John Uhler Lemmon III – ou apenas Jack Lemmon – foi um dos maiores astros de Hollywood. Com quase uma centena de créditos, ficou em cartaz por mais de cinco décadas, atraindo o respeito e a admiração de fãs e cinéfilos de todo o mundo. Vencedor de dois Oscars, ganhou o primeiro ainda no início de carreira, como coadjuvante de Henry Fonda e James Cagney em Mister Roberts (1955). Para receber o segundo esperou quase vinte anos, mas no total acumulou a impressionante marca de oito indicações ao prêmio máximo do cinema mundial, além de 6 Globos de Ouro, 2 Emmys, 3 Baftas, um National Board of Review e um Screen Actors Guild Award. Além disso, foi um dos quatro únicos intérpretes – os outros são Sean Penn, Julianne Moore e Juliette Binoche – a conseguir, até hoje, ser premiado nos três maiores festivais de cinema, tendo ganho o Leão de Ouro em Veneza por O Sucesso a Qualquer Preço (1992), o Urso de Ouro em Berlim por Tributo (1980) e a Palma de Ouro, em Cannes, em duas ocasiões, por Síndrome da China (1979) e por Desaparecido: Um Grande Mistério (1982). Feitos incríveis que apenas ressaltam os méritos desse astro com rosto de homem comum, porém dono de um talento extraordinário. No dia no seu nascimento – 08 de fevereiro de 1925 – a equipe do Papo de Cinema se reuniu para apontar seus cinco melhores trabalhos, além de indicar mais um que não pode ser esquecido. Confira!
Quanto Mais Quente Melhor (Some Like it Hot, 1959)
O papel mais explosivo da carreira da diva Marilyn Monroe. O mestre Billy Wilder em plena forma. O galã Tony Curtis no auge do charme e carisma. E, no entanto, mesmo entre tantos nomes de inegável talento, quem entregou nessa comédia apontada como a melhor de todos os tempos pelo American Film Institute a performance mais elaborada e notável? Jack Lemmon, é claro. Como o músico Jerry ele se transforma na hilária Daphne para entrar disfarçado em uma banda de garotas, liderada pela voluptuosa Sugar Kane (Monroe). Enquanto o colega (Curtis, se dividindo entre o malandro Joe e a recatada Josephine) tenta conquistá-la a todo custo, cabe a Lemmon ter que se livrar dos problemas que surgem no caminho dos dois, seja a máfia que os persegue após terem testemunhado uma matança em Chicago ou driblar as investidas do milionário Osgood Fielding III (Joe E. Brown), que se encantou pelo seu requebrado feminino. Vencedor do Bafta e do Globo de Ouro, o ator foi também indicado ao Oscar, mas acabou perdendo a estatueta dourada para o Ben-Hur de Charlton Heston. Afinal, como Lemmon sabia melhor que qualquer um, “ninguém é perfeito”! – por Robledo Milani
Se Meu Apartamento Falasse (The Apartament, 1960)
Jack Lemmon atinge neste filme o ponto mais alto da parceria com Billy Wilder, interpretando um homem que empresta seu apartamento para os chefes e suas respectivas amantes. Mesmo excepcional também em Quanto Mais Quente Melhor (1959) e A Primeira Página (1974), por exemplo, Lemmon aqui tem a possibilidade de mostrar todas nuances de seu trabalho, ao oscilar entre o cômico e o trágico com muita naturalidade. O ator é capaz de, numa mesma cena, olhar com ternura para Shirley MacLaine, que vive a garota por quem seu personagem se apaixona, e logo depois fazê-la rir com alguma tirada engraçada. Mirando promoções no emprego, C.C. Baxter carrega nas costas a má fama de farrista entre os vizinhos, que acham ser provocado por ele o barulho das festas na madrugada. Mas o amor pela menina de cabelos curtos, a ascensorista maltratada justamente pelo patrão que com ela tem um caso, faz Baxter dar um basta em tudo aquilo, não sem abdicar do prestígio alcançado pela via do escambo. Jack Lemmon confere a Baxter carisma, fragilidade e, posteriormente, coragem para chacoalhar as coisas, atributos que nos fazem criar uma empatia natural e irrestrita por ele. – por Marcelo Müller
Vício Maldito (Days of Wine and Roses, 1962)
