O paulista Robson Nunes ganhou sua grande chance na tela grande neste ano, ao ser convidado para viver o protagonista da cinebiografia Tim Maia (2014). Esta tarefa – que ele divide com Babu Santana, cada um ficando responsável por uma fase da vida do cantor – não é, no entanto, seu primeiro desafio no cinema. Afinal, o jovem de São Bernardo do Campo estreou já sob o comando do veterano Ugo Giorgetti em Boleiros (1998), e desde então só somou outros trabalhos de destaque ao lado de cineastas como Fernando Meirelles (Domésticas, 2001), Hector Babenco (Carandiru, 2003), Bruno Barreto (Caixa Dois, 2006) e Sergio Bianchi (Os Inquilinos, 2009), entre outros. Premiado no Cine PE como Melhor Ator Coadjuvante por seu desempenho na comédia Família Vende Tudo (2011), de Alain Fresnot, ele tem tudo para obter ainda mais reconhecimento com este novo filme. E foi sobre isso que o ator conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!
Você já fez de tudo um pouco: cinema, televisão, teatro, público adulto e infantil, obras autorais e outras mais comerciais. Qual foi o nível de desafio enfrentado para reviver na tela um ícone como Tim Maia?
Nossa, foi o maior possível! O Tim Maia, de longe, foi o meu maior desafio profissional. Começa logo pelo fato de que é a primeira vez que interpreto alguém que, de fato, existiu. E para isso teve todo tipo de preocupação, desde o sotaque – tive que vir para o Rio de Janeiro muito tempo antes do resto do elenco apenas para descobrir como o jovem Tim Maia, aquele garoto da Tijuca, falava. Afinal, sou o Robson de São Bernardo! É outro universo! Tive que aprender a fumar, que é algo que não fazia. Para isso preciso agradecer a atenção especial que recebi da produção, que importou um tipo de cigarro especial, feito de alface, só para as minhas cenas! Acredita nisso? Isso sem falar no mais óbvio, que era aprender a tocar violão, guitarra, saber cantar…
Tim Maia era conhecido, além de por suas canções, também pelo temperamento instável. E você deixa isso bem claro na tela, desde as primeiras sequências. Como foi o processo de trazer isso à tona?
Pra mim, estar ouvindo isso de você, que assistiu ao filme, é uma grande honra. Fiquei dois meses trabalhando com o Babu Santana antes de encontrar o elenco. Nossa preocupação era imprimir desde cedo a personalidade do Tim Maia. Pois o público só o foi conhecer anos depois, quando jovem ninguém sabia quem ele era! E o desafio era justamente esse, fazê-lo de um modo que o espectador o reconhecesse, mesmo nunca tendo-o visto naquela idade. Para isso trabalhamos juntos, mesclando os textos, foi uma grande sacada! Nossa missão era fazer um único cara, um único Tim Maia. E as pistas do Síndico estão lá atrás, naquele jovem que correu atrás.
É muito complicado dividir um mesmo personagem com outro ator? Vocês tiveram algum tipo de preparação em conjunto?
Antes de mais nada, é preciso deixar claro que essa foi uma decisão do diretor Mauro Lima, que conseguiu convencer o produtor do filme. O Tim Maia parecia mesmo ter sido duas, três ou quatro pessoas durante toda a sua vida. É só olhar as fotos dele! Ele era um camaleão, foi mudando, se transformando em outras pessoas. Os registros que existem dele deixam isso bem claro. Daí fizemos um mosaico de fotos minha, do Babu, do Tim Maia jovem e velho, e não tinha como discernir quem era quem! Isso contou para que nós dois fossemos escolhidos. A Alinne Moraes e o Cauã Reymond, por outro lado, passaram apenas por uma caracterização de maquiagem e figurino, pois eles podiam ser mais genéricos. Mas nós não, tinha que ser específico. A preocupação principal era fugir do estereótipo. É o que o filme tenta mostrar, aquele Tim Maia que existia quando se desliga a câmera, a relação dele com a família, com os amigos mais próximos. Disso não se tem registro, essa é a característica que buscamos. Com isso, abriu margem para criarmos nossos próprios códigos, analisar minuciosamente cada detalhe. Começa com ele ainda criança, com o Carlinhos – que é filho do Babu – passa por mim e chega no Babu. São coisas bem sutis, que muitos nem irão perceber, mas que estão lá, que criamos juntos e que mostram que era apenas versões de um mesmo homem.
