Sid Vicious, Rosencrantz, Lee Harvey Oswald, Conde Drácula, Ludwig van Beethoven, Albert Milo, Dr. Smith, Pôncio Pilatos, Sirius Black, Comissário Gordon, George Smiley. A lista de personalidades marcantes, tanto da vida real quanto da ficção, que Gary Oldman já incorporou na tela grande é de causar inveja em qualquer um. Surpreendentemente, ele é, no entanto, um dos mais subestimados astros de Hollywood. Com uma carreira que já passou das três décadas em atividade e mais de 80 personagens diferentes no cinema e na televisão, ele possui apenas uma indicação ao Oscar, uma ao Emmy, duas ao Bafta – e também duas vitórias, porém essas foram como cineasta e roteirista do seu último longa como realizador, Violento e Profano (1997) – e duas ao Independent Spirit Award. Nunca concorreu a um Globo de Ouro ou a um Critics Choice, ainda que tenha uma nomeação às afamadas Framboesas de Ouro. Um descuido vergonhoso da indústria e da crítica, que parece não lhe dar crédito suficiente pelos diversos e geniais tipos que já incorporou em cena. Mas aqui no Papo de Cinema não há essa vista grossa, e em homenagem ao aniversariante deste 21 de Março, confira aqui uma seleção dos seus cinco papeis imprescindíveis, além de mais um que também marcou época!
Um dos melhores atores de seu tempo, Gary Oldman estreou no drama Remembrance (1982), mas se tornou conhecido interpretando Sid Vicious, baixista dos Sex Pistols, nessa cinebiografia de Alex Cox. Mesmo sem gostar do roteiro sobre o explosivo namoro de Sid e Nancy Spungen (Chloe Webb), e mesmo sem curtir punk rock, Oldman conseguiu traduzir em sua atuação magnética o descontentamento, a raiva e a fragilidade que moveram o baixista (sic). Em um momento em que o punk se coloca contra a tradição e o conservadorismo burguês, expressando em anarquia musical e comportamental o deslocamento de toda uma geração não-integrada (e que não queria se integrar), Sid passa a ser visto como ícone autodestrutivo de segmentos sociais alheios à sociedade estabelecida. Oldman observa essas movimentações, inclusive deixando transparecer o pouco interesse de Sid nesta condição de destaque, estando o personagem mais preocupado com o namoro infernal com Nancy e com a próxima dose de heroína. Se a vida de Sid foi apenas uma faísca de 21 anos, Oldman capta com facilidade seus momentos mais intensos. – por Danilo Fantinel
Gary Oldman protagoniza este conto de amor trágico, interpretando o senhor absoluto dos vampiros, da juventude à decrepitude. Primorosa a cena em que seu personagem renega a Deus após deparar-se com a amada morta, exemplo da força de seu trabalho pungente e rico em nuances. A armadura em forma de músculos tem duplo significado, pois, ao passo em que aterroriza pelo visual, é uma metáfora à exposição de Conde Drácula às brutalidades do mundo. Simbolicamente sem pele, depois literalmente sem alma, ele vaga séculos até encontrar novamente sua amada. A sensualidade anda de mãos dadas com o perigo, a sedução é a arma do demônio para angariar soldados ao seu exército. A imagem barroca, a trilha sonora, a progressão por cenários claramente construídos em estúdio, tudo remete à abordagem clássica dos contos de terror pelo cinema. O drama maior é o do próprio Drácula, um homem que devota vida e morte ao amor que perdeu para as traquinagens do desconhecido. A criatura repugnante se transmuta em nobre para reaver sua paixão, para reconciliar-se consigo mesmo. Os outros personagens são meras peças, agentes que ajudam a história a progredir até o desfecho doloroso. Antes de ser um demônio, Drácula é vítima da desgraça nessa obra-prima de Francis Ford Coppola. – por Marcelo Müller
