Nascido em Guadalajara, Gael García Bernal tem o talento no DNA: ele é filho de Patricia Bernal, atriz e modelo, e de José Ángel Garcia, também intérprete, além de diretor. O padrasto é o diretor de fotografia Sergio Yazbek. Foi graças à influência de sua família que o mexicano começou cedo na carreira, participando de telenovelas entre o final dos anos 1980 e o início dos 1990, até estrelar o curta-metragem De tripas, corazón (1996), indicado ao Oscar na categoria de ficção do gênero. Aos 17 anos viajou a Londres, onde estudou na Central School of Speech and Drama. Foi o primeiro mexicano a ser aceito na renomada escola de atores. Quando voltou, fez sua estreia nas telonas com Amores Brutos (2000), já garantindo o status de ator em ascensão. De lá pra cá, já foram 24 prêmios e outras 21 indicações, inclusive ao Bafta. No dia 30 de novembro, o galã completa mais um aniversário e, para comemorar, a equipe do Papo de Cinema elege seus cinco melhores momentos na tela grande – e mais aquele que merece uma menção honrosa. Confira!
Capítulo inicial da “trilogia” de Alejandro González Iñarritu, que seguiria com 21 Gramas (2003) e Babel (2006), este é daqueles filmes quase indigestos, tamanha sua violência visual. Porém, ela atinge a psique dos personagens e do espectador de forma ainda mais profunda ao conectar as três histórias divergentes com um trágico acidente e cachorros, os perros nem tão metafóricos do título original. Afinal, quem são os verdadeiros animais na atual sociedade? Iñarritu faz este questionamento ao colocar em evidência a rinha de cães, que pode parecer brutal, mas tem outro significado: o de humanizar seus personagens, todos em busca de alguma forma de redenção. Neste interim, Gael García Bernal surge como um dos protagonistas, Octávio, jovem desempregado que mora em uma região suburbana com a família, inclusive o irmão e a cunhada. Com o propósito de fugir com esta última, decide inscrever seu cachorro numa destas rinhas clandestinas já citadas. Ainda em início de carreira, Bernal entrega uma performance muito acima da média, amadurecendo seu Octávio ao longo da trama, tão fragmentada quanto o próprio personagem. Alguém perdido em emoções e conflitos internos que vão muito além da paixão pela cunhada. Algo que o nosso homenageado entrega sob várias camadas. – por Matheus Bonez
Desde este seu longa-metragem de 2001 que Alfonso Cuarón já demonstrava um interesse em explorar os planos sequências que embasbacariam as audiências de Filhos da Esperança (2006) e Gravidade (2013). Aqui, sem os grandes orçamentos que possuiria então, consegue a proeza de realizar longos takes de forma prática e com poucas trucagens. Esta abordagem permite um maior envolvimento do espectador com o filme e seus personagens, prolongando a estadia dos atores em suas peles e nossa convivência com alguns de seus momentos mais pessoais. E é admirável que o roteiro, escrito pelo próprio cineasta ao lado de seu irmão, trate dos temas mais escusos sem jamais deixar de soar delicado e sensível, afinal, foca-se na linha de pensamento de dois adolescentes, Julio (Gael García Bernal) e Tenoch (Diego Luna), durante uma importante viagem de autodescoberta. Essencial para o projeto como um dos protagonistas, Bernal não só cria um vínculo tátil de amizade entre ele e Luna, como sente-se à vontade para, ainda jovem, gravar diversas cenas nu. Afinal, o longa é sobre o sexo na vida de jovem também, e é belo que consiga discutir os temas referentes a esse tópico tão naturalmente e sem preconceitos, visuais ou temáticos. – por Yuri Correa
Acompanhando os passos de Ernesto Guevara de la Serna e seu amigo Alberto Granado em sua longa viagem pela América do Sul iniciada em 1952, o diretor Walter Salles realiza o que poderíamos chamar de um filme de origem sobre um importante líder revolucionário. Adotando uma estrutura típica de road movie (algo recorrente em sua carreira, vide Central do Brasil, 1998, e Na Estrada, 2012), Salles cria uma narrativa bastante fluída, que se aprofunda bem em aspectos que ajudariam a montar o caráter de Che Guevara e vieram a fazer dele uma figura tão notável. Nisso, o filme tem no talentosíssimo Gael García Bernal um de seus pontos altos, já que o ator não só encarna o personagem com um carisma essencial e arrebatador, mas também traz certa ingenuidade para ele inicialmente, tratando seu amadurecimento ao longo da narrativa com uma segurança admirável. Vendo o filme, não é difícil constatar por que ele é um dos atores latinos mais conhecidos internacionalmente. – por Thomás Boeira
