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Filho do Alegrete, cidade que carrega, como poucas, as raízes do ser gaúcho, o cineasta Hique Montanari está eufórico por conta do lançamento de seu primeiro longa-metragem. Yonlu (2018) é uma cinebiografia nada convencional, centrada na figura de um menino prodigioso artisticamente que, aos 16 anos, cometeu suicídio, deixando uma obra, especialmente a musical, para a posteridade. Graduado em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda e com pós-graduação em Produção Cinematográfica pela PUC-RS, Hique é um profissional experiente na seara audiovisual, trabalhando nela desde o princípio dos anos 90. Depois de diversas realizações para a televisão, ele lançou em 2010 o curta-metragem Fogo, amplamente premiado. Com seu longa de estreia, passou pelo Festival do Rio, pela Mostra de São Paulo – onde foi reconhecido com o prêmio da crítica – e agora chega, finalmente, ao circuito comercial. Yonlu será distribuído pela igualmente gaúcha Lança Filmes. O cineasta nos recebeu gentilmente para este Papo de Cinema. Confira:

 

Como foi traduzir cinematograficamente a beleza das letras e da poesia do Yoñlu?
O projeto começou em 2009. Do princípio até 2014, quando o inscrevemos num edital, fiz três tratamentos de roteiro. Daí a começarmos a filmar, precisamente em 2016, chegamos à 12ª versão. Ali já tínhamos indicações de certas coisas como, por exemplo, as cenas do astronauta. Todavia, as texturas não constavam previamente. Mesmo antes de filmar, eu não sabia que a sala do fórum da internet seria verde daquele jeito. Não imaginava, também, que a Luana seria tratada em flashbacks de filme clássico. Essas e outras coisas foram resultados de experimentos que realizamos na montagem e na finalização.

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Hique, o filme foi todo rodado em Porto Alegre?
As cenas do astronauta foram filmadas em Viamão. Tivemos filmagens na Avenida Borges de Medeiros e no terraço da Receita Federal em Porto Alegre. Todas as internas foram rodadas em estúdio, na Tecnopuc, o parque tecnológico e científico da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. E essa locação acabou trazendo várias coisas para o filme. Lá tinha uma grande caixa preta que nos dava a possibilidade de construir cenários. A partir disso, surgiu a ideia de mostrar que estávamos de fato numa locação, deixando os bastidores à mostra. Mas, ao entramos no cenário, desligamos dos bastidores. E isso é bem legal. No roteiro, basicamente, eram previstas locações convencionais.

 

E como foi a concepção da trilha sonora?
Tínhamos uma relação contratual com a família do Vinícius. As 14 faixas do CD A Society in Which no Tear is Shed is Inconceivably Mediocre, lançado internacionalmente, deveriam figurar no filme. Uma das músicas era um cover do Vitor Ramil. Precisamos, então, correr atrás de liberação para sincronização. Outro cover tinha seus direitos atrelados à BMG. E a gravadora pediu muito alto para autorizar, algo em torno de sete mil e poucos dólares. Negociamos com família a exclusão dessa faixa, pois o custo extrapolava nosso orçamento. Então, das 14 faixas do CD, 13 estão no filme. E, claro, também há a trilha sonora incidental.

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E por que identificar as faixas, quase como elas pontuassem capítulos?
Essa questão de colocar o nome das faixas musicais entrou bem depois, com tudo já quase totalmente montado. As canções do Yoñlu são super narrativas, dialogam com a estrutura e a história do personagem. A partir disso, resolvemos legendar as músicas, também. Testamos assistir ao filme com e sem legendas nas canções. São dois resultados completamente diferentes. Com as legendas, o todo muda para melhor. Além disso, acreditamos que entrando com o título das faixas deixávamos ainda mais claro que aquilo era obra do Yoñlu. Era uma assinatura, além de permitir a separação da trilha incidental.

 

E como ocorreu a aproximação com o Thalles para viver o protagonista?
Quando o projeto ainda estava vinculado à Casa de Cinema de Porto Alegre, primeira produtora que o abraçou, rolou uma nota na Folha de São Paulo sobre o filme. Assim que meu nome caiu na imprensa, o Facebook bombou de atores e atrizes entrando em contato. Recebi um e-mail do Thalles e respondi, dizendo que não sabia exatamente quando faríamos os testes. Não saquei que era o Thalles, não liguei o nome à pessoa (risos). Quando ele me adicionou no Facebook, vi a foto e apenas ali me dei conta de que era o filho do Félix (risos) – alusão à novela Amor à Vida, na qual Thalles Cabral interpretou o filho do personagem do Mateus Solano.

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E como se deu esse diálogo com a realidade?
Tomamos muitas liberdades. Não era o nosso desejo, por exemplo, cair numa de reconstituir fielmente 2016. Claro que tivemos preocupações com a fidedignidade, mas não me parecia relevante ser questionado sobre a existência de um objeto cênico não condizente com a época retratada, já que a pegada ali é outra. O Thalles expressou ressalvas quanto ao fato de não ser fisicamente parecido com o Vinícius. Obviamente, não poderia escalar alguém cujo fenótipo fosse tão distante, mas não queria ter um ator escolhido pela semelhança, isso não me parecia relevante. Tanto que o Vinícius morreu com 16 anos e, quando rodamos, o Thalles tinha 23.

(Entrevista concedida ao vivo, na Mostra de São Paulo, em novembro de 2017)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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