Possivelmente um dos melhores cineastas em atividade, com quase 60 anos de carreira, o polonês nascido na França Roman Polanski tem um currículo dos mais invejáveis e influentes das últimas décadas. Alternando sua filmografia entre suspenses e produções de terror psicológico com dramas profundos e até comédias de humor negro, a principal preocupação do diretor e que traça um paralelo entre todos estes gêneros é a condição do homem perante as mais variadas situações, sejam mais corriqueiras (como sua trilogia dos apartamentos) ou excepcionais (como a Segunda Guerra Mundial, em O Pianista, 2002).

Conhecido também pela trágica história de sua esposa, Sharon Tate, assassinada pela família Manson quando grávida, em 1969, Polanski ainda se envolveu em um escândalo sexual no fim dos anos 1970, quando foi condenado pelo estupro de uma menor de treze anos, o que impediu seu retorno aos EUA. Histórias controversas à parte, o cineasta comemora aniversário no dia 18 de agosto. Para celebrar a data e uma carreira tão cheia de méritos, a equipe do Papo de Cinema resolveu escolher seus cinco melhores filmes – e aquele que não merece ser esquecido.

 

Repulsa ao Sexo (Repulsion, 1965)
Por Renato Cabral
Abrindo a trilogia de Polanski sobre isolamento em apartamentos em grandes cidades, que teria continuidade com O Bebê de Rosemary (1968) e O Inquilino (1976), Repulsa ao Sexo é também o primeiro filme do diretor falado em inglês. Trazendo uma novinha e já excepcional Catherine Deneuve estrelando a história de uma jovem que tem de lidar com o passado, medos e sua sexualidade reprimida quando sua irmã a deixa sozinha em seu apartamento ao sair de férias. Filmado em preto e branco e com belíssimos efeitos visuais, devido às cenas de alucinação da personagem de Deneuve, Polanski desdobra o espaço do apartamento, o transformando em uma verdadeira casa do terror. Para fechar todas, Deneuve entrega uma das mais introspectivas e memoráveis performances de sua carreira em um dos mais primorosos filmes de Polanski.

 

O Bebê de Rosemary (Rosemary’s Baby, 1968)
Por Matheus Bonez
Quando um jovem casal se muda para um novo apartamento, o que se espera é a mais pura felicidade do início da vida conjugal. Porém, aqui Polanski subverte esta lógica quando Rosemary (Mia Farrow) engravida, seu marido começa a ficar distante, estranho, e inicia uma relação duvidosa com a vizinhança assustadora. A paranoia da personagem de Farrow aumenta ainda mais por viver enclausurada, com medo do que possa ocorrer com o filho no ventre, enquanto tenta desvendar o que realmente se passa naquele prédio e com sua recém formada família. O terror baseado na sugestão e não em pirotecnias é um dos maiores acertos de um filme imbatível desde sua concepção, que mostra um jovem cineasta ciente de seu talento e de como fazer o uso acertado de sua decupagem. Com O Bebê de Rosemary, Polanski não apenas atestaria de vez sua formação como também entrega performances louváveis de uma Mia Farrow pré-Woody Allen e Ruth Gordon, merecidamente premiada com o Oscar de Atriz Coadjuvante por este intenso trabalho.

 

Chinatown (idem, 1974)
Por Rodrigo de Oliveira
Forget it, Jake. This is Chinatown. Esta é uma das falas mais conhecidas da história do cinema e é a frase que encerra uma das obras-primas da filmografia de Roman Polanski. Chinatown foi o último filme do diretor polonês em solo norte-americano e é um perfeito exemplar do neo-noir, o revival do gênero que aconteceu nos anos 60 e 70. Foi o retorno das histórias cheias de intrigas, com detetives metidos a espertos e a presença sempre sedutora das mulheres fatais. Neste caso, Jack Nicholson vive o investigador particular Jake Gittes e o papel da misteriosa dama é encarnado por Faye Dunaway. Na trama, o detetive em questão, um tanto mequetrefe, é contratado para seguir o marido de sua cliente. No entanto, o caso é bem mais complicado, visto que a contratante não era quem dizia ser e o mistério era muito mais profundo do que um caso extraconjugal. Com grandes performances da dupla central e uma participação especialíssima de John Huston como o sórdido Noah Cross, Chinatown é filme obrigatório para quem gosta do cinema de Roman Polanski. Foi indicado a onze Oscar, mas venceu apenas o prêmio de Melhor Roteiro, assinado por Robert Towne.

