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5+1 :: Ettore Scola

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Difícil resumir a importância de Ettore Scola para o cinema mundial. Nascido no dia 10 de maio de 1931 em Trevico, interior da Itália, foi ainda adolescente para Roma estudar direito e trabalhar como jornalista. Nestas primeiras atividades, conheceu um jovem Federico Fellini (já um nome que despontava) e com ele travou uma amizade que durou por toda a vida. Dos primeiros trabalhos, no início dos anos 1950, até a consagração nas décadas seguintes, Scola teve parceiros constantes, como os astros Vittorio Gassman e Marcello Mastroianni e as atrizes Stefania Sandrelli e Fanny Ardant, por exemplo. Diretor de três longas indicados ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, foi premiado nos festivais de Berlim, Cannes e Veneza – os três mais importantes de todo o mundo – além de ter ganho 8 David (o Oscar da Itália) e 3 César (o Oscar da França), entre os mais de 50 troféus e reconhecimentos que recebeu em todo o mundo – inclusive no Brasil, onde foi homenageado na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2013. Ao nos deixar neste dia 19 de janeiro de 2016, aos 84 anos, Scola nos mostrou mais uma vez que mestres como ele não surgem a todo instante. E aqui deixamos registrada a nossa singela homenagem, apontando alguns dos seus melhores trabalhos, além de resgatar um que não pode ser esquecido. Confira!

 

Nós Que Nos Amávamos Tanto (C’eravamo tanto Amati, 1974)
Gianni, Nicola e Antonio se tornam amigos em plena Segunda Guerra Mundial, lutando um ao lado do outro contra os nazistas. Para eles, no entanto, o conflito acabou em seguida, mas os laços de amizade que os ligam durariam por toda a existência deles, permanecendo eles juntos ou não. Muito disso, no entanto, vem da ligação que os três estabelecem pela bela Luciana (que acaba namorando dois deles) e pela relação que vão estabelecendo em suas vidas profissionais, afetivas e sociais. Um acaba sozinho, outro se revela um eterno sonhador, o terceiro tem vergonha do pouco que o destino lhe reservou, mas o que possuem está além da matéria e do instante, confirmando-se como um emocionante retrato de amor verdadeiro, fraternal e atemporal. Reflexo de uma Itália em constante e turbulentas transformações, este é um filme de aspirações épicas focadas em sentimentos bastante íntimos, donos de momentos de pura inspiração e magia – afinal, quem nunca se imaginou cruzando com Marcello Mastroianni e Anita Ekberg em plena Fontana Di Trevi, e de preferência sob a bênção de Federico Fellini? Scola cria a fantasia fundamental, tendo para isso apenas a realidade, e nada mais. – por Robledo Milani

 

Feios, Sujos e Malvados (Brutti, Sporchi e Cattivi, 1976)
Ettore Scola desafia convenções nesta obra-prima lançada em 1976. O olhar que lança à família de Giacinto Mazzatella (Nino Manfredi) é afetuoso, mas nem um pouco paternalista. Estamos no subúrbio de Roma, longe da agitação festiva e dos grandes eventos. O casebre onde se amontoam a esposa, os dez filhos e outros parentes de Giacinto abriga toda sorte de tipos exagerados, que apresentam ações e sentimentos muitas vezes execráveis. O patriarca avaro, mesmo em meio à pobreza quase extrema, guarda um dinheiro considerável, o que o torna alvo da ganância dos seus, que então planejam eliminá-lo para apoderar-se da quantia. Scola se vale da caricatura desbragada para mostrar uma Itália profunda, cujas contradições sociais e suas consequências foram poucas vezes contempladas de tal maneira pelo cinema. A família de Giacinto – mesmo delineada entre a farsa e o drama – é exposta ao espectador como uma fatia da realidade italiana, uma célula em que a sordidez e os comportamentos condenáveis são praticamente naturalizados com o tempo, vistos por todos ali como efeitos colaterais inevitáveis de um cotidiano moldado pela precariedade na qual foram criados. Certamente um dos grandes filmes do diretor. – por Marcelo Müller

 

