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5+1 :: Lima Duarte

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Um dos monstros da atuação brasileira. Assim pode ser descrito Lima Duarte, artista que, se atuasse em inglês, hoje seria tão grande quanto um Michael Caine ou um Anthony Hopkins, disputando Oscars e reconhecimentos internacionais. Ele, no entanto, veio da pequena Sacramento, no interior de Minas Gerais, nascido como Ariclenes Venâncio Martins. O nome artístico surgiu logo nos primeiros passos, primeiro no rádio, depois da televisão e, por fim, também no cinema. De carreira longeva, está na ativa desde o final dos anos 1940, com participações de destaque em todos os meios pelos quais se aventurou. No que diz respeito à tela grande, consagrou-se com prêmios nos dois principais festivais do Brasil – Gramado e Brasília – além de já ter ganho três troféus como Melhor do Ano concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte e ter recebido outras três indicações ao Prêmio Guarani de Cinema Brasileiro. Dono de tipos populares na telinha, como Sinhozinho Malta, Dom Lazaro Venturini e Zeca Diabo, no cinema deu vida a personagens ainda mais marcantes, como Zé Bigorna, Sargento Getúlio, Padre Antonio Vieira, Gumercindo Saraiva e o terrível Rapaterra, entre tantas outras encarnações. De aniversário neste dia 29 de março, selecionamos algumas destas composições em sua homenagem, ressaltando o melhor da arte de Lima Duarte.

 

Sargento Getúlio (1983)
Além de irascível, Getúlio é obsessivo e determinado. O protagonista do filme dirigido por Hermano Penna com base no livro homônimo de João Ubaldo Ribeiro é interpretado por Lima Duarte, ator bastante conhecido do grande público em virtude de seu trabalho televisivo, mas de atuação também importante no cinema. O longa-metragem foi o grande vencedor do Festival de Gramado de 1983, levando para casa os prêmios de Melhor Filme, Melhor Ator Coadjuvante (Orlando Vieira), Melhor Som Direto, Grande Prêmio da Crítica, Grande Prêmio da Imprensa e o Prêmio do Júri Oficial, além de Melhor Ator para Lima Duarte. Do Festival de Cuba, ainda em 83, o ator saiu igualmente considerado o melhor. Duarte ainda foi consagrado em 1984 na mesma categoria pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Reconhecimentos ao trabalho vigoroso num papel difícil, o do homem em meio à transformação política que altera radicalmente a missão lhe conferida anteriormente. Decidido a não voltar atrás, mesmo contra ordens superiores, Getúlio vai às últimas consequências. Esse personagem originalmente literário ganha um equivalente cinematográfico à altura por conta do desempenho marcante de Lima Duarte, que lhe confere o estofo necessário para aspirar à grandeza. – por Marcelo Müller

 

Eu Tu Eles (2000)
Quem nunca ouviu falar da mulher com três maridos? Parece até conto de circo ou lorota de vendedor, mas esse episódio verídico deu origem a um dos mais belos e delicados filmes da chamada ‘retomada’ do cinema brasileiro, iniciada a partir de 1995. Andrucha Waddington, ainda dando seus primeiros passos como realizador, convocou a comediante e apresentadora de televisão Regina Casé para seu primeiro papel dramático, e ela dá literalmente um show como a nordestina dividida entre três homens, todos eles morando na mesma casa. Se Stênio Garcia comove pelo retrato delicado do macho-fêmea, aquele que cuida da casa, cozinha e atende as crianças, Luiz Carlos Vasconcelos surge como o desejo, a tensão sexual e o afeto. Resta, portanto, ao personagem de Lima Duarte ser o legítimo ‘homem da casa’. É o valentão, o líder-alfa, aquele de voz grossa e atitudes enérgicas, que tudo manda mas a quem ninguém obedece. Sua figura é quase decorativa, e diante de um tipo como esse seria fácil resvalar na caricatura. Duarte, no entanto, prefere outro caminho, mais difícil e gratificante. Dotando-o de profundidade e sentimentos complexos, tem-se nele umas das figuras mais interessantes dessa curiosa família. – por Robledo Milani

 

