Tomou Café e Esperou, de Emiliano Cunha

No último domingo, mesmo dia em que os vencedores do Prêmio Assembleia Legislativa foram revelados, uma nova mostra dos curtas gaúchos em competição nesta 41º edição do Festival de Gramado foi exibida. Marcada pelo ecletismo em temáticas, a aparição de dois novos documentários e de uma animação, a programação pode não ter atingido a mesma qualidade do Programa 01, exibido no sábado, porém revelou algumas pérolas da nova cinematografia gaúcha.

O Boneco de Neve, de Diego Müller, abriu a programação da tarde com tons açucarados para abordar uma temática tão forte quando recorrente, sobre juventude e perda. Produzido em Santa Cruz do Sul, o filme transcorre em bonitos cenários fotografados em cores saturadas e tenta passar alguma seriedade, mas soa desnecessariamente melodramático. Seguido por Contrato de Amor, de Camilo Rodriguez, Leonor Jiménez e Thais Fernandes, mostrou-se instantaneamente esquecível. O segundo curta, curtíssimo em seus três minutos e meio, revela uma curiosa praça na Colômbia onde é possível encomendar os mais inusitados contratos – revelados no título do filme com literalidade.

Férias, de Iuli Gerbase

Férias, dirigido por Iuli Gerbase, causa estranheza e admiração em sua pretensão. Composto por bonitas sequências que revelam uma cuidadosa decupagem, o filme apresenta uma plausível realidade para o turismo no futuro. Em seguida, com Notícias Tuas, Férias ainda ecoava. A produção de Vicente Moreno não disse a que veio e acabou tão logo começou, sem muito alarde, apresentando numa edição inteligente a reação de uma mulher ao receber uma carta. Em outro momento aparentemente comum também transcorre Tomou Café e Esperou, de Emiliano Cunha. O curta porto-alegrense é literal ao apresentar o que seu título pressupõe – até uma inusitada revelação final que remete a Amor (2012), de Michael Haneke.

Da produção universitária de Pelotas, L’Anime, de Diego Urrutia, compila histórias do próprio realizador e de seus amigos numa narrativa animada preguiçosamente, sem muita originalidade. Como um cartum educativo, parece o filme mais deslocado de toda a mostra. Outra produção pelotense, esta mais feliz em suas intenções, As Memórias do Vovô revela a curiosa história de Francisco Santos, cineasta brasileiro que teve seu filme Os Óculos do Vovô (1913) redescoberto recentemente – e apontado como o filme de ficção mais antigo do Brasil. Com direção de Cíntia Langie, o doc conta com depoimentos de Ivonete Pinto, Daniel Furtado, Nadir Bandera e Rodrigo Varela.

Os Filmes Estão Vivos, de Fabiano de Souza e Milton do Prado

Outro documentário que encantou os presentes no Palácio dos Festivais, também com o cinema como tema principal, foi Os Filmes Estão Vivos, dirigido por Fabiano Souza e Milton do Prado. A dupla revelou sua cinefilia e preocupação com a crítica ao voar para Paris ao lado de Éneas de Souza, crítico de cinema que tradicionalmente viaja à cidade-luz com uma programação cinematográfica intensa. Retratado intimamente, o curta de 25 minutos – o mais longo da mostra – guarda algumas sequências de grande comicidade e bonitas cenas de filmes dos mestres Lubitsch e Resnais.

Menos inspirador foi Catalogárgula, que deixou apenas em suas intenções a esperança por um bom curta-metragem. Realizado a partir de uma disciplina de fotografia na Universidade Federal de Pelotas, Lucas Neris e Luan Salce compuseram um filme com frames desconexos e uma narração linear, que reúne os fragmentos das imagens numa história curiosa, quase lynchiana.

Notícias Tuas, de Vicente Moreno

Para encerrar a segunda e última tarde dedicada exclusivamente ao curta-metragismo em Gramado, o festival apresentou A Liga dos Canelas Pretas fora de competição, uma vez que Antônio Carlos Textor venceria um prêmio especial logo mais pelo conjunto de sua obra. A figuração de luxo da obra de um veterano no audiovisual serviu também para evidenciar o amadorismo de algumas poucas produções exibidas anteriormente, assim como a qualidade de tantas outras, que despontam seus realizadores como nomes a se levar em consideração na produção cinematográfica gaúcha contemporânea.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Graduado em Publicidade e Propaganda, coordena a Unidade de Cinema e Vídeo de Caxias do Sul, programa a Sala de Cinema Ulysses Geremia e integra a Comissão de Cinema e Vídeo do Financiarte.
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