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5+1 :: Carlos Diegues

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Carlos Diegues não é apenas um grande cineasta brasileiro. Muito mais do que isto, Cacá, como todos o conhecem, é um expoente do Cinema Novo, da dramaturgia e da intelectualidade no país e também fora dele. Ele já foi do júri do Festival de Cannes (1981), passou por outros grandes festivais internacionais com a maioria de seus filmes (Veneza, Berlim, Nova York, Toronto, além do próprio Cannes). Além disso, é oficial da Ordem das Artes e das Letras (l’Ordre des Arts et des Lettres) da República Francesa e membro da Cinemateca Francesa. Aqui no Brasil, recebeu do governo federal o título de Comendador da Ordem de Mérito Cultural e a Medalha da Ordem de Rio Branco, a mais alta do país.

Cacá poderia ter sido apenas mais um advogado do país, visto sua formação em Direito pela PUC-Rio. Para sorte da filmografia brasileira, o gosto pela sétima arte foi além da experimentação e obras como Xica da Silva (1976), Bye Bye Brasil (1979), Um Trem para as Estrelas (1987), entre tantas outras, ganharam as telas do país e do mundo, sempre pinceladas com as constantes críticas sociais do cineasta. Nascido em Maceió no dia 19 de maio de 1940, mas carioca de coração desde os seis anos de idade, o cineasta completa comemora mais um aniversário com uma das mais felizes carreiras cinematográficas do país. Em sua homenagem, a equipe do Papo de Cinema elegeu seus cinco filmes essenciais – e mais um que merece ser redescoberto. Confira!

 

Chuvas de Verão (Brasil, 1978), por Pedro Henrique Gomes
Chuvas de Verão versa sobre o processo inexorável do envelhecimento. A morte está logo ali, mas não há porque ceder ao seu refluxo antes do tempo. O sexo, o amor; a vida segue vibrante. São muitas coisas para pensar o que o melhor filme de Cacá Diegues (com Bye Bye Brasil) coloca na mesa, estende para que nosso olhar – às vezes apressado apenas porque quer descobrir mais do que as coisas podem ou querem revelar – representa na história do cinema nacional. Drama cotidiano, questões de alto impacto pessoal e mesmo de identificação com uma realidade possível; há, de fato, muitas leituras no filme de Cacá Diegues. Filme de ousadias para além da “nudez na terceira idade” que não permite banalidades e visões de um espaço bobo e infantil sobre o velho e sobre as rugas, Chuvas de Verão é a história de Isaura (Miriam Pires) e Afonso (Jofre Soares), um casal como qualquer outro, só que melhor.

 

Bye Bye Brasil (Brasil, 1979), por Rodrigo de Oliveira
A Caravana Rolidei rodava os recantos mais ermos do Brasil levando alegria e entretenimento para a população de baixa renda – isso, claro, se não percebessem a presença das temerosas espinhas de peixe, como a trupe costumava chamar as antenas de televisão. Era importante que os povoados visitados não possuíssem qualquer tipo de diversão eletrônica, visto que o entretenimento pueril que a Caravana proporcionava não era páreo para a hipnótica televisão. Isso é a ponta do iceberg de Bye Bye Brasil, um dos trabalhos mais competentes da longeva carreira de Cacá Diegues. Com um elenco capitaneado por um inspirado José Wilker, uma Betty Faria no alto de sua forma e um muito jovem Fábio Jr., o longa-metragem chegava aos cinemas em uma época em que a Ditadura começava a dar sinais de desgaste, e as alusões ao período começavam a ser feitas também no cinema. Destaque para a magnífica música de Chico Buarque como tema e para a narrativa agridoce que se mantém interessante até os dias de hoje. Exibido durante o Festival de Cannes, onde concorreu a Palma de Ouro, infelizmente sem vencer prêmios.

 

Dias Melhores Virão (Brasil, 1990), por Robledo Milani
Cacá Diegues talvez seja um dos cineastas mais preocupados com a mulher no cinema nacional. Filmes como Xica da Silva (1976) e Tieta do Agreste (1996) comprovam essa visão. E é bem provável que Dias Melhores Virão seja o mais feminino de sua obra – ainda que, também, o mais subestimado. Isso se deve pela época e forma como foi lançado: estávamos em 1990, o presidente Collor havia recém acabado com nossos sonhos e ninguém parecia preocupado com os sobreviventes deste trauma. Para contornar a situação, Diegues exibiu o filme primeiro na televisão – alcançando um público recorde – para somente depois passá-lo nos cinemas. E a aposta cabia, pois temos aqui dois ícones brasileiros – Marília Pêra e Rita Lee – como protagonistas, vivendo uma história que qualquer cidadão brasileiro era capaz de se identificar, ainda mais naquelas anos: a pobre anônima (no caso, uma dubladora) que sonha em ser estrela internacional (no caso, a atriz hollywoodiana que ela própria dubla no trabalho diário). Cacá revela um drama atual com bom humor e grande habilidade, tanto na condução da história quanto no trato com os atores, indicando, portanto, sua maior qualidade: uma perfeita noção do cinema enquanto elemento de transformação social, ainda que nunca deixe de ser um ótimo entretenimento.

