A mostra competitiva de curtas-metragens nacionais foi composta por dezesseis títulos, dispostos na seguinte configuração regional: sete de São Paulo, três do Rio Grande do Sul, três de Minas Gerais, um do Maranhão, um da Bahia e um de Goiás. A ausência de títulos do Rio de Janeiro, de Pernambuco e de Brasília, além de quaisquer outros, foram notadas, principalmente porque a avaliação geral é de que a seleção deste ano foi inferior à conferida em 2012. E muito se diz respeito ao fraco equilíbrio entre os gênero dos trabalhos apresentados: oito dramas, três documentários, duas comédias, uma animação e dois “ensaios poéticos”. A baixa representatividade de documentários e de animações (no Festival de Brasília chega a ter mostras competitivas específicas de cada formato), acima de tudo, foi o ponto mais sentido.
Dentre todas as obras, algumas se destacam com facilidade. O documental Os Filmes Estão Vivos (RS), de Fabiano de Souza e Milton do Prado, talvez seja o mais coeso em suas intenções, provocando imenso prazer estético e intelectual ao espectador mais interessado. O registro dos passeios do crítico de cinema Enéas de Souza por uma Paris de cinéfilos apaixonados é encantador e digno de aplausos, tanto pelo formato adotado como pelo texto atemporal e envolvente.
Histórias muito bem narradas são também A Navalha do Avô (SP), de Pedro Jorge, Acalanto (MA), de Arturo Saboia, e Arapuca (SP), de Hélio Villela Nunes. O primeiro sai na dianteira por contar com o pesquisador, crítico de cinema e roteirista Jean-Claude Bernadet como protagonista, numa trama bastante sensível sobre como um neto adolescente que encontra, através do ato de barbear, uma ligação afetiva com o avô. O segundo tem como maiores méritos, além de uma fotografia admirável e uma direção de arte precisa, duas estupendas interpretações dos protagonistas Luiz Carlos Vasconcelos e Léa Garcia, num conto sobre lembranças de um filho que há muito partiu registradas apenas em uma carta que vai se transformando com o tempo. E por fim há um jogo de gato e rato entre um senhor fazendeiro e uma criança corajosa em volta de uma árvore perdida no campo. A bela fotografia em preto e branco e o desempenho acima da média dos intérpretes colabora com um roteiro preciso e bem amarrado.
Tramas que começam bem mas terminam antes de uma conclusão satisfatória podem ser encontradas em Arremate (BA), de Rodrigo Luna, Colostro (SP), de Cainan Baladez e Fernanda Chicolet, e Os Irmãos Mai (SP), de Thais Fujinaga. O primeiro é uma brincadeira sobre o fim da humanidade a partir de uma ligação de telemarketing, enquanto que o segundo é hábil em construir um clima envolvente e assustador, mas frustra exatamente em como dar um fim original à sua história. Já o paulista sobre dois garotos orientais tem bons elementos técnicos, uma direção de atores segura, mas carece de um argumento mais atraente.
Os documentários Carregadores de Monte Serrat (SP), de Cassio Santos e Julio Lucena, e Simulacrum Praecipiti (SP), de Humberto Bassanelli, partem de temas interessantes, mas se perdem numa realização muito convencional (mais o primeiro do que o segundo). Se Cassio e Julio registram uma curiosa situação de homens que passam seus dias carregando compras dos outros por escadas gigantescas em Santos, Bassanelli mergulha no triste e assustador cenário da Crackolândia, no centro paulistano. Ambos prendem a atenção, mas não permanecem por muito tempo na memória após seu término. Melhor destino, no entanto, do que os frustrantes A Voz do Poço (SP), de Patrícia Black, e Sanã (MG), de Marcos Pimentel, exercícios estéticos que não chegam a se justificar plenamente enquanto realizações audiovisuais. Outro ponto em falso foi a única animação do grupo, Faroeste: Um Autêntico Western (GO), de Wesley Rodrigues, uma alegoria de violência e abuso entre animais que não deve encontrar seu público, afastando as crianças e sem elementos suficientes para cativar os adultos.
Tomou Café e Esperou (RS), de Emiliano Cunha, vai direto ao ponto, chamando atenção pela direção precisa do realizador e pela boa atuação do protagonista Milton Mattos, um homem que aguarda o tempo passar enquanto vive alguns dos piores minutos de sua vida. Pouco Mais de um Mês (MG), de André Novais, foi um dos mais controversos da seleção, não permitindo que ninguém saísse indiferente após sua exibição: se metade aplaudia, outros tantos pareciam desprezá-lo intensamente. No entanto, é dono da cena mais memorável de toda a mostra, quando uma câmera escura é criada a partir das sombras advindas das frestas das cortinas de um quarto ao nascer do dia.
Audaciosos em suas propostas, porém com dificuldades em se posicionarem além da mera brincadeira cinematográfica, o mineiro Merda!, de Gilberto Scarpa, e o gaúcho O Matador de Bagé, de Felipe Iesbick, justificam os interesses despertados. O primeiro parte de textos shakespearianos para construir uma história sobre atores envolvidos num golpe que poderá definir o futuro de todos os envolvidos, enquanto que o segundo busca referências em Godard e em Tarantino, entre tantos outros, para registrar o duelo entre o moderno e o tradicional. Este, aliás, foi o grande vencedor da Mostra Gaúcha de Curtas-Metragens, exibida no primeiro final de semana do 41° Festival de Gramado.
Exibidos diariamente em horário nobre da programação oficial, sempre antes dos longas estrangeiros e nacionais, os curtas selecionados em 2013 apontam para um acomodamento dos atuais realizadores, como se essa nova safra procurasse praticar o exercício cinematográfico de forma competente, sem se arriscar em elementos estéticos ou narrativos. Alguns títulos muito bons salvaram o conjunto como um todo, ainda que a quantidade de decepções tenha sido superior às surpresas positivas. No entanto, o cinema – e os filmes, como um dos melhores concorrentes já afirma no título – segue vivo, mutante e atraente, e é de se esperar com ansiedade pelos próximos passos dos cineastas aqui envolvidos.