Caco Ciocler simplesmente não para. Somente no ano passado ele esteve em três filmes diferentes – Fica Mais Escuro Antes do Amanhecer, de Thiago Luciano, e O Banquete, de Daniela Thomas, ambos exibidos nos cinemas, e Contra a Parede, de Paulo Pons, lançado diretamente nas plataformas de streaming. E em 2019, ele já passou pelas telas em O Olho e a Faca, de Paulo Sacramento, e agora está de volta na cinebiografia Simonal, de Leonardo Domingues, enquanto aguarda o lançamento de mais três títulos, já finalizados: Boni Bonita, de Daniel Barosa, premiado no Festin Lisboa, Romancing Brazil, de Lucas Amberg, a sequência tardia de Caminho dos Sonhos (1998), lançado vinte anos atrás, e sua estreia no mercado internacional com Bewitched, de Fabiano Cechiari, Eric e Marc Belhassen. Indicado cinco vezes ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e outras quatro ao Prêmio Guarani de Cinema Brasileiro, premiado no Festival do Rio e no Cine PE, em Simonal ele interpreta Santana, o agente do DOPS responsável por ir atrás do cantor que encantava multidões nos anos 1970. Sobre esse trabalho, o ator conversou com exclusividade com o Papo de Cinema. Confira!
Caco, você esteve no Elis (2016), no João: O Maestro (2017), e agora em Simonal (2018). É uma predileção pessoal por cinebiografias musicais?
Atrai, sim. No entanto, não vou mentir e dizer que foi uma escolha consciente, do tipo “a partir de agora só irei fazer cinebiografias de grandes músicos”. Mas, claro, quando surgem esses convites, é algo que me agrada. O cinema brasileiro, diferente do argentino, tem essa ânsia de falar sobre o próprio país. E são momentos pelos quais passamos. Vamos falar sobre o nordeste, sobre a ditadura, sobre as favelas, e logo surgem levas de filmes com estes temas. Acho que agora estamos falando do Brasil através da arte, da música. Olhando para a nossa história através dessas pessoas. Pra mim, particularmente, é muito legal, pois acho que o artista está vivendo um momento muito delicado. Por isso que esses resgates são importantes para as pessoas lembrarem que o artista não é essa pessoa midiática, e ponto.
Em Simonal, você vive o agente do DOPS, o grande vilão. Uma figura que basta ser citada para que todos tenham uma ideia pré-concebida a respeito. Como evitar o exagero?
O roteiro ajuda, pois já na primeira cena ele tem uma atitude, logo quando acaba o interrogatório, que ele vai até o Simonal no corredor e diz “sou teu fã”, isso ajuda a quebrar essa ideia. Ele tá fazendo o trabalho dele, e ao mesmo tempo faz questão de manter uma certa aura, principalmente quando deixa cair o cartão de propósito.
É uma cena tão simples, mas que já fala tanto sobre o personagem…
E foi algo que inventamos ali, na hora de filmar. Aquilo, por sua vez, não estava previsto no roteiro, e acho que ficou do caralh*. E a gente tinha essa preocupação, de não explicar demais, mas deixar claro quem era esse cara. Agora, vou te contar um segredo: as minhas cenas foram muito cortadas. Esse lado humano desse cara, tinha muito mais que filmamos e que acabou não entrando no corte final. E, pra mim, isso foi uma pena. Pois não fica tão claro que o que aconteceu sem essa percepção.
Afinal, ele é um cara tentando salvar o próprio pescoço, não?
Exato. Quando estoura a bomba, fica claro que não poderia ter usado o departamento dele para bater em um contador para resolver uma questão particular. Então, tudo aquilo caiu nas costas dele. Foi quando pensou: “não vou pagar por isso sozinho”. Só que essa cena, que explicaria isso melhor, foi muito cortada, e é por isso que não fica tão claro no filme. Os diálogos acabaram ficando muito rápidos, superficiais, tem que estar muito ligado para entender.
Como você encara esse tipo de decisão do diretor?
Nesse caso, em particular, pra mim foi um dó. Afinal, era uma questão também muito humana do personagem. Ele está diretamente envolvido com o Simonal, não foi um ou outro – foram os dois juntos. Só que ele chama o cantor e diz: “assina aí esse negócio” e acaba com a vida do cara. É algo muito grande que está acontecendo, mas que no filme acaba se resolvendo de um modo ligeiro. Acho que, com esse corte, ainda ficou um pouco chapado, como se ele fosse apenas aquele monstro, o “cara do DOPS” o tempo inteiro, sem esses medos e inseguranças que tomaram conta dele. Afinal, o que tentei fazer não era só isso, procurei me aprofundar mais nesse personagem.
Pessoalmente, Elis, João ou Simonal? O Caco Ciocler gosta mais de qual destes três músicos?
Dos músicos? (para por um longo tempo, refletindo) Cara, Elis. O Simonal, é engraçado, ele não faz parte do meu imaginário, não chego a me lembrar dele. A Elis, sim. Lembro de uma cena muito forte dela em uma entrevista famosa que deu na televisão e que chorava. Eu era bem pequeno, e minha mãe se emocionou junto com ela, ao meu lado, a vendo pela tevê. Perguntei o porquê dela estar chorando. Foi quando me dei conta, pela primeira vez, da sensibilidade humana de um artista. E teve também o Família Vende Tudo (2011), que é uma comédia muito engraçada em que interpreto um cantor. Foi divertido fazer.
(Entrevista feita ao vivo em Gramado em agosto de 2018)
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