Nascido no dia 03 de abril de 1924 em Omaha, no Estado de Nebraska, nos Estados Unidos, caso ainda estivesse vivo Marlon Brando Jr. estaria completando 89 anos de vida! No entanto essa data não chegou a ser comemorada, pois há nove anos, no dia 01° de julho de 2004, ele nos deixou, vítima de uma fibrose pulmonar. Um dos maiores ícones da era de ouro do cinema, por muitos considerado o melhor ator da história, estreou no cinema logo com um clássico – Uma Rua Chamada Pecado, baseado no texto de Tennessee Williams (este foi seu primeiro filme a ser feito, porém o segundo a ser lançado, após Espíritos Indômitos, de 1950). Esta performance bombástica lhe garantiu também a primeira das oito indicações que recebeu ao Oscar, tendo ganho em duas ocasiões: por Sindicato dos Ladrões (1954) e por O Poderoso Chefão (1972), ambas como Melhor Ator. Brando ganhou ainda cinco Globos de Ouro, três BAFTA (Inglaterra), um David di Donatello (Itália), um prêmio da Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA e um no Festival de Cannes – além de uma irônica Framboesa de Ouro de Pior Ator Coadjuvante, por A Ilha do Dr. Moreau (1996), um dos seus últimos – e mais descartáveis – trabalhos. Um dos pioneiros do Método de atuação do Actor’s Studio, casado três vezes, pai de cinco filhos e um dos homens mais belos de todos os tempos, é até hoje uma das maiores lendas já produzidas por Hollywood. E é para prestar nossa homenagem a este grande nome que apontamos aqui seus cinco melhores filmes – e mais um especial, talvez não tão conhecido, mas que ainda assim merece ser (re)descoberto! Confira!
A atuação de Marlon Brando como Stanley Kowalski pode ser considerada como uma das mais sensuais e excepcionais de sua carreira e, sem dúvida, também da história do cinema. Tendo encenado o personagem de Uma Rua Chamada Pecado na Broadway, Brando foi escalado também para esta versão cinematográfica da peça de Tennessee Williams. Aqui ele aparece como o bruto cunhado de Blanche DuBois (Vivien Leigh), irmã de sua esposa, que se muda para morar com eles em um tipo de cortiço em Nova Orleans. Blanche terá seu mundo posto à baixo quando encara a realidade violenta dessa nova convivência. Apesar de vários cortes no roteiro para evitar problemas de censura, que era extremamente rígida na época, foram deixadas de fora questões explícitas sobre maus tratos contra a mulher e ainda a homossexualidade de alguns personagens. Este filme é um deleite para quem procura um elenco em perfeita sintonia e uma direção exemplar. É curioso notar também que é considerado um marco transitório entre o modo de atuação melodramático clássico de Hollywood e um novo conceito de interpretação não tão exagerada. Não é por nada que é tido como um título obrigatório para os cinéfilos.
Uma das obras primas de Elia Kazan é um legítimo exemplar dos clássicos inesquecíveis da cinematografia mundial. Porém, muito mais que usar de referências ao neorrealismo italiano, retratar uma situação pungente dos EUA (a máfia dos sindicatos) e fazer disto uma alegoria à “caça às bruxas” ao comunismo na época, o filme é lembrado por uma das atuações mais marcantes (senão a principal) da filmografia de Marlon Brando. Com uma carreira em franca ascensão nos anos 1950, o ator faz um paralelo de si mesmo para compor Terry Malloy, um fracassado ex-boxeador que acaba precisando ganhar a vida trabalhando na zona portuária. Contudo, seus dilemas morais começam a ficar ainda mais profundos quando acaba sendo usado como isca para a morte um outro trabalhador do cais e se apaixona pela irmã (Eva Marie Saint) deste. Perdido numa sinuca de bico entre a verdade e o crime (reflexo também do próprio Kazan), o personagem vai agindo conforme seu instinto, sem saber a quem é leal. A atuação de Brando extrapola estes limites e o intérprete entrega uma performance excepcional, utilizando de toda sua selvageria peculiar ao mesmo tempo em que apresenta uma sensibilidade irrepreensível. Sindicato de Ladrões é um marco do cinema e também a lembrança de um dos maiores atores já vistos no cinema. Inesquecível.
