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E Gramado finalmente assumiu a cara que todos esperam ao virem pra cá: frio e chuva! Após um início de festival bastante ensolarado, a segunda-feira marcou a diminuição das temperaturas e o aumento da umidade. E dá-lhe guarda-chuvas em punho, casacos mais pesados e sempre pensar duas vezes antes de se aventurar pelas ruas da charmosa cidade da Serra Gaúcha. Outra mudança está marcando essa edição: a concentração de todos os participantes – jornalistas, cineastas e convidados – no Hotel Serra Azul, bem no centro de Gramado. Com todas as atividades num mesmo lugar e bastante próximo do Palácio dos Festivais – ficam a uma quadra de distância um do outro – não tem acontecido o que nos anos anteriores se caracterizava como o maior charme do festival: o desfile de artistas, diretores de cinema, críticos, técnicos e repórteres por todos os lados, de uma forma bem integrada com os demais turistas e também com os moradores locais. Gramado, até ano passado, virava uma cidade de cinema. Hoje, no entanto, só quem está dentro do hotel ou do cinema é que sabe o que se passa. Do lado de fora, tudo continua com a mesma rotina.

O primeiro dia útil da semana marcou também o início da Mostra Competitiva de Curtas-Metragens Nacionais. Com sessão aberta ao público a partir das 17h, foram exibidos quatro filmes com no máximo 15 minutos cada: Insustentável, de Luísa Pereira, Polaroid Circus, de Marcos Mello e Jacques Dequeker, A Verdadeira História da Bailarina de Vermelho, de Alessanda Colasanti e Samir Abujamra, e A Melhor Idade, de Angelo Defanti. Os dois primeiros são de São Paulo, enquanto que os dois últimos vieram do Rio de Janeiro. Insustentável e Bailarina de Vermelho são documentários, os demais obras de ficção. Tudo bem dividido, variado, abrangente. Mas nenhum que tenha arrancado mais do que aplausos protocolares do público.

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A noite começou com o melhor filme até o momento por aqui: As Más Intenções (acima), de Rosario Garcia Montero. O cinema peruano pouco marca presença no Brasil, mas quando chega até nós vem com uma força bem impactante. Foi assim com A Teta Assustada (vencedor de Gramado em 2009 com 4 kikitos, inclusive Melhor Filme latino) e o recente Contracorrente, representante do Peru na busca de uma vaga ao Oscar de Melhor Língua Estrangeira. E esse novo representante demonstra, mais uma vez, que essa, definitivamente, é uma cinematografia que merece ser conhecida e observada com maior atenção. A trama passa-se no início dos anos 80, período de ditadura militar e muitas revoltas populares. No centro da ação está uma menina de oito anos, Cayetana, que se divide entre a mãe depressiva, o pai ausente, o padrasto distante, os avós que não a entendem, os professores repressores e uma sociedade em vias de transformação. É impressionante a habilidade da diretora, roteirista e produtora Montero, que consegue oferecer um painel de todo um país em conflito através dos olhos de uma criança sempre sem pieguice, mas com muita habilidade e delicadeza.

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Fábio Assunção, Maria Padilha e Paulo Caldas

E se começamos bem, não demoraria muito para as coisas piorarem. E a maldição do filme brasileiro ruim se abateu até sobre quem costumava ser bom. Paulo Caldas, realizador dos interessantes Baile Perfumado (1997) e Deserto Feliz (2007), se equivoca terrivelmente em seu novo trabalho, País do Desejo. Quarta produção da mostra competitiva nacional a ser exibida, demonstra mais uma vez o quão fraca está a seleção brasileira em 2011. Co-produzido pela atriz Maria Padilha, parte de uma trama confusa com duas ações paralelas: uma pianista renomada que luta contra uma doença crônica nos rins lutando pela sobrevivência e um padre enfrentando um grave problema em sua comunidade: uma menina de doze anos foi estuprada pelo tio e está grávida de gêmeos. Ao fazer um aborto, a criança e sua família são excomungadas pela Igreja, o que provoca a revolta do pároco local (Fábio Assunção, completamente inadequado no papel). Há ainda uma variedade de elementos desnecessários – conflito entre ciência e religião, entre ocidente e oriente, entre arte e consumo – que só servem como distração, afastando ainda mais o público da obra. Como resultados tivemos risos constrangedores a palmas acanhadas no término da sessão. E mesmo assim foi mais do que o merecido.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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