 

Tieta do Agreste (Brasil, 1996), por Renato Cabral
Lançado em 1996, Tieta do Agreste era um projeto antigo de Sônia Braga. A atriz vinha desde 1988 cogitando a idéia de interpretar a personagem de Jorge Amado nas telas do cinema. Na época, Sônia namorava o ator Robert Redford, que estava preparado para investir na produção. Mas o projeto acabou engavetado depois da novela inspirada no romance de Amado ser lançada em 1989 pela Rede Globo. Com o passar dos anos o projeto foi retomado e Diegues acabou na direção. Considerado pelo próprio diretor como o seu melhor filme, conforme dito na época do lançamento da produção nos cinemas. Ele ainda complementava comentando que o filme possui muito em comum com o tipo de drama das obras de Amado, que se focam mais nos personagens do que na trama. Tieta é aquele longa que poderia ser chamado de sexy, quente e tropical como boa parte da obra do escritor baiano. Como dito por Cacá Diegues, é um filme espetáculo. Contando a trajetória de uma das maiores personagens da literatura nacional, sem dúvida, essa adaptação para as telas é subestimada pelo público. Vale lembrar que o filme permanece inédito em DVD no país, apesar de já ter sido lançado no formato em outros países.

 

Orfeu (Brasil, 1999), por Matheus Bonez
O Orfeu de Cacá Diegues não é inspirado apenas pelo mito grego do personagem título e sua paixão por Eurídice. O roteiro do filme teve como base uma peça do poeta Vinicius de Moraes, desta vez ambientada numa favela do Rio de Janeiro. A despeito da bela fotografia, da trilha sonora intensa e de atuações inspiradas de Toni Garrido como Orfeu, Patrícia França como seu grande amor e, especialmente, de Murilo Benício como seu rival, o chefe do tráfico Lucinho, o longa de Cacá Diegues utiliza da trágica história de amor para tratar dos problemas sociais e políticos nacionais, o que é uma constante em sua cinematografia, seja qual gênero lhe inspire a cada obra. Pré-selecionado para o Oscar e vencedor de diversos outros prêmios na época, Orfeu é um retrato primoroso do Brasil atual, de suas mazelas, suas injustiças. Pode parecer arbitrário falar, mas será que teria existido Cidade de Deus (2002) se não fosse este mito no cinema nacional? Uma obra tão singular que com certeza abriu portas para um cinema que parecia esquecido no país (mesmo que um ano antes Central do Brasil, 1998, já tratasse de outra visão crua do país). Quem (re)descobrir os encantos do longa com certeza não vai se arrepender.

 

+ 1

Cinco Vezes Favela (Brasil, 1962), por Willian Silveira
Cinco vezes favela é mais um projeto do que um filme. Os cinco curta-metragens que o compõem foram produzidos pelo Centro Popular de Cultura da UNE do Rio de Janeiro em resposta às perguntas centrais do meio cultural dos anos 60: o que deve dizer o cinema brasileiro? É possível fazer cinema sem dinheiro? Se sim, que cinema é esse? Cinco vezes não tem o seu lugar na história pela qualidade, mas pela importância. Apesar do emprego de técnicas precárias, revelou Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirzman e Carlos Diegues, três diretores que se tornaram expoentes do cinema nacional. Ancorado no discurso de uma arte socialmente válida, moldou uma perspectiva própria de enxergar e fazer cinema no Brasil, com uma divisão interna subjetiva entre filme feito para brasileiro e para estrangeiros. Coroou a temática que conquistou o mundo e despertou o preconceito da classe média do próprio país, ainda que, ironicamente, fosse feito por seus pares. Por fazer parte da genealogia do pensamento brasileiro, Cinco vezes tem o seu lugar por mérito enquanto reflexão sobre o cinema nacional; um cinema que hoje se pergunta: cinema para quem?

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