 

O Inquilino (Le Locataire, 1976)
Por Marcelo Müller
Trelkovsky (Roman Polanski), polonês radicado na França, aluga apartamento num estranho edifício residencial. Ele desconhece, mas não tardará a descobrir: a última moradora do seu novo lar pulou da janela à morte. Mas, para além dessa marca cravada no passado no imóvel, há o presente do próprio conjunto habitacional, repleto de repressão e mistério. Quase todos os vizinhos do protagonista são idosos, reclusos e avessos a barulho. Então, ele começará a ser afetado duramente pelo meio, pois refém da vigilância e da desconfiança, ao passo que se torna obsessivo com relação à moradora suicida. O Inquilino é um dos filmes mais inquietantes de Polanski, no qual continua a desenvolver a obsessão por espaços fechados, mais precisamente apartamentos, onde os personagens tendem a entrar em viagens existenciais, ou pior, desenvolver psicopatologias. A fragilidade de Trelkovsky, mediada através da atuação de Polanski, contrasta com a sagacidade do Polanski diretor, responsável pelo gradativo clima de instabilidade. Acompanhamos a degradação mental desse homem deslocado numa terra historicamente arredia aos estrangeiros, em dúvida fundamental quanto às múltiplas possibilidades de verdade. Afinal, suspeitas procedem ou são mero fruto de tempos paranoicos? Grande filme.

 

O Pianista (The Pianist, 2002)
Por Robledo Milani
Roman Polanski andava numa fase complicada em sua carreira quando lançou O Pianista, após mais de uma década de filmes que ficaram aquém das expectativas – período negro que teve início com o malfadado Piratas (1986), um retumbante fracasso de público e de crítica. Mas ao retornar às suas próprias origens ele mais uma vez voltou à melhor forma do seu trabalho. A história de um músico judeu polonês que consegue sobreviver aos horrores da Segunda Guerra Mundial se apoiando quase que exclusivamente no seu talento foi construída sob três pilares excepcionais: o inesperado potencial dramático do protagonista Adrien Brody (até então um mero desconhecido), o roteiro preciso e sensível, porém nunca melodramático, de Ronald Harwood (a partir do livro autobiográfico de Wladyslaw Szpilman), e a mão segura de Polanski na direção, que sabia como poucos exatamente a história a ser contada. Os três, merecidamente, foram reconhecidos com o Oscar – o filme ainda teve outras quatro indicações, inclusive a Melhor Filme. Uma obra que não pode – nem deve – ser esquecida.

 

+1

Deus da Carnificina (Carnage, 2011)
Por Dimas Tadeu
Quando um diretor reconhecido por dirigir clássicos complexos como Chinatown (1974) decide adaptar uma peça de teatro para o cinema, pode-se esperar muito. E Polanski supera as expectativas com sua versão de Deus da Carnificina, adaptado por ele próprio em co-autoria com Yazmina Reza, autora da peça. Comandando um elenco de quatro astros que gravitam em torno de temas tão polêmicos como violência, relações humanas e luta de classes, o diretor esboça um retrato sarcástico e afiado da sociedade contemporânea, sem extrapolar o espaço de um apartamento. Sendo um filme “mais simples” do diretor, Deus da Carnificina ainda assim desponta como uma das obras necessárias dos últimos 10 anos. O que prova que o talento de Polanski transcende sua polêmica personalidade.

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