Francis Ford Coppola teve de brigar com a Paramount para conseguir escalar Marlon Brando no papel de Don Vito Corleone no clássico O Poderoso Chefão. Muitos nomes foram cogitados (Ernest Borgnine, Laurence Olivier, Orson Welles), mas o preferido do cineasta – Brando – não estava com status necessário para encabeçar uma grande produção. Seus filmes anteriores foram fracassos, o que deixou o estúdio com pouco interesse no antigo astro. Coppola se mostrou um homem de visão e bateu o pé para conseguir o ator em seu filme. E o resultado é o que conhecemos. Uma performance memorável de um intérprete que ainda tinha muito o que contribuir para a sétima arte. Marlon Brando como Don Corleone está hipnótico. Sempre que está em cena, mesmo calado, apenas brincando com um gato em seu colo, ele é o dono do recinto. Todos os olhos estão nele. Mudando sua voz, sua face e seu modo de andar, Brando se transforma no patriarca de uma família italiana que sempre faz propostas irrecusáveis para seus parceiros de trabalho – ou inimigos. Vencedor do Oscar de Melhor Ator, Marlon Brando ainda tiraria um grande sarro da Academia ao não comparecer para receber o prêmio – mandando uma atriz vestida de índia no seu lugar. Só mais uma das polêmicas envolvendo este inesquecível ator.
É difícil pensar neste filme sem ter na mente o olhar final de Brando, momentos antes da tragédia que encerra a trama. É quando Paul, seu personagem até então frio e de poucas dimensões, se aprofunda abissalmente, tirando o chão de quem esperava dele apenas o que o arquétipo prometia. Esta é, aliás, uma das habilidades marcantes do ator, celebrizado por personagens fortes e com pontos de viradas impressionantes, com forte teor sexual. Conduzido por Bertolucci através de uma montanha russa erótica – que inclui a famigerada “cena da manteiga” – Brando acaba se tornando infinitamente maior do que seu contraponto feminino, a então desconhecida Maria Schneider. É, ele afinal, quem acaba personificando o amor romântico, aquele que só existe quando não realizado.
De acordo com minha opinião, Apocalypse Now é o maior filme de guerra já feito, e olhem que não sou afeito a superlativos ou classificações dessa natureza. A criação de Francis Ford Coppola, baseada no livro Heart of Darkness, de Joseph Conrad, acompanha a missão do capitão Willard (Martin Sheen) no encalço do coronel Kurtz (Marlon Brando), este que teria enlouquecido, chegando a executar inocentes na selva do Camboja. O longa é repleto de momentos antológicos, como o ataque dos helicópteros durante a execução da Cavalgada das Valquírias (do alemão Richard Wagner) ou a própria subida do rio em meio a degradação moral e física provocada pela Guerra do Vietnã, mas tudo alcança níveis sublimes e até etéreos quando o protagonista chega ao destino e encontra o povo que adora Kurtz quase como Deus. Ali, Coppola só consegue de fato atingir a aura de delírio e potencializar ainda mais o trajeto pregresso de seus personagens por contar com a magnificência de um ator como Marlon Brando, em interpretação antológica. Através de Brando, Kurtz entrou para a história cinematográfica como um de seus ícones, pois estandarte da loucura provocada pelo belicismo de uma nação alheia ao homem em seus intentos de dominação.
+1
Em desempenho injustamente pouco lembrado, talvez eclipsado por sua impressionante performance subsequente em O Poderoso Chefão (1972), Marlon Brando desaparece como o excêntrico Peter Quint em Os Que Chegam Com a Noite (1971). A controversa obra de Michael Winner propõe uma prequela para o famoso livro de Henry James, adaptado ao cinema anteriormente em Os Inocentes (1961), de Jack Clayton. No filme, Flora e Miles, duas crianças que vivem isoladas numa mansão inglesa, testemunham o relacionamento inadequado de sua professora particular com o jardineiro da casa. Indicado ao BAFTA, Brando apresenta uma de suas mais malévolas e impactantes interpretações, com nuances perturbadoras – principalmente nas sequências em que Quint inflige torturas sexuais a Miss Jessel. No entanto, sua relação com as crianças é intrigante e ele as encanta com suas histórias mirabolantes e filosofia de vida peculiar. Como em outros filmes de Winner, não se deve manter expectativas com o enredo, que caminha para uma solução imprevisível. Distante das obras de James e Clayton, o cineasta detalha os ritos de passagem que marcam violentamente a perda da inocência do casal de irmãos. Ainda assim, é Brando, com seu sotaque irlandês questionável, que toma o filme para si.