O cineasta marroquino Nabil Ayouch expressa inconformismo por meio de seu cinema. Cada um dos personagens de Primavera em Casablanca, destaque do Festival de Cinema Francês 2018, representa uma necessidade de resistência diferente. Da mulher que não aceita ser reduzida ao seu espaço doméstico, passando pelo homem judeu que sofre preconceito na nação árabe, chegando ao professor marcado inapelavelmente pelo autoritarismo de um governo que pouco atenta aos anseios do povo. Ambientando quase todo nas ruas de Casablanca, cidade natal do cineasta, o filme traz a indignação impressa em cada fotograma, não sem o contraponto da esperança possível. Nabil Ayouch é um entrevistado muito atento às perguntas. Responde com brevidade e incisão. Infelizmente não tivemos muito tempo para conversar longamente com ele, já que sua agenda previa uma série de compromissos após o bate-papo com os jornalistas, mas foi o suficiente para perceber que criador e obras estão, neste caso, realmente umbilicalmente ligados. Confira este Papo de Cinema.
Desde Much Loved, seu cinema me soa inconformado. Isso realmente o guia?
Se conformidade for aceitar situações injustas e uma sociedade desigual, então, sim, com certeza, meu cinema é de inconformidade. Não estou de acordo com todas essas injustiças.
Atualmente, como é fazer cinema no Marrocos?
Produzo sempre da mesma forma, sem concessões. Isso não torna a minha jornada simples. Para a parte contestadora do público marroquino, que necessita falar sobre determinadas coisas, sou bom. Para a outra parte, encarno uma espécie de mal absoluto (risos).
Como cineasta, de que maneira você encara a questão polêmica da imigração?
Curioso você fazer essa pergunta. Há 15 dias fiz um filme para o Arte, canal francês de televisão, com duração de uns 25 minutos, no qual interpreto justamente um imigrante camaronês. Ele chega ao Marrocos, país de trânsito, já que muitos passam por lá para chegar até Europa. Ali, se dá conta de que o continente europeu é uma espécie de sonho, de miragem. Vai descobrindo o Marrocos, se identificando, até que decide permanecer. Para os imigrantes, muitas vezes, a Europa é exatamente isto: uma miragem, um sonho, mas, talvez, não seja seu objetivo, no fim das contas.
Por que para você é importante fazer um cinema marcado por figuras femininas fortes?
Primeiro, porque essa é a ideia que tenho da mulher. Ela, por exemplo, está no centro da governança na esfera privada, enquanto no espaço público querem escondê-la. Já está mais do que na hora de inverter a antropologia dos países árabes. Se a gente espera ter algum desenvolvimento humano, social, ou mesmo econômico no mundo árabe, isso obrigatoriamente tem de passar pela mulher.
(Entrevista concedida ao vivo no Rio de Janeiro, em junho de 2018)
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