Ele é brabo, mal humorado, tem fama de ser chato nos bastidores e sem papas na língua. O Brasil sabe bem, inclusive, após suas polêmicas declarações a respeito do país em sua recente visita para a divulgação de Noé (2014). Russell Crowe pode não ser fácil de digerir fora das telas, mas o neozelandês é, com certeza, um dos melhores atores de sua geração. É difícil ver o intérprete entregar alguma performance sem louros, mesmo que a produção estrelada não seja das mais elogiadas – vide Um Bom Ano (2006), por exemplo.
Crowe parece estar se recuperando de uma fase morna nos cinemas. Após estrelar vários filmes importantes que lhe valeram indicações ao Oscar entre o final dos anos 1990 e o início dos 2000, o ator ainda teve papéis de destaque como o boxeador de A Luta Pela Esperança (2005), o “vilão” do faroeste Os Indomáveis (2007) e o policial de O Gângster (2007), mas teve outros percalços no caminho, além de ter ganhado alguns quilos a mais que o fizeram perder a pose de galã e também seu gênio difícil que o deixou de fora de várias produções. A retomada parece ter vindo com Os Miseráveis, em 2012, seguida do importante papel como o pai de Kal-El em O Homem de Aço (2013) e alcançando o auge novamente ao protagonizar a superprodução Noé. Com uma carreira como esta e, ainda mais, para celebrar o aniversário do astro no dia 7 de abril, a equipe do Papo de Cinema resolveu escolher seus cinco melhores papéis no cinema – e mais um que merece destaque. Confira a seguir.
Los Angeles: Cidade Proibida (L.A. Confidential, 1997)
Por Matheus Bonez
Los Angeles: Cidade Proibida retomava o cinema noir em Hollywood no final dos anos 1990 ao traçar uma trama de corrupção dentro da polícia que envolvia gangsteres, prostitutas, Hollywood e o alto escalão do governo nos anos 1950. O protagonista do filme de Curtis Hanson é ninguém menos que Russell Crowe na pele de Bud White, o policial incorruptível que, ao lado do honesto – porém carreirista, Ed Exley (Guy Pierce), se encarrega de descobrir quem está espancando e matando garotas de programa ao mesmo tempoem que investiga o esquema de lavagem de. O trauma da violência contra a mulher é notável na vida do personagem e Crowe mostra a total imersão que ele poderia (e faria) em seus próximos papéis que é impossível imaginar outro ator na pele do tira. O neozelandês é o legítimo brutamontes de bom coração: violento quando necessário, doce quando precisa (especialmente com sua paixão, a prostituta vivida por Kim Basinger). Das nove indicações ao Oscar, Crowe não foi lembrado em nenhuma. Injustiça que foi reparada dois anos depois com um papel ainda mais desafiador. O que não tira o brilho de sua performance neste excelente filme policial que merece ser revisto várias vezes.
O Informante (The Insider, 1999)
Por Danilo Fantinel
O maior desafio de Russell Crowe em O Informante foi atuar ao lado do excepcional Al Pacino. No filme inspirado em um fato real sobre a indústria do cigarro, Pacino interpreta o persuasivo Lowell Bergman, produtor do icônico programa de TV jornalístico 60 Minutes, da rede CBS. O ator rouba para si o filme inteiro, mas não sem duelar com Crowe, notável sob a pele de Jeffrey Wigand. Vice-presidente demitido da Brown & Williamson Tobacco Company, Wigand é convencido por Bergman a contar detalhes sobre as práticas abusivas da empresa para ampliar os efeitos viciantes do cigarro. A entrevista bombástica acaba sendo realizada apesar de Wigand estar impedido por contrato de falar sobre o assunto. Aos poucos, o executivo passa a ser alvo de assédio moral e ameaças de morte. Ao mesmo tempo, abre-se uma investigação pública sobre o caso. Com medo de ser arrolada em um processo multimilionário, a CBS decide apresentar uma versão editada (e pouco ética) do programa, desamparando Wigand em sua cruzada contra o império do tabaco. Em uma trama sobre jornalismo, direito e estratégia industrial, Crowe vive um homem em processo de desconstrução, largado pela família, manipulado pela mídia e acossado pela fúria do capital.
