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Thomas Cailley é um nome em alta no atual cinema francês. Nascido em 29 de abril de 1980 em Clermont-Ferrand, distante cerca de 400 km de Paris, começou seus estudos da Escola de Comércio de Nantes, o que o levou a se interessar pela distribuição cinematográfica e, posteriormente, à produção de documentários. Após algumas experiências na televisão e em curtas-metragens que tiveram uma boa repercussão no circuito de festivais, estreou como realizador de longas com Amor à Primeira Briga, filme vencedor de quatro troféus no Festival de Cannes e de outros três no César – o Oscar da França – entre eles o de melhor primeiro trabalho. E foi com essa impressionante trajetória que o cineasta veio ao Brasil na última semana para acompanhar a chegada às telas de sua obra mais famosa, depois de ter sido exibida no ano passado durante a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. E aproveitando a passagem do diretor por aqui, o Papo de Cinema conversou com exclusividade com ele, que revelou suas impressões pelo país e pelo cinema brasileiro. Confira!

 

Amor à Primeira Briga é seu primeiro longa, após diversos curtas. O que lhe motivou nesta história para assumir esse desafio?
Eu queria contar uma história de amor, só que não tenho muita experiência em comédias românticas, que é um gênero de muito sucesso em todo o mundo. Portanto, tive que pensar numa outra proposta dramática. Foi quando me surgiu a ideia destes dois personagens, que desde o primeiro momento me despertaram um grande interesse. São personagens muito singulares, com suas particularidades tão características, e estava curioso em mostrar como eles conseguem transmitir uma atração genuína e, ainda assim, estranha aos olhos dos outros. Outro elemento que sempre me atraiu são os reality shows de sobrevivência, é um tipo de programa que gosto de assistir na televisão, e achei que seria possível combinar estas duas histórias. Este é um assunto bem contemporâneo, que permite preencher este vazio que existe entre os protagonistas, vê-los reagindo entre si em um ambiente bem solitário. Pensei que seria interessante inserir essa história de amor neste cenário. Costumo definir Amor à Primeira Briga como um encontro de Casablanca (1942) com Rambo 3 (1988).

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Adèle Haenel e Kévin Azaïs não são novatos, mas estiveram em poucos filmes como protagonistas. Como foi a seleção dos dois?
Já conhecia Adele pelos filmes dela, e a considero uma atriz única do cinema francês. Ela possui muita força, cheia de energia, com uma potência incrível. E é legal que ela é também um pouco palhaça, pois sabe falar muito rápido, é muito engraçada. Mas, ao mesmo tempo, tem um olhar muito determinado e até um pouco intocável. Por isso pensei que ela representaria muito bem a personagem de Madeleine, que é forte, determinada e tem um quê de louca. Já o Kevin foi um processo de escolha um pouco diferente. Ele participou de testes ao lado de mais de 100 atores, foi uma seleção rigorosa. Ao vê-lo, tive essa sensação de que é um rapaz bem particular, meio inocente, cândido, mas não apenas vulnerável, com algo de generoso, bom. Ele possui algo que é possível identificar pelo olhar, não tem como tatuar. E isso fica claro na tela ao observarmos o olhar dele por Madeleine, pois é assim que também a vemos. Ela poderia ser uma personagem detestável, mas se torna agradável ao público por causa do jeito que ele olha para ela.

 

Amor à Primeira Briga estreou na França na metade do ano passado. Como foi a recepção por lá?
Felizmente, o filme foi muito bem recebido pelo público, e gente de todas as idades, não só os jovens. Tivemos mais de 400 mil ingressos vendidos, o que na França é um excelente resultado. E foi também muito bem recebido pela imprensa, com ótimas críticas e alguns prêmios importantes pelo caminho. O desempenho do filme foi muito além das nossas expectativas, e foi isso que nos possibilitou levá-lo a outros países, como aqui no Brasil.

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Cena de "Amor à Primeira Briga"

O Sindicato dos Críticos de Cinema da França lhe premiou como Melhor Filme de Estreia. Como você vê a importância da Crítica e de um reconhecimento como esse?
Dou muita importância para um prêmio como esse, com certeza. Um prêmio da crítica internacional, como recebemos no Festival de Cannes, é um verdadeiro reconhecimento, pois significa que conseguimos nos comunicar além do nosso jardim. Isso é ótimo, dá espaço para o filme, e não é fácil quando não se trata de um blockbuster, que todo mundo naturalmente já está interessado em assistir. Fiquei muito feliz com a recepção que o filme está tendo por todos os lugares onde tem sido exibido, tanto na França como no exterior.

 

Amor à Primeira Briga foi muito premiado também no César e no Festival de Cannes. O quanto estas premiações contribuíram no sucesso internacional do filme?
Fiquei muito surpreso, pois não era algo que esperávamos. Quando se faz um filme, não é pelo prêmio, isso é uma consequência à dedicação e entrega com quem contamos nossa história, acredito. E são reconhecimentos assim que permitem que o filme exista, que o leva a sair das fronteiras da nossa casa. É um aval coletivo que nos deixou muito emocionados, pois este é o primeiro filme de muitas pessoas que trabalharam no projeto, não só meu. São vitórias de todos nós, e não apenas minha.

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Como foi a escolha dos cenários por onde os personagens de Amor à Primeira Briga passam?
A sequência mais interessante do filme é quando os dois se separam do grupo e vão para o meio do mato. Essa parte foi filmada em uma região que eu já conhecia e gosto muito. Fica perto de um rio, e possui duas particularidades que colaboraram muito com a história: de um lado há uma floresta intocável, quase pré-histórica, e quis isso porque a menina acredita no fim do mundo, enquanto que o menino vem para apresentar o novo mundo, o renascimento. E este lugar representa o paraíso, um éden intocável. E o segundo detalhes deste lugar é que a cama, a parte de baixo do rio, é de areia, e a luz que refletia dele era amarelada, bem quente, algo que eu estava procurando. O filme possui uma evolução cromática proposital: o inicio é azul, sua metade é verde, e o fim é amarelado, laranja, mais quente. Essa ideia era para mostrar a aproximação dos personagens, à medida que vão ficando mais íntimos um com o outro.

 

Esta é sua primeira vez no Brasil? Conhece o cinema brasileiro?
Sim, é minha primeira vez, e conheço muito pouco do cinema brasileiro. Lembro de alguns filmes como Cidade de Deus (2002), que marcaram a adolescência. Mas são poucos. Vou aproveitar esta passagem por aqui para fazer uma lista de alguns títulos imperdíveis dos últimos anos para poder estudar mais. Até se você tiver alguma dica pra me passar…

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Kevin Azaïs, Thomas Cailley e Adèle Haenel

Além do Cidade de Deus, outros títulos brasileiros de muito sucesso no exterior nos últimos anos foram Central do Brasil e Tropa de Elite
Ah, Central do Brasil eu já assisti e gostei muito. Sim, lembro do Oscar, dos prêmios. É uma história muito bonita, emocionante. A atriz é fantástica. Mas o outro que você falou não conheço. Vou atrás.

 

Como imagina que será a recepção de Amor à Primeira Briga por aqui?
Espera que seja bem recebido. Sabe, se não atirarem tomates nele já estarei feliz (risos)… Mas é sério, a gente nunca  sabe como vai ser. É sempre um mistério. O que posso dizer é que já acompanhei duas pré-estreias, uma em Brasília e outra no Rio de Janeiro, e a impressão que tive é que gostaram bastante… Então, a expectativa é a melhor possível, certo?

(Entrevista feita por telefone direto de São Paulo em 30 de março de 2015)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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