como encontrou o tom entre as atrizes iniciantes e os humoristas experientes?

A.K.: Este foi o grande desafio. O elenco é muito novo, mas experiente dentro do que fazem. São jovens com um talento impressionante de comunicação com o público. A gente optou por levar o conceito de direção de maneira natural ao mundo delas. Não quisemos impor um formato fechado às meninas devido à inexperiência como atrizes. Durante seis semanas de preparação, fomos nós que levamos as cenas ao mundo delas, o que era muito mais fácil. A Bela Fernandes tem uma experiência de novela, com um timing diferente. Quando eu li o roteiro, já comecei a pensar que o personagem do Denis seria perfeito para o Maurício. A gente não se conhecia, mas tínhamos amigos em comum. Liguei para ele e disse: “Este personagem é a sua cara”. “Como ele é?”, o Maurício me perguntou, e eu disse: “Um perdedor”. O tempo de comédia seria fundamental para o Denis. Já o elenco dos pais era composto de atores experientes de comédia e cinema.

 

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Detalhe do cartaz de O Melhor Verão das Nossas Vidas

 

As cenas trazem a impressão de improviso, e imagino que você tenha contribuído para isso, Maurício.

A.K.: Maurício é o rei do improviso! Seria possível fazer um filme só com os cacos criados por ele.

Maurício Meirelles: Manoel Carlos jamais me contratará! Essa é a minha segunda experiência de cinema, mas venho do stand-up. O Adolpho entende muito de técnica de cinema e de roteiro, mas ele foi generoso em compreender o que cada um poderia trazer ao projeto. Com as meninas, ele descobriu como tornar o filme mais pop. Comigo e com o Carioca, entendeu como tornar a piada mais dinâmica. Na verdade, as piadas estavam escritas tais quais no roteiro, mas a gente faz show de teatro, e se acostuma a sacar a risada na hora, a criar o humor ao vivo. Eu assisti ao filme, e na hora em que entramos o Carioca e eu, percebo as risadas com o mesmo tempo do teatro.

A.K.: Eles trouxeram uma inteligência de cena muito boa. Uma coisa é a cena no roteiro, e a outra, é a situação da filmagem. Eles nunca fugiram da história, tudo partiu do contexto. Essa foi uma boa surpresa, uma experiência de timing. Foi uma pena a gente não conseguir colocar mais dessas cenas, mas o filme teria três horas de duração se a gente incluísse tudo.

M.M.: Tudo isso se deve ao clima da gravação. Tinham vários atores experientes, ao lado de meninas deslumbradas por estarem fazendo cinema. Elas trouxeram uma alegria à dinâmica, e muito do improviso nasceu das nossas brincadeiras nos bastidores. Foi o trabalho mais divertido que já fiz na minha vida, e o resultado se vê no filme.

 

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Como adaptaram o filme para a linguagem e o conteúdo da Internet? O humor também precisou se adequar?

A.K.: Existem vários caminhos para responder a essa pergunta. Hoje qualquer um assiste a um filme em casa. Mas para fazer com que a pessoa saia de casa e vá ao cinema, aquilo precisa encantá-la de alguma forma. A gente tentou fazer com que o filme fosse contado no horizonte do adolescente, para ele vivenciar a experiência de navegar por uma rede social através dos personagens. O filme foi pensado pelo olhar deles, como se a câmera estivesse do lado delas. Nosso montador, o PH Farias, é extraordinário. Ele imprimiu muita dinâmica, com elementos gráficos de transição lembrando o Facebook, o Instagram. As meninas trouxeram isso por conta própria. O fato de passar vinte dias todos juntos no Guarujá, filmando e fazendo as refeições juntos, me permitia ver como elas agiam de fato. Muitas coisas durante as filmagens vinham da experiência no dia anterior. A gente explorava dinâmicas que elas expressavam naturalmente.

M.M.: Eu fiquei conhecido por causa de um projeto chamado Webbullying. O formato dele é simples, adaptado do trote. Mas ele só deu certo, e o filme igualmente, por causa da nossa época. A história dos adolescentes é clássica, mas em termos de redes sociais, eu nunca vi isso no cinema antes. O grande trunfo desse projeto é adaptar uma linguagem arquetípica aos tempos de hoje. Como criar uma estética tão próxima às imagens de hoje? Eu acho que os filmes de adolescente da minha época não funcionariam com o público de hoje. A trama sim, mas a linguagem, não. O nosso filme com certeza foi feito em 2019. Isso é fundamental para as pessoas se identificarem.

A.K.: Isso influencia diretamente na técnica e na fotografia. Nos filmes clássicos, você vê grandes movimentos mais longos, até o uso de grua. No nosso caso, escolhemos fazer planos mais simples, bem feitos e bem fotografados, que dessem a opção de picotar na edição. Não adiantaria montar um trilho de 15 metros, fazer um grande plano-sequência e fugir da nossa linguagem. O filme tem um ritmo único, que precisava manter.

M.M.: Esse é o ritmo do adolescente: a cada 15 segundos, é preciso ter alguma coisa nova. 1917 (2019), o filme sobre o qual todo mundo fala agora, cheio de planos-sequência, é feito para nós, adultos. A molecada se dispersa com qualquer coisa. Mas eu via a plateia, e todo mundo ficava focado no resultado por causa dessa linguagem que eu nunca tinha visto no cinema nacional. É dinâmico, rápido, cheio de piadas, sem apego à estética clássica de planos longos.

 

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Ao mesmo tempo, ele se mantém fiel ao subgênero “filme de férias”.

M.M.: Isso é normal do nosso comportamento hoje. O trote vai ser engraçado a vida inteira, por exemplo, mas o trote do telefone perdeu a graça, porque não usamos telefone mais. Como adaptar isso a 2020? O filme faz isso: pega um clássico dos filmes de escola, e traz ao nosso tempo.

A.K.: A nossa história não é contada de um adulto para um adolescente, esta é uma comunicação de adolescente para adolescente. Os adultos também vão gostar do filme, é claro: durante a pré-estreia, tivemos respostas muito boas deles. Este é um bom programa para a família, mas dentro da perspectiva adolescente.

M.M.: Ao mesmo tempo, fiquei muito satisfeito de ver que o projeto não se limita ao adolescente. A partir do momento que o Adolpho coloca a mim e ao Carioca na história, ele agrada adultos como você. Quando você assiste a Toy Story, as crianças riem em alguns momentos, os adultos riem em outros, mas todo mundo gosta. O desafio era esse.

A.K.: A direção de fotografia é muito adulta. Ela tem uma qualidade capaz de agradar o pessoal mais velho, com um formato feito para agradar o público jovem. Mas sobre os adultos, a gente subiu o stop deles em termos de acting, porque quando fizemos pesquisa, descobrimos como seria o olhar do adolescente ao pai. Durante a pesquisa, alguns jovens me diziam que os pais deles eram exagerados e histéricos, mas quando eu conhecia esses pais, me pareciam pessoas totalmente normais. Então os pais ficaram um stop acima, para corresponder à maneira como os pais são vistos pela garotada. Deixamos os jovens muito à vontade para falar sobre isso. Eles têm muito foco, e detestam ser reduzidos a caricaturas. Os garotos e garotas querem um conteúdo que lhes permita discutir depois. Uma menina de 13 anos me disse que ganha mesada, e vai ao cinema pra ver algo que gere alguma conversa com os amigos depois.

M.M.: Os adolescentes somos nós, na verdade!

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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