O que foi mais difícil, as sequências musicais ou os momentos íntimos do personagem?
Tudo foi bem difícil! De longe, o Tim Maia foi o grande desafio, como comecei falando! Teve um cuidado também em traçar uma linha até entregar o bastão para o Babu! Das marmitas até o primeiro sucesso! Essa passagem de tempo exigiu que estudasse até na voz, no adolescente, e aos poucos fui deixando-a mais grave, com um timbre semelhante ao dele. Essa preocupação de ser o mais fiel possível abrangeu todos os aspectos possíveis.
Tim Maia, o filme, tem passagens por Nova York e Londres, além do Brasil. Vocês foram até esses lugares? Como foi a logística da produção?
A última semana das filmagens foi toda em Nova York, e passamos dez dias por lá. Durante esse tempo, creio que filmamos por uma semana. Foi muito maneiro, já tinha ido para os Estados Unidos antes, mas não para Nova York, então tudo aquilo era novo pra mim também, entende? Pude buscar aquele frescor de conhecer os lugares pela primeira vez, de não saber nada de inglês e ir aprendendo na marra… Tive que trabalhar isso também, afinal o cursinho não é o suficiente (risos)! E atuamos ao lado de atores gringos que foram muito bacanas, me ajudaram muito, falando antes cada linha do diálogo, me ajudando a sentir a musicalidade do inglês falado. Isso foi muito importante pra mim!
A história é do Tim Maia, mas outros artistas de destaque, como o Roberto Carlos, também são citados, e nem sempre de maneira muito positiva. Todos tiveram que ler a aprovar o roteiro antes?
O que sei e posso afirmar com certeza é que todos os citados que estão por aí, como o próprio Roberto, viram – ou alguém da confiança deles viu – o roteiro e aprovaram. Nada foi na aventura, no risco. Se teve todo o tipo de cuidado para que o filme não fosse frágil. Afinal, uma coisa que o Mauro sempre colocou é que essa era apenas uma visão do Tim Maia, o que resume muito cada situação. A gente não quis ser absoluto, e sim oferecer um olhar sobre esse grande artista e o impacto que ele deixou nas pessoas que o conheceram.
Você já trabalhou com profissionais experientes como Hector Babenco e Sergio Bianchi. Como foi atuar sob o comando de Mauro Lima?
O Mauro é de outra geração de diretores. Já trabalhei com alguns monstros, como Giorgetti, por exemplo, e o ritmo é bem diferente. Nem melhor, nem pior: apenas diferente. O Fernando Meirelles, por exemplo, é um cara mais contemporâneo, que dá uma liberdade muito grande. Isso se reflete nos filmes dele, que tem algo muito orgânico da parte dos atores. Não é que ele deixe fazer de qualquer jeito, é uma criação conjunta, sempre ao lado. É uma delícia trabalhar com um cara como o Fernando, e com o Mauro foi muito maneiro porque foi ele que roteirizou e também ficou responsável pela montagem do filme. Ou seja, ele tinha tudo na cabeça dele o tempo inteiro, sabia exatamente os planos que queria. Estava muito claro, ele sempre foi muito objetivo. Às vezes tínhamos uma dúvida ou outra, mas ele estava muito seguro. Gostei de trabalhar com ele. Nas sequências filmadas nos EUA precisei mais do apoio dele, pois a maior parte das coisas não estava roteirizada, e pude acompanhá-lo criando cada passo ali ao nosso lado, dividindo conosco o processo. Foi uma experiência incrível.
Como você acredita que o público irá receber a versão cinematográfica de Tim Maia?
Uso uma frase que o Babu diz que é genial: quando você faz uma coisa sobre o Tim Maia, é impossível dar errado! Sabe, não conheço ninguém que não goste dele. É uma obra tão extensa e versátil que sempre haverá com o que se identificar. O jogo é de saída 2 a zero, a relação afetiva já está ganha. Esse filme vem para coroar uma série de homenagens, o livro do Nelson, o espetáculo do Joao Fonseca. São obras que mostram quão múltipla era a personalidade do Tim, e acho que agora as pessoas vai passar a admirá-lo ainda mais!
(Entrevista feita por telefone direto do Rio de Janeiro em 28 de outubro de 2014)
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