O Auto da Compadecida (2000)
Esta produção é um caso a ser estudado. Minissérie realizada para a televisão, de grande sucesso de audiência, foi reeditada e exibida nos cinemas com bilheteria surpreendente. Qual seria o segredo? Além do texto magistral de Ariano Suassuna, muito bem adaptado, o elenco chama a atenção. Matheus Nachtergaele e Selton Mello protagonizam esta história bem humorada sobre dois pobretões que tentam levar a melhor apenas com a esperteza de um deles, João Grilo. Em seu caminho, diversos nomes importantes da TV e do cinema como Marco Nanini e Fernanda Montenegro, entre outros. E um dos destaques, sem sombra de dúvidas, é Lima Duarte. Vivendo o Bispo da região, o ator dá autoridade a uma pessoa que, no frigir dos ovos, é tão ou mais escroque que qualquer um dos malandros que vivem naquele cenário. Usando de sua posição para achacar o padre da paróquia e tirar proveito sempre que pode, o personagem vivido por Lima Duarte era uma grande crítica de Suassuna a respeito da Igreja Católica, mas principalmente a respeito das figuras que a usam para benefício próprio. O ator acerta ao manter-se sempre sério, austero, conquistando risadas exatamente por isso em dobradinha fantástica com o saudoso Rogério Cardoso. – por Rodrigo de Oliveira

 

Palavra e Utopia (2000)
Além de trabalhar com grandes nomes do cinema nacional, Lima Duarte também teve a oportunidade de colaborar com um dos maiores cineastas do mundo: Manoel de Oliveira. O encontro ocorreu neste longa que narra a vida do Padre Antônio Vieira, uma das mais influentes personalidades do século XVII, que se notabilizou pela defesa dos direitos dos povos indígenas e pela luta contra a escravatura. Devido a este posicionamento, foi perseguido pela Inquisição Portuguesa, fugindo para Roma e por fim retornando ao Brasil. Oliveira apresenta esta trajetória com seu estilo característico, de longos planos estáticos realçados por um belíssimo trabalho de luz e sombras naturais. A palavra, como expõe o título, é a principal ferramenta do cineasta e também de Antônio Vieira, conhecido por sua oratória impecável, e por isso o trabalho dos atores é fundamental. Lima Duarte interpreta o padre na última das três fases do personagem, já idoso e com a saúde debilitada, entregando uma composição impecável. O ator brasileiro encarna um Vieira já desencantado, mas que, mesmo em meio à decadência física, ainda é capaz de declamar intensos sermões e manter-se fiel aos seus ideais. Uma atuação complexa e vigorosa, à altura da obra do mestre português. – por Leonardo Ribeiro

 

Assalto ao Banco Central (2011)
Como é bom ver o cinema nacional querendo fazer mais do que comédias vazias e dramas pesados. Tem-se aqui, por exemplo, uma dessas obras que se diferencia ao retratar um episódio verídico: o maior furto já realizado na história do Brasil, ocorrido em Fortaleza, em 2005. A história é sensacional e, talvez, nas mãos de um diretor mais experiente e talentoso, pudesse render em um filme espetacular. Profissional experiente na TV, Marcos Paulo, em sua estreia como realizador cinematográfico, cometeu falhas. A completa ausência de linearidade em qualquer sentido atrapalhou o ritmo do filme e também faltou capricho no roteiro, para desenvolver e conduzir a história. Não é ótimo, mas também não é um desastre. E muito disso se deve as boas atuações. Entre elas, vale destacar a participação de Lima Duarte. No papel do delegado Chico Amorim, ele executa muito bem o veterano com medo de ser ultrapassado. O artista, aliás, declarou em algumas entrevistas que gostou de interpretar seu personagem e o julgou muito parecido com ele mesmo, por ser um profissional de antes da era da internet e sem redes sociais. De fato, Lima Duarte fez bem seu trabalho e “combinou” com seu personagem. – por Gabriel Pazini

 

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A Busca (2013)
Como traumas do passado podem refletir em nossa condição presente, inclusive ultrapassando limites geracionais. Um filho sai de casa e resolve conquistar o mundo por conta própria. O pai, desesperado, parte no seu encalço. Seria muito simples reduzir à trama deste filme à perseguição de Wagner Moura pelo pequeno Pedro (Brás Antunes). Mas há mais em jogo. E, já quase no encerramento desta aventura dramática, descobrimos que tudo que o garoto queria era ser tão livre quanto o avô, a quem se dirigia o tempo todo, a despeito do pai em nenhum momento perceber o caminho. Eis que surge Lima Duarte, o pai e avô, forte e afetuoso, distante e enérgico. Ele sempre esteve no mesmo lugar, à espera de algo ou de alguém. À espera do próprio filho, podemos dizer. Wagner é um dos melhores atores de sua geração, e Antunes mostra-se uma escolha acertada em um papel difícil. Porém é Duarte, mesmo com poucos minutos em cena, que eleva este filme a um nível até então insuspeito. Sua presença pode ser fugaz, mas o impacto que provoca percorre toda a nossa percepção da história que está sendo contada. – por Robledo Milani

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