Billy Wilder já havia tocado no tema do alcoolismo de forma brilhante duas décadas antes com Farrapo Humano (1945). Porém, se naquele filme o foco era a destruição do protagonista provocada pela bebida, aqui o que temos é a decadência de um casal pelo mesmo problema. Joe (Jack Lemmon) e Kirsten (Lee Remick) se apaixonam no ambiente de trabalho e logo se casam, vivendo dias felizes. Mas a pressão do ramo publicitário faz com que o marido cada vez comece a beber mais e, o pior: acaba viciando a própria esposa, que se afunda ainda mais na dependência, causando brigas que podem separar os dois – que já tem uma criança pequena. Se Remick dá um show ao mostrar as nuances de sua personagem indo do céu ao inferno, algo que perdura boa parte do filme, é Lemmon que revela um surpreendente equilíbrio ao conseguir, mesmo que o espectador possa acreditar que seja de forma temporária, estabelecer limites para si mesmo, às garrafas cheias e àquela relação que está se deteriorando. Uma performance humana, sofrida, mas nunca fora da realidade, que faz compreender porque este foi um dos grandes de Hollywood até sua morte. – por Matheus Bonez
Sonhos do Passado (Save the Tiger, 1973)
Harry Stoner está longe de ter um dia perfeito pela frente – e ele sabe disso. Já acorda com aspecto cansado, e mesmo sua imensa cama, o moderno controle remoto que lhe oferece acesso a um mundo de novidades ou a atenciosa empregada mexicana parecem lhe oferecer conforto. A esposa está arredia, a filha mora no exterior, e o trabalho vai de mal a pior. Tanto que a única solução que enxerga é incendiar a própria fábrica de tecidos e rezar para que o seguro pague o valor apontado sem muitas perguntas. As dívidas se acumulam, a máfia se aproxima, as lembranças da guerra lhe perseguem, e mesmo os jovens ele parece não mais compreender. A única coisa certa que parece fazer nestas vinte e quatro horas é assinar uma petição para salvar os tigres em extinção, e mesmo isso não deve ter resultado prático algum. O olhar desiludido de homem comum cai como uma luva ao semblante abatido de Jack Lemmon, que mesmo com tão pouco ao seu alcance entregou a performance masculina mais poderosa do ano, derrotando no Oscar galãs como Marlon Brando, Robert Redford, Jack Nicholson e Al Pacino. Um feito que ficou na história e na memória de cada um dos seus inúmeros admiradores. – por Robledo Milani
Desaparecido: Um Grande Mistério (Missing, 1982)
Quase dez anos após o golpe militar que tirou Salvador Allende da presidência do Chile, dando lugar a ditadura de Augusto Pinochet, o diretor Costa-Gavras fez este longa que retrata a tensão do período ao focar a história real do desaparecimento do jornalista americano Charles Horman. O filme mostra os esforços do pai dele, Ed Horman (interpretado por Lemmon), e de sua esposa, Beth (Sissy Spacek), para descobrir o que aconteceu com ele, não importando o quão dolorosa a resposta possa ser. Em uma atuação que preza mais a sutileza, Lemmon concebe Ed Horman como um homem conservador, que chega a culpar o filho por seu próprio destino, mas sem esquecer de dar ao personagem uma camada humana, deixando clara a dor de um pai diante do que aconteceu. É uma atuação de sensibilidade ímpar, e por ela nosso homenageado não só recebeu uma indicação ao Oscar como protagonista, mas também o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes, de onde o filme ainda saiu com a Palma de Ouro, empatado com Yol (1982). – por Thomas Boeira
+1
A Primeira Página (The Front Page, 1974)
Esta comédia lançada em 1974 representou a terceira parceria entre Jack Lemmon e Walter Matthau, mas não era muito bem quista pelo diretor Billy Wilder. Isso porque ele não se interessava por remakes, pensando ser uma grande perda de tempo. A Primeira Página (1931) e Jejum de Amor (1940) foram as versões anteriores desta mesma história, baseada em uma peça de 1928, escrita por Ben Hecht e Charles MacArthur. Apesar deste pensamento do cineasta, sua adaptação consegue ser tão boa quanto as versões anteriores. Apaixonado por jornalismo, o diretor traz a história de Hildy Johnson (Lemmon), um repórter talentoso que decidiu abandonar a profissão para casar. Seu inescrupuloso editor, Walter Burns (Matthau), resolve, então, passar a ele uma matéria suculenta, tentando fazer com que ele não se afaste. Esse seria apenas o início dos problemas. Dentre as parcerias entre os amigos atores, esta talvez não seja a mais lembrada pelos espectadores, mas tem predicados mais do que suficientes para uma olhada. A química entre Lemmon e Matthau é lendária e os diálogos adaptados da peça, com assinatura de Wilder e I.A.L. Diamond, são entregues de forma certeira pela dupla. Foi indicado a 3 Globos de Ouro, com os dois amigos competindo pela estatueta na categoria Ator em Comédia. – por Rodrigo de Oliveira
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