De voz grave e postura elegante, o britânico Alan Rickman (1946-2016) se mostrou um dos grandes atores de sua geração, ainda que tenha estreado tardiamente no cinema. Seu primeiro papel nas telonas já se mostrou um sucesso, interpretando o vilão Hans Gruber do hit Duro de Matar (1988). Papeis vilanescos o perseguiram com o passar do tempo, mas o ator sempre colocava um molho diferente em cada um deles, fazendo com que passassem longe do lugar comum. É o caso de alguns dos filmes lembrados neste 5+1, como Robin Hood: O Príncipe dos Ladrões (1991), Sweeney Todd (2005) e a saga Harry Potter, na qual interpretava o sombrio Severo Snape.
Mas não foi apenas nesta seara que Rickman foi bem sucedido. Em comédias como Dogma (1999), Heróis Fora de Órbita (1999), O Guia do Mochileiro das Galáxias (2005) e CBGB (2013), o ator provou que o senso de humor não lhe faltava, apesar da expressão séria que costumava apresentar. Seu talento também pode ser observado em romances como Razão e Sensibilidade (1995), Simplesmente Amor (2003) e Uma Promessa (2013). Todas belas atuações, dignas de nota. Além de ator, Rickman ensaiou passos como diretor, tendo comandado duas produções: Momento de Afeto (1997) e Um Pouco de Caos (2014). E foi este talento que nos deixou neste dia 14 de janeiro de 2016, aos 69 anos de idade. Como tributo, o Papo de Cinema preparou um 5+1 especial, com aquelas produções inesquecíveis e mais uma, que merece ser redescoberta.
Quanto maior o herói, maior deve ser a ameaça que ele enfrenta. E nesta produção, a primeira do que se tornaria uma das cinesséries de maior sucesso do gênero de ação, John McClane (Bruce Willis) tem de enfrentar um adversário à altura no polido e perigoso Hans Gruber (Alan Rickman). Preso sem querer no luxuoso e tecnológico prédio Nakatomi Plaza, o policial vivido por Willis precisa eliminar a ameaça de Gruber, que planeja enriquecer através do conteúdo do cofre do local, enquanto sequestra os funcionários da empresa durante as festas de final de ano. O filme dirigido por John McTiernan revolucionou o gênero ao colocar como protagonista um sujeito longe do perfil musculoso e monossilábico tão em voga à época. E por ter um vilão que também fugia do lugar comum. Gruber, apesar de perigosíssimo, tinha um jeito manso de falar – copiado à exaustão depois disso – muito educado e cordial. A força bruta é usada pelos seus capangas, enquanto ele utiliza das palavras (e da arma de fogo) para fazer com que suas vontades sejam atendidas. Versátil, consegue se fazer passar de vítima – e com sotaque americano – para tentar escapar do inimigo e ganhar vantagem. O desfecho deste embate é memorável. Assim como a performance de Rickman, em sua estreia no cinema. – por Rodrigo de Oliveira
Robin Hood: O Príncipe dos Ladrões (Robin Hood: The Prince of Thieves, 1991)
Nem Kevin Costner de arco e flecha, a música incessante de Bryan Adams ou a história clássica do ladrão que roubava dos ricos para distribuir aos pobres. O que mais chama a atenção nesta divertida produção aventuresca é a composição tresloucada que Alan Rickman dá para o temível xerife de Nottingham, principal rival de Robin Hood. Cartunesco e exagerado, o ator oferece um vilão maluco e extremamente perigoso que gera medo e risadas na plateia. Não que a ação do filme seja de se jogar fora. Apesar de um tanto ingênuo, o longa cumpre seu papel de entreter e alçar (ainda mais) a posição de astro de Costner na época em que o ator estava em seu auge. Mas é Rickman com todo o seu charme britânico, ainda que desta vez bem menos classudo que seu usual, quem rouba a cena, compondo um inimigo que poucos iriam querer ver pela frente (ou pelas costas, já que é traiçoeiro). Mais um ponto alto numa carreira tão cheia deles como foi a do nosso eterno Severo Snape. – por Matheus Bonez