Gladiador (Gladiator, 2000)
Por Marcelo Müller
Vencedor do Oscar de Melhor Filme (entre outros prêmios), êxito comercial, bem recebido por boa parte da crítica especializada, Gladiador, filme dirigido por Ridley Scott, resgatou uma temática até então extinta da agenda de Hollywood, afinal o último êxito digno de nota que dela provinha, se não me falha a memória, havia sido Spartacus (1960), lá nos idos de 1960. Russell Crowe, por sua vez, levou para casa o Oscar de Melhor Ator pelo papel do protagonista, o general romano Máximus Décimus Meridius. E podemos dizer, sem muito duvidar, que sua interpretação é mesmo um dos pilares do longa. Crowe dá vida a um homem de confiança do império romano, traído pelo filho inescrupuloso do regente por representar ameaça ao plano sórdido de soberania cujo início se dá com a sucessão. Rebaixado a escravo, Maximus renasce destituído de sua posição privilegiada e de sua aristocracia militarista, em meio às batalhas de vida e morte no Coliseu, de onde comanda a insurreição popular contra o tirano. Por conta desse trabalho, o neozelandês Russell Crowe entrou definitivamente no firmamento das estrelas hollywoodianas, figurando desde então entre os atores mais requisitados por essa indústria feita de xodós muitas vezes efêmeros.
Uma Mente Brilhante (A Beautiful Mind, 2001)
Por Eduardo Dorneles
Sabe aquele filme feito exclusivamente para o Oscar? Uma Mente Brilhante (2001) é um bom exemplo. A obra é competente no que se propõe a fazer, é bom deixar claro. Mas, infelizmente, peca por deixar de fora muitos elementos polêmicos que fizeram parte da vida do matemático vencedor do Nobel e esquizofrênico John Forbes Nash Jr, o protagonista da história. O diretor Ron Howard opta por construir uma narrativa mais burocrática, onde há os elementos de romance, superação e edificação na dose certa. É o típico filme que poderia perder a credibilidade no decorrer dos anos. Mas isso não aconteceu – e é pouco provável que aconteça – por causa de uma pessoa: Russell Crowe, o intérprete de Nash. Crowe supera o estereótipo que ganhou um ano antes em Gladiador (2000) e entrega uma atuação extraordinária que, ouso afirmar, assume como elemento arrebatador do filme. Diferente de sua forte presença carismática vista em outros momentos, sua atuação encanta pelos detalhes revelados durante a interação com cenários, personagens e alucinações. A postura, a cabeça baixa, o olhar, todas essas características entregam um brilhante resultado final. É difícil encontrar uma resposta do porque ele não levou o Oscar. É o melhor trabalho dele.
Mestre dos Mares: O Lado Mais Distante do Mundo (Master and Commander: The Far Side of the World, 2003)
Por Rodrigo de Oliveira
Russell Crowe nasceu para comandar. Se em Gladiador (2000), o ator demonstrava facilidade em liderar uma horda de soldados em batalha, em Mestre dos Mares ele está no mar, guiando os marinheiros do Surprise contra Acheron, uma fragata Francesa que insiste em assombrar a viagem do Capitão Jack Aubrey. Tudo isso com a mesma competência. O momento na carreira do ator era formidável. Depois de ter sido indicado ao prêmio da Academia por suas performances em O Informante (1999) e Gladiador e ter recebido a estatueta em Uma Mente Brilhante (2001), Crowe emplacou mais um personagem forte, defendido de forma impetuosa pelo ator. É verdade que Paul Bettany rouba a cena diversas vezes, fazendo um interessante contraponto ao personagem de Crowe. Mas nada que retire o protagonismo do Capitão. Além das interpretações, chama a atenção em Mestre dos Mares o cuidado com o som. O diretor Peter Weir resolveu não usar trilha sonora em boa parte do filme, caprichando nos efeitos sonoros do navio, deixando o espectador praticamente dentro do Surprise. A edição de som, inclusive, foi premiada pela Academia, assim como a Fotografia. Dois prêmios dentre as dez indicações que Mestre dos Mares emplacou em 2004.
+1
Os Miseráveis (Les Misérables, 2012)
Por Dimas Tadeu
Quando um diretor resolve querer aparecer mais que seu elenco, o resultado raramente é satisfatório. No caso da adaptação de Os Miseráveis para o cinema, Tom Hooper quase conseguiu sabotar seu elenco estelar. Quase. Os atores saíram com duas indicações ao Oscar (melhor ator e melhor atriz coadjuvante, que foi vencedora). No entanto, Russell Crowe não se safou tão bem: um grande injustiçado, só se falou em como ele atuava e cantava mal. O que pouca gente lembra é que ele estava fazendo aquilo “ao vivo”, com captação no estúdio e apenas uma base em piano num ponto eletrônico no ouvido, algo difícil até pra cantores profissionais. Além disso, o ator caiu bem no papel do vilão “eticamente obcecado” Javert, vestindo o personagem tão bem quanto o figurino e nunca parecendo deslocado (o que acontece com Sacha Baron Cohen e Helena Bonham Carter, por exemplo). Por tudo isso, esse é não apenas um dos destaques ignorados na carreira de Crowe, mas também um de seus trabalhos mais dedicados e interessantes.
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