Hoje, ele é conhecido por sua atuação infalível como o ardiloso Frank Underwood da série House of Cards (2013-), mas Kevin Spacey já deu outros presentes para seus fãs desde que começou sua carreira na década de 1980. Nascido em 26 de julho de 1959 em Nova Jersey, nos Estados Unidos, o ator iniciou seus trabalhos no cinema com pontas em filmes conhecidos como A Difícil Arte de Amar (1986), O Rochedo de Gibraltar (1988) e Uma Secretária de Futuro (1988), até surgir como um dos principais vilões da comédia Cegos, Surdos e Loucos (1989). Galgando degraus paulatinamente em Hollywood, o ator finalmente teve seu momento de virada em 1995, quando estrelou Os Suspeitos, filme pelo qual levou seu primeiro Oscar (como Coadjuvante) e com sua participação surpresa em Seven: Os Sete Crimes Capitais, como o maníaco John Doe.
Foram outros quatro anos até chegar seu segundo Oscar, primeiro como ator principal, no drama com toques cômicos Beleza Americana (1999), dirigido por Sam Mendes. Além do louro da Academia, outras premiações como Globo de Ouro, BAFTA, Screen Actors Guild e inúmeras associações de críticos lembraram de sua performance. Com a virada da década, os papéis não diminuíram, embora o tamanho das produções tenha ficado menor. Fora o Lex Luthor de Superman: O Retorno (2006), Spacey ficou mais interessado em produções independentes ou com orçamentos menores. Isso não o impediu de ser indicado ao Globo de Ouro outras diversas vezes por papéis em Chegadas e Partidas (2001), Uma Vida sem Limites (2004), O Super Lobista (2010), além, claro, do telefilme Recontagem (2008) e House of Cards (pelo qual foi, finalmente, premiado). No aniversário do ator vencedor de 2 Oscar, escolhemos seus cinco filmes inesquecíveis. E mais um, que merece um espaço especial em sua filmografia! Confira!
Apesar de já atuar ativamente desde meados da década de 1980, o verdadeiro reconhecimento do talento de Kevin Spacey só viria em 1995, com o lançamento deste suspense de orçamento modesto que arrebatou o universo cinematográfico com seu exemplar roteiro, responsável também por alavancar a carreira do cineasta Bryan Singer. O filme acompanha o interrogatório do criminoso de segundo escalão Verbal Klint (Spacey), sobrevivente de um tiroteio seguido da explosão de um navio. Na delegacia, Verbal relata ao detetive Dave Kujan (Chazz Palminteri) uma intrincada história sobre um golpe realizado por ele e outros quatro bandidos, que envolve também o nome de Keyser Söze, uma figura mítica do mundo do crime. Em seu segundo longa, Singer conduz com precisão a trama envolvente escrita por Christopher McQuarrie – trabalho premiado pela Academia – e que reserva ao espectador reviravoltas surpreendentes. Em meio a um ótimo elenco, Spacey se destaca na pele de Verbal, fazendo jus ao apelido do personagem. É o ator quem guia a trama e, ao mesmo tempo em que narra os fatos em detalhes, constrói uma figura aparentemente frágil, psicológica e fisicamente, porém extremamente ambígua e cercada de mistério. Uma composição impecável que lhe valeu o Oscar de Ator Coadjuvante. – por Leonardo Ribeiro
Kevin Spacey interpreta o melhor personagem deste produção que, por sua vez, deve ser o melhor filme noir dos últimos 30 anos. Entre o policial brucutu de bom coração (Russell Crowe) e o intelectual carreirista mas moralmente correto (Guy Pearce), está o Jack Vincennes de Spacey, veterano numa corporação corrupta que reproduz todos os vícios de seus colegas, não por ser um sujeito ruim, mas como misto de estratégia de sobrevivência e desinteresse pela profissão, já que sua verdadeira paixão é trabalhar na TV. Vincennes passa por uma trajetória interessante ao longo da narrativa, redescobrindo a dignidade perdida ao se engajar numa investigação conduzida pela dupla de protagonistas, mas encontrado um fim trágico naquela que é a grande cena do filme. Seu embate com o vilão, revelado nesse momento, é emocionalmente poderoso: enquanto dói ver o personagem ter a vida interrompida tão bruscamente, justamente quando reencontrava o amor por seu ofício, fica difícil não vibrar com a reação de Vincennes à beira da morte, suficientemente inteligente para deixar uma armadilha para seu algoz. Vê-lo dizendo “Rollo Tomasi” ali é ter a certeza de se estar diante de um ator especial, numa cena especial de um filme especial. – por Wallace Andrioli
