A inglesa Tilda Swinton é, provavelmente, a andrógina mais famosa de Hollywood nos dias atuais. Não apenas é dona de um semblante extravagante, que chama a atenção por onde passa e serve como uma excelente condutora de tendências da moda, a intérprete é, com certeza, uma das melhores atrizes de sua geração. E o que diz isto não é apenas o Oscar por sua atuação em Conduta de Risco (2007). Tilda é daquelas que trafegam por todos os gêneros e tem êxito em todos eles. Sua androginia, inclusive, lhe valeu o papel do Arcanjo Gabriel na adaptação da HQ Constantine (2005) ou como a Anciã em Doutor Estranho (2016) – no original, o personagem se chamava ‘o Ancião’! Neste dia 5 de novembro a atriz comemora mais um aniversário. Para celebrar uma carreira tão recheada de sucessos, seja de público ou de crítica, a equipe do Papo de Cinema resolveu eleger seus cinco melhores filmes – e aquela produção do início de carreira que merece ser lembrada.
Orlando: A Mulher Imortal (Orlando, 1992)
Por Danilo Fantinel
Pouco depois de atuar na montagem contemporânea e minimalista de Eduardo II (1991), Tilda Swinton surpreendeu a todos ao emprestar sua beleza andrógina e sua interpretação refinada a Orlando, o nobre britânico que em 1600 é recomendado pela Rainha Elizabeth I a não envelhecer. De fato, o personagem lançado por Virginia Woolf no livro homônimo em 1928 mantém sua juventude por quatro séculos. Um dia, durante uma viagem à Turquia, acorda mulher. “A mesma pessoa. Nenhuma diferença. Apenas um sexo diferente”, explica Orlando diretamente ao público em um dos seus vários contatos visuais com a câmera. Com noção absoluta sobre a envergadura psicológica da figura criada por Woolf, Tilda leva adiante a mudança de gênero sexual ocorrida sem deixar transparecer a menor alteração da essência humana de Orlando – muito embora a personagem expresse livremente os novos desejos e anseios decorrentes de sua nova conjuntura física. No filme de Sally Potter, somos convidados por Orlando a compartilhar sua busca por companhia em uma eterna celebração à literatura, à poesia, ao texto clássico e às tradições da realeza, que chegam ao presente em livro biográfico escrito justamente pela enigmática nobre imortal.
Até o Fim (The Deep End, 2001)
Por Robledo Milani
Tilda Swinton é uma das personalidades mais exóticas de Hollywood. Desde as parcerias com o polêmico Derek Jarman até o Oscar por Conduta de Risco (2007), passando pelo cultuado Orlando (1992) e pelo blockbuster As Crônicas de Nárnia: O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa (2005), sua presença sempre chamou atenção pelo visual extravagante, pelo olhar hipnotizante ou pela postura decidida. E talvez por isso o prazer de assisti-la em Até o Fim seja tão grande. Pois aqui a vemos desligada dessa imagem que marcou sua persona cinematográfica. Margaret, sua personagem, é uma mãe de família preocupada apenas com o hoje, tentando manter as coisas sob controle enquanto o marido, que trabalha numa estação petrolífera, constantemente se ausenta por semanas. Seu mundo começa a desabar quando o filho adolescente se torna vítima de uma chantagem. O rapaz é acusado de ter assassinado o próprio amante, colocando em discussão temas como homossexualidade, preconceito e falsas verdades. Mas este intenso thriller, premiado no National Board of Review, em Sundance e que rendeu para a atriz sua primeira indicação ao Globo de Ouro, está longe de ser didático ou superficial. Denso e provocador, trata-se de uma obra discreta que surpreende como poucas, muito em parte pelo excelente desempenho da protagonista.
