Prosseguindo a série de entrevistas com críticos de cinema, reproduzo conversa via e-mail que tive em abril de 2011 com Sérgio Alpendre, a quem aproveito para agradecer.
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Sérgio Alpendre é crítico de cinema, jornalista e professor. Fundou e editou a Revista Paisà, foi redator da Contracampo durante dez anos e atualmente colabora para o UOL, a Folha SP (guia de livros, discos, filmes) e a FOCO.
Blog de Sérgio Alpendre: http://chiphazard.zip.net
Revista FOCO, uma das mais interessantes publicações sobre cinema da internet: http://focorevistadecinema.com.br/
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Como nasceu em você a paixão pelo cinema?
Nasceu aos seis anos, quando meus pais me levaram ao extinto Rio Branco para ver uma animação de Walt Disney, Robin Hood. Depois, passei a atormentá-los todos os dias, porque queria repetir a experiência. Mais tarde, me tornei cinéfilo de locadora (VHS) e de filmes clássicos na TV aberta, já no fim dos anos 80.
Qual é o sentido de ser crítico nos dias de hoje?
Não deixar o espírito crítico, questionador, morrer debaixo da mediocridade reinante. Ou isso ou não faz mesmo sentido. Ainda não sei. Só sei que quero continuar sendo crítico, por algum tipo de masoquismo.
Qual sua posição frente a nova crítica de cinema, que germinou na era dos blogs e das revistas virtuais?
Como vê o academicismo de certas linhas de pensamento na crítica cultural? Acredita que a dissecação de um filme, tornando a análise o mais objetiva possível, tende a enfraquecer a importância da análise subjetiva?
Na crítica geralmente enfraquece, mas há exceções. Gosto de análise, gosto de muitos trabalhos acadêmicos, mas não gosto de sub-análises e sub-academicismo. Acho nocivo à crítica. Não creio que se possa esconder o gosto ao escrever uma crítica, por exemplo. Vira outra coisa, nunca uma crítica. Também não acredito no “mais objetivo possível”.
Quais são seus críticos de cinema favoritos? Os de outrora, que influenciaram ou ainda influenciam seu trabalho, e os de agora, que acredita sustentarem com talento a causa da crítica de cinema.
Dos de outrora destaco Sganzerla, Jário Ferreira, Jean Douchet, Noel Simsolo, Jacques Lourcelles, Jean-Claude Guiguet, João Bénard da Costa, Truffaut, Rivette, Luc Moullet, Michel Mourlet, Jean Domarchi, Rohmer, Bazin, e diversos outros que leio menos, mas sempre com o maior prazer. Em atividade posso citar o Inácio Araujo, o Luiz Carlos Oliveira Jr. e o Bruno Andrade no Brasil. Juliano Tosi é outro que admiro, mas não escreve há um bom tempo. Chris Fujiwara nos EUA. Sèrge Bozon tem um trabalho interessante na França, tem o Chauvin também. Mas crítica é também momento. Em 2008 outros nomes pintariam. É bem possível que daqui a dois anos outros nomes apareçam, ou os que pintariam em 2008 voltem. Existem fases, respostas às vidas particulares de cada um. São muitas coisas que influenciam.
É célebre a história de Antonio Moniz Vianna parou de escrever quando da morte de seu maior ídolo, John Ford, pois acreditava que nada tinha mais a acrescentar como pensador diante da crise criativa contemporânea. Qual diretor cuja morte já lhe provocou semelhante desalento?
Recentemente o Rohmer, sem dúvida. Seus últimos filmes foram geniais. Mas tem morrido muita gente boa de cinema. Está assustadora a maré.
A perda de espaço de textos críticos nos veículos impressos é sintoma da falta de interesse público, ou a busca ávida dos veículos pela adequação a tempos de pouca reflexão?
Acho sobretudo um erro estratégico. Querem imitar a internet, mas estão entrando em um jogo que não podem vencer. O jornal devia trazer a reflexão do furo, a notícia aprofundada e a opinião. A crítica é mais uma vítima dessa orientação equivocada, a meu ver.
Discutir “comércio versus arte” ainda é válido quando percebemos qualquer cinematografia?
Como vê o cinema brasileiro atual?
Vejo com interesse, sempre. Eu sou teimoso, insisto. Há anos me parece que o cinema comercial (para fazer o link com a resposta anterior) é mais feliz que o autoral, ao menos no Brasil. Walter Salles, por exemplo, faz cinema autoral, e raramente acerta. Aquele Budapeste, do Walter Carvalho, é um horror. Insolação, idem. Já os últimos de Daniel Filho, Tempos de Paz e Chico Xavier, são belos exemplos de bom cinema de artesão, com pensamento no grande público. Tropa de Elite (os dois) é outro bom exemplo.
*Entrevista concedida em abril de 2011