Vencedor de 5 Oscars, incluindo Melhor Filme, esta produção deu a segunda estatueta dourada da Academia a Kevin Spacey, dessa vez de Melhor Ator. Seu papel aqui é o de Lester, um homem de meia idade com trabalho que ele odeia, uma filha que o despreza, uma esposa que o subestima e uma rotina que o entedia. Entretanto, esse típico americano acaba se encantando pela beleza de uma sedutora e jovem (demais) amiga de sua filha. Que por sua vez, começa a se envolver com o estranho vizinho da família, um traficante de drogas que gosta de carregar consigo uma câmera de vídeo. Nesse emaranhado de relações, Spacey compõe mais um tipo único, mesmo usando da sua recorrente persona cínica. Lester realmente é um homem que já não se importa muito com nada que não seja ele mesmo, mas seu antigo carinho pela família ainda existe de forma palpável por trás de suas ações egoístas – e seu senso de moralidade dá sinal de vida quando finalmente consegue a chance de fazer algo que muito antecipava. Uma performance impulsionada ainda pelos colegas de elenco como Annette Bening e Wes Bentley, além da direção segura de Sam Mendes. – por Yuri Correa
É difícil não sentir um forte incômodo e um grande senso de injustiça ao assistir a esse telefilme dirigido por Jay Roach. Contando a história da recontagem dos votos durante a eleição norte-americana que aconteceu em 7 de novembro de 2000, que deu a vitória ao republicano George W. Bush em cima do democrata Al Gore, o longa-metragem nos mostra as inúmeras manobras que foram realizadas para que a vitória fosse assegurada pelo herdeiro da família Bush. Além de ser uma história incrível (e com espaço para o humor certeiro comandado por Roach), o elenco graúdo que encabeça a história é simplesmente fantástico. Laura Dern (que venceu o Globo de Ouro por sua atuação), Tom Wilkinson, Denis Leary e Kevin Spacey (todos indicados ao mesmo prêmio) estão soberbos, interpretando personagens reais que viveram aquele episódio nefasto. Spacey, anos antes de viver o ardiloso Frank Underwood em House of Cards, certamente observou a força que um produto televisivo poderia ter em sua carreira com Recontagem, sendo um embrião para sua participação na série da Netflix. Usando sua igualmente talentosa verve para o drama e a comédia, o ator vive um homem dentro de um turbilhão, tentando fazer o que pode para reverter uma situação, infelizmente, irrevogável. – por Rodrigo de Oliveira
O colapso econômico ocorrido nos Estados Unidos em 2008, também chamado de “crise dos subprimes”, começou com a falência de algumas instituições americanas de crédito que concediam empréstimos hipotecários de alto risco. Este filme de J.C. Chandor foi um dos que até agora melhor retrataram de dentro essa quebradeira, simplificando até mesmo o “economês”, a linguagem hermética que rege esse mundo fechado a quem ignora seus códigos cifrados. Além do roteiro inteligente e da direção segura, o longa-metragem conta com um elenco afiado, no qual o veterano Kevin Spacey se sobressaiu após um período sem encontrar trabalhos à altura de seu talento já devidamente comprovado e laureado. Diante de jovens investidores, o papel do ator norte-americano nascido em South Orange, Nova Jersey, se destaca sobremaneira. Esse homem experiente no mercado financeiro constantemente toma para si o protagonismo, posição que, de fato, é do operador interpretado por Zachary Quinto. Spacey demonstra aqui, numa trama baseada em fatos tão controversos quanto representativos, seu vasto repertório dramático ao construir um personagem multifacetado que precisa se manter firme num entorno altamente volátil. Em vias de desmoronar, não sem levar consigo uma série de pessoas e conglomerados, o cenário é espelhado na sua atuação decisiva. – por Marcelo Müller
Seven: Os Sete Crimes Capitais (Seven, 1995)
Assim como o tubarão de Spielberg, John Doe consegue, em pouquíssimo tempo de tela, projetar a ameaça de sua presença em cada minuto de filme. Embora o diretor David Fincher dedique muito mais tempo à construção dos personagens David Mills (Brad Pitt) e William Somerset (Morgan Freeman), bem como o relacionamento entre os dois, a figura mais memorável é certamente aquela que só dá as caras nos minutos finais, o assassino que os dois detetives tentam capturar. Somos apresentados ao serial killer inspirado nos sete pecados capitais à medida que acompanhamos as investigações a respeito dos seus crimes, meticulosos e cruéis em partes iguais. Cabe a Kevin Spacey incorporar o criminoso frio e implacável que a audiência só pôde imaginar durante o curso do filme. O ator entrega aqui uma das melhores performances de sua carreira, criando um assassino que brinca com a polícia exibindo uma calma desesperadora: eis um homem que acredita firmemente em sua “missão”, um personagem que não tem nada a perder. É justamente esse desdém – pela polícia, por si próprio e até por toda a humanidade – que o transforma num antagonista inquietante, terrivelmente assustador e, é claro, inesquecível. – por Marina Paulista