Um dos maiores astros latinos da virada do século XXI com o diretor espanhol mais consagrado de todos os tempos: mais cedo ou mais tarde os dois, inevitavelmente, teriam que se encontrar. E foi com esse projeto que Pedro Almodóvar, finalmente, contou com o talento e o carisma de Gael Garcia Bernal como protagonista de um de seus aclamados filmes. Ainda que a parceria dos dois não tenha sido exatamente como se esperava – ambos afirmam, categoricamente, que não esperam trabalhar juntos – esta é uma obra que merece constar em destaque na filmografia de qualquer um dos dois. Se por Almodóvar tem-se o fato deste ter sido um dos seus longas mais autobiográficos e menos femininos, Gael merece todos os aplausos pelo impressionante nível de entrega ao qual se envolveu com esta história no papel de Ángel, que era Juan e vira Zahara, de acordo com cada momento do desenrolar da trama. Na pele de um travesti que sonha em ser estrela de cinema ao mesmo tempo em que deseja solucionar um polêmico episódio do seu passado, o ator constrói um personagem único, fazendo deste, indiscutivelmente, um dos pontos altos da sua trajetória artística. Afinal, quando gênios se encontram não se pode esperar nada menos do que boas explosões! – por Robledo Milani
Um dos trabalhos imperdíveis de Gael Garcia Bernal, No recria muito bem o período temerário pelo qual viveram os cidadãos chilenos durante os duradouros anos de chumbo da ditadura Pinochet. Pressionado pela política externa a deixar o poder, o governo do general resolveu perguntar ao povo se deveria sair ou ficar. Acreditando que o medo faria com que as pessoas votassem pelo “sim”, a situação chilena não percebeu que estava cavando sua própria cova. Um dos pontos que fez ressurgir a coragem do povo chileno foi a campanha do “não”, que se afastou ao máximo dos pontos negativos do governo Pinochet e tentou se agarrar na alegria que surgiria pós-ditadura. Pegando a cartilha básica da publicidade, René Saveedra (Bernal) transformou o que seria uma batalha política inglória em um sucesso estrondoso. Mas não sem antes sofrer ameaças e ter sua vida virada ao avesso pela sua coragem. Gael García Bernal constrói bem os conflitos do personagem, que sabe que está entrando em uma possível barca furada e perigosa, tendo de proteger seu filho pequeno e sempre pensando na ex-esposa. Seu personagem tem ideias precisas sobre o que é necessário para vender um produto – mesmo que este produto seja o final da ditadura de Pinochet, e luta pelo que acredita de forma quase utópica. – por Rodrigo de Oliveira
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Este é o filme mais acessível do sueco Lukas Moodysson, nem por isso menos recheado de conteúdo e observações importantes sobre pessoas e a sociedade que elas formam. Um casal em Nova York, a babá filipina, a prostituta tailandesa, todos, em suas particulares angústias, parecem refletir um mal-estar generalizado, o infortúnio que atinge indiscriminadamente sem diferenciar vítimas por sexo, etnia ou mesmo condição social. O gênio dos jogos, interpretado por Gael Garcia Bernal, vai à Tailândia fechar negócio milionário, acaba sufocado pelo tédio e a saudade de casa, afogando sua dor de existir numa praia erma. Ele surge como retrato de uma geração, estreitamente ligado aos ganhos virtuais, de jeitão quase infantilizado, e logo ciente de um vazio até então meio camuflado pela vida feita de pequenas rotinas. Enquanto isso, sua esposa médica é pressionada na Big Apple pelo sentimento de perder algo na relação com a filha mais apegada à babá. O roteiro aglutina histórias cuja argamassa é a dificuldade de vencer barreiras, sejam elas emocionais, sociais, afetivas ou de qualquer outra natureza. Um dos menos celebrados, porém, dos mais significativos trabalhos do mexicano Gael Garcia Bernal. – por Marcelo Müller