Conduta de Risco (Michael Clayton, 2007)
Por Rodrigo de Oliveira
Conduta de Risco é o típico filme que deve ser degustado lentamente, ao contrário da grande parte de produções que são jogadas na nossa frente, sem necessidade de uma maior reflexão. Ponto para George Clooney, em trabalho relevante e cerebral, e para Tilda Swinton, que garantiu seu primeiro Oscar com uma performance irretocável. O filme conta a história de Michael Clayton (Clooney), um advogado que arruma as bagunças que, por ventura, surgem no escritório em que trabalha. Quando um de seus colegas surta durante um depoimento importante, é ele quem é chamado para ajeitar as coisas. Ao descobrir a verdade sobre os fatos, Clayton acaba mudando de lado, o que faz com que a executiva da empresa, Karen Crowder (Tilda), intervenha. A atriz é hábil ao mostrar que até o tradicional e frio executivo possui inseguranças, trecho apresentado de forma inteligente pelo diretor Tony Gilroy ao estabelecer um paralelo entre o momento de uma entrevista importante e o ensaio solitário. É interessante notar a meticulosidade da personagem, que escolhe muito bem suas palavras antes de proferi-las. Isso, claro, quando ela tem tempo para pensá-las. Para aquele mundo, parecer saber o que está falando é muito mais importante do que saber realmente.
Um Sonho de Amor (Io Sono L’amore, 2009)
Por Matheus Bonez
Tilda Swinton já havia provado seu talento inúmeras vezes, porém aqui ela se supera ao adotar a língua italiana para compor sua personagem, uma russa que cuida de uma tradicional família toscana. Presa às convenções de que as mulheres devem prezar pelos seus homens (neste caso, seu marido e os filhos), sua Emma se descobre, aos poucos, uma matriarca sem grandes motivações. Até, é claro, aparecer a possibilidade de um novo amor. O diretor Luca Guadagnino explora a temática, tão batida, com um novo frescor, adentrando os cômodos da casa e, obviamente, a intimidade de seus personagens, assim também dissecando a alta sociedade. Porém, é Tilda quem sustenta um filme que já é belo por natureza. Com sua presença de tela e as nuances que sua personagem atinge ao longo da exibição, a intérprete faz com que qualquer um se apaixone e compreenda quem é a Emma de verdade.
Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin, 2011)
Por Dimas Tadeu
Há quem especule que Tilda só não foi indicada ao Oscar por Precisamos falar sobre o Kevin porque isso tiraria completamente as chances de Meryl Streep e sua dama de ferro de levar o prêmio. Teorias da conspiração à parte, não é muito difícil entender o porquê. Num dos melhores papeis de sua carreira, a atriz está perfeita em cada plano, entregando uma Eva de profundidade oceânica e complexidade cabalística. É impossível não se perder em sua personalidade. A montagem alinear só contribui para que o efeito se torne mais caleidoscópico: imagens de uma personagem alegre, inconsequente e jovial vem praticamente justapostas a uma personalidade decadente e amargurada, de uma mulher que perde muito mais do que os cabelos compridos. Um dos melhores papéis da carreira da atriz (indicada ao Globo de Ouro), que merece ser visto e revisto.
+1
Eduardo II (Edward II, 1991)
Por Renato Cabral
Talvez, se não fosse pelo diretor britânico Derek Jarman, este 5+1 nem existiria. Mentor e incentivador de Tilda, o realizador foi a pessoa que deu a atriz seu primeiro papel no cinema e a impulsionou a atuar cada vez mais. Logo, é mais do que necessário citarmos e retomarmos essa parceria, quase uma obrigação. Juntos, Tilda e Jarman realizaram diversas produções e se tornaram amigos íntimos, até a prematura morte do diretor em 1994. Com sua estética avant garde e experimental, ele conseguiu capturar um dos momentos mais espetaculares da carreira da atriz em Eduardo II (1991). Na pele da rainha Isabella, a intérprete entrega a performance de uma esposa diplomática e traída pelo personagem-título, o rei Eduardo. A traição que envolve bem mais que poder, tem seu auge na história de amor gay do monarca por um nobre. Difícil de sintetizar a excepcional parceria de diretor e atriz em apenas uma produção, mas encontramos aqui ambos em perfeita sintonia e também um trabalhos mais bem acabados de Jarman que mistura, na direção de arte, o medieval com o contemporâneo. O filme é considerado um dos clássicos do Novo Cinema Queer e deu a Tilda o prêmio Volpi de Melhor Atriz no Festival de Veneza de 1991.
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