Um Dia Muito Especial (Una Giornata Particolare, 1977)
Você pode se concentrar na atuação magistral de Marcello Mastroianni – indicado ao Oscar, assim como o próprio filme, que concorreu na categoria de Melhor Longa Estrangeiro – que compõe com delicadeza, respeito e segurança o perfil de uma minoria muito afetada, porém por tantas vezes esquecida: os homossexuais. Ou apontar para a presença calorosa de Sophia Loren, que ao aparecer como uma mãe de família alheia ao precipício ao qual ela e seu colega de cena se aproximam cria com competência uma ponte de identificação com o grande público. Mas isso de nada adiantaria se não fosse a genialidade do diretor e roteirista Ettore Scola em traçar um painel sobre o fascismo na Itália momentos antes da Segunda Guerra Mundial, tendo como foco dois estranhos abandonados em um imenso condomínio popular do subúrbio. Foi seu olhar delicado e incisivo que possibilitou que esta singela história transcendesse o ideário da ficção e se tornasse a cada dia que passa mais atual e necessária. E se o filme surpreende, está na condução de um grande mestre o talento necessário para fazer deste pequeno clássico uma obra inesquecível. – por Robledo Milani

 

O Baile (Le Bal, 1983)
É no salão de baile que Ettore Scola ambienta a história francesa compreendida entre os anos 1930 e 1980. Sem qualquer palavra, esta comédia musical dá conta de mostrar os acontecimentos que impactaram o país, para isso fazendo uso apenas das interações entre os pares, dos olhares e movimentos que se encarregam de significar. A passagem do tempo é medida pela transformação dos cenários, o câmbio dos figurinos e mesmo pela abordagem de determinados tipos, cujas construções são bastante marcadas, justamente para que tenhamos uma rápida identificação do papel que desempenham. Pela pista de dança desfilam abusadores, tímidos, autoritários, esperançosas, sonhadoras, entre outros personagens que acabam deflagrando a situação político-social da França em diversos períodos. Bem-humorada, a encenação utiliza uma série de gags para trazer leveza à narrativa, embora Scola não se furte de abordar criticamente episódios controversos, tais como a ocupação nazista. Os corpos se encontram ao som das músicas que ajudam a retratar as épocas, se entrelaçam para formar os panoramas que, uma vez encadeados, dão conta de 50 anos de agitações num dos países mais importantes da Europa. Prescindindo da palavra, Scola criou um filme singular, em que quase tudo reside na ação. – por Marcelo Müller

 

Concorrência Desleal (Concorrenza Sleale, 2001)
Ettore Scola tinha o dom de fazer uma grande discussão social a partir de pequenos cenários com dramas corriqueiros do dia a dia. Não foi diferente com este título. Ambientado às vésperas da Segunda Guerra Mundial, em 1938, com o fascismo cada vez mais presente, presenciamos a disputa comercial e divertida entre o alfaiate Umberto (Diego Abantantuono) e o lojista judeu Leone (Sergio Castellito). Os dois, donos de estabelecimentos vizinhos, se envolvem em trapaças para conseguir mais clientes, o que gera situações engraçadas e totalmente antiéticas. Pois após a briga parar na delegacia, o longa toma outra forma. Mesmo com o “poder” de entregar o rival de origem judaica, Umberto prefere ficar quieto, pois começa a admirar a postura da família do concorrente, sempre unida no trabalho e em casa. Porém, como manter o segredo e não deixar seu próprio negócio e valores em desgraça? O debate que começa bem humorado toma ares mais dramáticos, com Scola mostrando porque é um dos grandes nomes do cinema italiano, nunca deixando o ritmo de seu filme enfraquecer e, muito menos, a polêmica ficar maior que a humanidade de seus personagens. – por Matheus Bonez

 

+1

 

O Jantar (La Cena, 1998)
Sem ambientações fora de época, neste título Ettore Scola mostra que consegue atingir os mais elevados padrões mesmo quando o cenário é único. No caso, um restaurante, onde vários dramas pessoais afloram nas diversas mesas enquanto a ceia é servida. Há um clima de pessimismo no ar, mas sem nunca perder o bom humor. Neste emaranhado de histórias, há espaço para jogos sexuais entre um professor universitário e sua aluna, brigas entre mãe e filha, japoneses que registram cada momento com suas câmeras fotográficas ensandecidas e, é claro, as diferenças de classe. Não à toa exista tanta disparidade entre o salão e a cozinha nesta produção do cineasta italiano. Mesmo quando ele não quer falar sobre política, não tem como fugir disso. Além de tudo, reúne um elenco dos sonhos com nomes como Fanny Ardant, Vittorio Gassman e Giancarlo Giannini. Uma obra menor na filmografia de Scola por sua simplicidade, mas não menos tocante naquilo que sempre regeu o cineasta: sua predileção pela forma como homens e mulheres pensam. – por Matheus Bonez

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