Apesar dos vilões terem marcado a carreira de Gary Oldman nos anos 1990, o ator continuou reservando espaço para outros tipos, como o anti-herói trágico e de moral duvidosa deste longa policial cult dirigido pelo húngaro Peter Medak. Na trama, Oldman interpreta o corrupto detetive Jack Grimaldi, que sob a proteção de seu distintivo realiza trabalhos para o chefão da máfia local, Don Falcone (Roy Scheider). Tudo corre bem para o nosso anti-herói, que utiliza o dinheiro sujo para sustentar a esposa Natalie (Annabella Sciorra) e a jovem amante Sheri (Juliette Lewis), até o dia em que recebe a missão de eliminar Mona (Lena Olin), uma assassina de aluguel russa que transforma sua vida em um verdadeiro inferno. Medak realiza uma versão estilizada dos filmes noir, visualmente arrojada e repleta de violência, na qual Oldman compõe um personagem que consegue ser detestável e digno de pena ao mesmo tempo. Dentro da espiral de infortúnios de Grimaldi, o ator é capaz de gerar empatia com o público, brilhando também nos momentos de tensão sexual com a ótima femme fatale de Olin e apresentando seus característicos rompantes de insanidade, como na antológica cena do embate entre os dois protagonistas dentro de um carro em movimento. – por Leonardo Ribeiro
Gary Oldman é um ator que tem certo apreço em dar toques mais intensos a seus papeis, muitas vezes beirando o overacting, algo que certamente ajudou a torna-lo um intérprete interessante de se ver na tela. Neste drama policial de Luc Besson, Oldman ganhou um papel que foi um prato cheio para suas habilidades. Como o vilão Norman Stanfield, policial corrupto que provoca o desejo de vingança da jovem Mathilda (Natalie Portman) e a faz querer aprender os métodos do assassino profissional Léon (Jean Reno), nosso homenageado surge com uma presença em cena sempre ameaçadora e cuja força pode se ver, principalmente, nos momentos mais explosivos do personagem (a cena em que ele grita “Everyone” é exemplo clássico disso). Não à toa, Stanfield parece uma figura insana quando não está mostrando sua frieza. Talvez não seja uma atuação que devesse ser indicada a todos os prêmios possíveis, mas ainda assim não deixa de ser um daqueles trabalhos que gostamos de ver Oldman fazer, permitindo-o que exiba sua admirável persona cinematográfica em um longa que marcou sua bela carreira. – por Thomas Boeira
Gary Oldman fez de tudo um pouco no cinema. Já foi bruxo, comissário, roqueiro desvairado, vampiro, rastafári e até anão. Apesar disso, nunca havia conseguido uma indicação ao Oscar. A situação mudou com este trabalho, adaptado da obra do mestre John Le Carré, dirigido por Tomas Alfredson. No filme, Oldman tem a oportunidade de mostrar seu talento de forma bastante sutil, construindo um personagem que praticamente vive nas sombras, uma exigência de seu trabalho secreto. Calado, compenetrado, totalmente low profile, o protagonista deste longa, George Smiley, é o anti-James Bond. A história se passa durante a Guerra Fria, quando a suspeita de um agente duplo na CIA coloca um grande ponto de interrogação dentro da Agência. Embora tenha um elenco de fazer inveja, o filme é de Gary Oldman. Sem precisar dizer uma palavra nos primeiros quinze minutos, o ator constrói uma figura sóbria, mas que carrega um peso muito grande dentro de si. Este é um tipo de trabalho a ser degustado. Deve ser acompanhado como a uma partida de xadrez. As reviravoltas do roteiro não são as mais surpreendentes, é verdade. Mas a graça não está no xeque-mate e sim nos movimentos que fizeram o jogador chegar ao final em vantagem. – por Rodrigo de Oliveira
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A terceira aventura de Harry Potter é uma peça importantíssima em sua jornada, quando Hogwarts deixa de ser o lugar mágico repleto de mistérios deliciosos e se torna um labirinto sombrio que pode guardar enorme perigo na virada do próximo corredor. Afinal, é quando o protagonista e seus amigos enfrentam os primeiros sinais da adolescência, e por isso ninguém melhor para conduzir essa sequência do que Alfonso Cuáron, que mergulha o castelo em uma atmosfera que, sim, é repleta de vida e diversidade, mas também de melancolia e lembrança. Uma delas, aliás, vem pessoalmente parar ali, uma figura alquebrada e de importância ímpar para a trama criada por J.K. Rowling: Sirius Black. Com o nome da estrela mais brilhante do céu, e segundo seu sobrenome, o único ponto de luz e bondade em toda a escuridão da maléfica família “Black”, o personagem ganha o rosto de Gary Oldman, que preenche o personagem com a correta falta de sanidade, sem jamais esquecer de construí-lo também com um tom de mágoa que indica a existência de uma consciência e de um bom coração ferido. Talvez a pessoa mais trágica de toda a saga, Sirius merecia um ator com a competência de Oldman para encarná-lo. – por Yuri Correa