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Leo Falcão é um profissional experiente. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela Universidade Federal de Pernambuco, especializado em Estudos Cinematográficos pela UNICAP, além de mestre e doutor em Design pela UFPE, trabalhou em diversos projetos para TV, cinema e games ao longo de mais de 20 anos antes de debutar como realizador de longa-metragem. Também músico e professor da CESAR School, no Recife, além de irmão do ator Gustavo Falcão (protagonista do seu debute em longas), Leo Falcão apresenta no Fantaspoa 2022 o filme Sujeito Oculto (2022), um dos destaques do evento sediado em Porto Alegre. A trama gira em torno de um romancista tentando superar o bloqueio criativo. Para isso, o escritor se muda a uma estranha vila. Enquanto tem ideias estranhas, páginas escritas por um antigo morador aparecem na escrivaninha. Se trata de uma história com elementos conhecidos, especialmente pelos fãs do cinema de horror, mas contada com um apurado senso de suspense. Para saber um pouco mais sobre Sujeito Oculto, realização que terá sua première mundial durante o Fantaspoa 2022 nesta quinta-feira, 28, numa sessão no Instituto Ling, na capital gaúcha, conversamos remotamente com Leo Falcão. O resultado você confere em mais este Papo de Cinema exclusivo.

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Tendo em vista que muitos cineastas no Brasil demorar anos preparando seus filmes, gostaria de saber como surgiu o Sujeito Oculto e se ele se enquadra nesse cenário de anos e mais anos de desenvolvimento?
O filme começou com o título de Ghostwriter, aí veio o filme do Roman Polanski (O Escritor Fantasma, 2010) aí mudei o título para Primeira Pessoa. Só que aí o Paul Haggis lançou em 2013 o Terceira Pessoa. Tive de mudar de novo (risos). Isso para você ver que faz tempo. Comecei no cinema com ficção, meus cinco ou seis curtas iniciais foram de ficção. Em 1997 iniciei como roteirista e em 1999 já dirigia, isso depois de pedir demissão do cargo de redator publicitário numa agência. Cresci nessa consolidação de mercado e conteúdo no Brasil. Curiosamente, meu primeiro longa foi documental, o Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife (2009). A ideia era fazer logo um longa-metragem ficcional nessa época. Eu já tinha a cena final na cabeça, que não podemos revelar (risos). Fiz o primeiro tratamento, mas não estava muito satisfeito, Chegamos a ser aprovados para o desenvolvimento, mas demorou demais para aprovar a fim de iniciar a produção. Tanto que eu já era outra pessoa, tinha outros interesses. Quando retomei o projeto, depois da entrada da distribuidora Lume Filmes, fui incentivado pelo produtor Alexandre Nogueira da Cruz, da Cereja Filmes. Tive a ideia de fazer esse amálgama de histórias, de criar esse lugar esquisito em que não há exatamente pessoas, mas no qual há uma encruzilhada de narrativas suspensas de alguma maneira. E acho que mesmo durante muito tempo fazendo documentários, não perdi a mão na composição de personagens.

E imagino que você continuava exercitando isso nas atividades paralelas que tinha…
Sim, justamente o meu trabalho fora do cinema me manteve nesses trilhos. Também faço design de narrativas de jogos e acabei não perdendo tanto esse hábito. Comecei a criar algumas histórias que valiam a pensa serem contadas e o resultado foi quase como tornar presentes um monte de loglines, num conjunto que para mim fazia sentido de algum modo. O roteiro teve seu caminho modificado e aí fiquei mais animado para realizar. Resgatei um pouco isso de renovar meu interesse autoral por aquilo tudo. Posso dizer que o projeto foi gestado ao longo de 10 anos, embora desde 2011 ele tenha ficado parado alguns períodos, especialmente na fase de finalização. Tivemos a pandemia e essa desconstrução toda das políticas de fomento, que realmente foi um desastre para a área cultural. Infelizmente, tivemos um puta retrocesso. Mas, agora o filme está feito. Depois de um percurso acidentado, ele existe.

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No filme você lida com um universo em parte reconhecível, em parte não. Mas, fico curioso para saber se esses elementos reconhecíveis vêm da sua experiência pregressa como cinéfilo?
Sim, tem tudo a ver. Esse filme nem é tão metalinguístico como outros que fiz, mas dialoga com a metalinguagem. Para mim, ela ganhou outra expressividade. Sempre digo para meus alunos começarem tranquilos e irem tornando as coisas complexas aos poucos. Essas convenções, bem como a desconstrução, são sistemáticas no filme. A ideia era mesmo começar a partir das convenções, mas ir quebrando elas. A tensão dramática é criada em torno da tensão entre histórias. Ao mesmo tempo, ele é literário. E sobre as convenções, talvez mais do que o que me alimentou como cinéfilo, ele tenha o que me nutriu como leitor. Provavelmente, o exercício mais desafiador tenha sido transformar as metáforas em imagens e elas bebem na fonte do realismo fantástico literário: Jose Saramago, Jorge Luis Borges, Julio Cortázar, Gabriel Garcia Marquez. Atualmente leio muito do fantástico britânico, sobretudo Neil Gaiman e Alan Moore. Então, esses dois universos são muito fortes na minha experiência como contador de histórias.