Alan Rickman pode ser conhecido por sua excelência na atuação, seja no cinema ou no teatro. Porém, numa de suas poucas experiências fora dos palcos e por trás das câmeras, o inglês filmou este belo drama estrelado por suas amigas Emma Thompson e Phyllida Law. Elas são mãe e filha que não se entendem há um bom tempo, ainda mais quando Frances (Thompson), recém viúva, resolve ir para a Austrália com o filho adolescente. O garoto, por sinal, está prestes a deixar de ser virgem graças à paixão por uma vizinha. Nesta colcha de retalhos, ainda há espaço para dois garotos que vão matar aula e brincar perto de um mar congelado e duas senhoras que tem como diversão ir a enterros. O cenário onde tudo isto acontece é uma gélida cidade litorânea inglesa, o que serve como metáfora para os sentimentos de seus personagens. O tamanho dos campos desolados e frios parecem refletir o que está guardado dentro de cada uma destas personalidades do filme. Algo que pode explodir a qualquer momento. Roteirizado também por Rickman, é um bom filme para lembrar o talento versátil deste que foi um dos grandes nomes da atuação britânica. – por Matheus Bonez
Harry Potter nunca teve muitos amigos – na verdade, o que descobriu ao entrar no universo de Hogwarts era que possuía muitos admiradores, e um número impressionante, também, de opositores. E entre seus fieis aliados, mais do que o companheiro Ronnie ou a inseparável Hermione, talvez o mais inesperado tenha sido o professor Severo Snape. E se em todos os oito filmes da saga do garoto mágico nos cinemas Snape sempre esteve ao seu lado, ainda que de maneira cada vez mais dissimulada, é justamente neste terceiro capítulo quando tomamos conhecimento de suas origens, do menino problemático que ele também um dia foi e o quanto precisou superar para se ater entre os bons, mesmo quando todas as probabilidades eram contrárias. É neste filme que, enfim, começamos a perceber suas reais intenções, a notar suas fragilidades, e o personagem começa a crescer diante dos milhares de fãs em todo o mundo. Talvez não seja o melhor, e nem o mais emocionante, mas certamente foi aquele que deu início à construção de uma das figuras mais interessantes de toda essa mitologia criada por J. K. Rowling e, claro, pelo imenso talento de seu intérprete, Alan Rickman. – por Robledo Milani
Tim Burton é o grande maestro, Johnny Depp é a cara do filme e Helena Bonham Carter era a esposa do diretor e o par perfeito para o protagonista. Mas de nada adiantaria esse herói atormentado, sua fiel companheira e a visão de um gênio se não fosse somado a esse conjunto o vilão ideal. E esse surgiu pelas mãos e talento do inesquecível Alan Rickman. Com sua impostação de voz característica, misto de nojo, arrogância e antipatia, ele deu vida ao juiz Turpin, o homem responsável pelo calvário vivido por Benjamin Barker, desde ter lhe roubado a esposa e filha como também tê-lo condenado à prisão. Quando Barker retorna, muitos anos depois, já atendendo pelo pseudônimo de Sweeney Todd, sua fúria estará toda direcionada à Turpin, que não só fará pouco caso dela como se encarregará de ser um oponente à altura. Rickman surge como o terceiro vértice de um elenco primoroso, oferecendo as falhas humanas a um personagem condenável, porém absurdamente verossímil, que se encaixa com precisão nessa fábula musical gótica e aterrorizante, mas ainda assim fascinante de ser acompanhada, e muito por seu próprio mérito. – por Robledo Milani
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É verdade que a adaptação de O Guia do Mochileiro das Galáxias para o cinema ficou aquém das expectativas para quem era fã dos escritos de Douglas Adams. Dirigida por Garth Jennings e protagonizada por Martin Freeman (anos antes de seu sucesso na série Sherlock Holmes e na trilogia O Hobbit), a produção cômica diferia bastante do material original, o que pode ter incomodado parte do público. No entanto, uma das unanimidades a respeito do filme é a hilária escalação de Alan Rickman como a voz de Marvin, o Andróide Paranóide. Utilizando seu tom de voz característico e sua cadência de fala pausada, o ator britânico deu vida ao robô irônico, o colocando como o verdadeiro destaque da adaptação. Marvin é uma forma de vida artificial que foi criada com sentimentos humanos. Como é destacado para fazer tarefas que são muito abaixo de suas capacidades, isso o levou a um estado de depressão galopante. O que poderia ser algo triste se transforma em momentos de puro humor com as respostas enviesadas e as epifanias que o personagem solta. Com o sotaque britânico inconfundível de Rickman e seu talento, Marvin só podia roubar a cena mesmo. – por Rodrigo de Oliveira