E no Sujeito Oculto sobressai o que me parece uma vontade de construir a narrativa repleta de coisas não verbalizadas, na qual os cenários também tenham enorme valores simbólicos. É por aí?
Há algum tempo não fazia ficção em audiovisual. Fui um quadrinista frustrado, então sempre achei importante a construção de uma narrativa visual. E ela claramente se distingue da produção verbal. Quando escrevo um texto literário, me delicio com o processo de expressão por palavras. Quando é um filme, a imagem me guia. Uma das coisas que me fez fazer cinema foi o fracasso. Mostrei as páginas de um quadrinho autoral para um professor e ele disse que meu traço não tinha identidade, mas que eu seria um bom cineasta. Na hora não entendi aquilo, mas ele estava completamente certo. Ele queria dizer que eu tinha uma boa concepção de narrativa visual. Tentava imitar o traço mainstream dos quadrinhos Marvel e DC, mas não tinha disciplina e no fundo não tinha interesse. Demorei até encontrar outras formas de fazer quadrinhos. Aliás, só voltei a me reconhecer novamente como desenhista ou ilustrador de uns tempos para cá.

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Pensei direto naquela casa, que é tão importante para o filme…
Para você ter uma ideia, aquela casa foi feita em três locações, em três cidades diferentes. A fachada fica em Camaragibe, na zona rural pernambucana; o interior do térreo é de uma casa de Olinda; e a parte do quarto de cinema é em estúdio. Tinha feito um desenho dessa casa, mas precisei refazer quando visitamos as locações.  E queria que a fachada ficasse próxima à mata, espaço mítico que para a gente tem um simbolismo em relação ao fantástico e ao folclórico. Curioso, porque o que me faz ter interesse por diversas narrativas é aquilo de ser legal viajar, conhecer novas realidades, novas rotinas, mas voltar para casa também é massa. O cinema de ficção é meio que minha casa. Acho instigante para caramba fazer documentário, conceber uma narrativa interativa de jogo, mas cinema de ficção é meio que capaz de mudar uma chave. A busca é um pouco essa.

E você tinha nomes muito conhecidos que acabaram não podendo participar do filme, certo?
Sim, o Lázaro Ramos iria fazer um personagem que, aliás, tinha escrito para ele viver num curta, mas também acabou não rolando. Lázaro estava comprometido com Medida Provisória (2021), aí não deu. Vladimir Brichta ia ser o coveiro, mas acabou se machucando. E o Irandhir Santos iria ser o dono do antiquário, aliás personagem que ele chegou a fazer num curta meu e que, vim a saber apenas depois, foi a estreia dele no cinema. Mas, o Irandhir estava com a agenda apertadíssima por causa de uma novela e aí não consegui fazer o longa.

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E como estão as suas expectativas para a première mundial num festival tão importante quando o Fantaspoa, que conta com um público conhecedor e exigente quando ao cinema de gênero?
Será o meu primeiro Fantaspoa. Conheço de reputação, mas nunca participei. Aliás, será o meu primeiro festival de gênero. Acho muito interessante estrear lá. Parece que o filme encontrou o seu lugar. Há certas compreensões acerca do filme que serão específicas num evento desses. Diria que ele lá ele fará mais sentido.  O filme dialoga melhor com isso do gênero fantástico e acho massa que o Fantaspoa abrace o ecletismo dos aspectos do fantástico. Por enquanto, estou acompanhando pelo Instagram e já vi que terei de me programar para conferir o evento inteiro nos próximos anos (risos). A minha expectativa é enorme. Já seria grande pela estreia, mas ela cresce dentro desse contexto. E estou feliz de apresentar o meu primeiro longa de ficção ao público. Vamos dando a cara a tapa e aprendendo. Faz parte do jogo. Não tem aquilo de “não sabe brincar, não desce pro play“? Acho que “descer pro play” significa estar pronto para as pessoas gostarem, odiarem, para me deparar com leituras mais profundas e também com gente que quer destruir o filme gratuitamente. Entendo que tudo isso seja parte do jogo. Mas, tenho a sensação de que, no Fantaspoa, o filme estará em casa.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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