Marco Antonio – ou, apenas, Toni – Servillo é, indiscutivelmente, um dos maiores nomes do cinema italiano contemporâneo. O resto do mundo o descobriu a partir do protagonismo de A Grande Beleza (2013), de Paolo Sorrentino, que ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e mais outras inacreditáveis sessenta (!) estatuetas ao redor do planeta. Mas, em seu país de origem, sua fama e talento já vinha obtendo reconhecimento desde muito antes. Nascido em 09 de agosto de 1959, possui até o momento mais de cinquenta créditos no cinema e na televisão, além de uma carreira consagrada também nos palcos. Na tela grande, já trabalhou sob o comando de mestres como Marco Bellocchio, Matteo Garrone, Mario Martone, Gabriele Salvatores, Roberto Andò e muitos outros. Vencedor de nada menos do que quatro David di Donatello – o ‘Oscar’ da Itália – soma também dois troféus do European Film Awards, sete entregues pelo Sindicato dos Jornalistas de Cinema Italianos e prêmios oferecidos pelos festivais de Veneza, Locarno, Roma, Bastia e Sevilha, só para citar os mais conhecidos. Atualmente em cartaz no Brasil com o elogiado A Estranha Comédia da Vida (2022), no qual vive o escritor Luigi Pirandello, Toni Servillo é praticamente uma unanimidade. Mesmo correndo o risco de deixar muita coisa boa de fora, assumimos o desafio e apontamos, a seguir, os cinco filmes imprescindíveis do ator, e mais uma pérola um tanto desconhecida, mas que merece uma segunda chance. Confira!
As Consequências do Amor (La conseguenze dell’amore, 2004)
Toni Servillo é fiel aos seus parceiros artísticos. Mario Martone e Roberto Andò são alguns dos cineastas que volta e meia podem se dar o luxo de contar com o astro no elenco de suas produções. Assim como eles, Paolo Sorrentino tem no ator um dos seus ‘musos’. Os dois trabalharam juntos pela primeira vez no longa de estreia do cineasta, L’uomo in più (2001), mas foi somente nessa segunda incursão que a afinidade entre eles se manifestou com maior força. Em cena, Servillo é Titta Di Girolamo, um homem dominado pelo tédio, como se estivesse eternamente à espera por algo que nunca chega até ele. Tudo é sempre igual em sua rotina, até o dia em que resolve trocar mais do que uma ou duas palavras com uma funcionária do hotel onde mora. A partir desse envolvimento, uma série de eventos tomará conta de sua existência, a ponto de não mais se reconhecer. Exibido na mostra competitiva oficial do Festival de Cannes, foi premiado como Melhor Filme, Direção e Roteiro no David di Donatello, além de ter garantido à Servillo o primeiro dos seus troféus como Melhor Ator do ano.
O Divo (Il Divo, 2009)
Não demorou muito para que Servillo e Sorrentino voltassem a unir forças. Entre este e As Consequências do Amor, os dois fizeram Sabato, Domenica e Lunedi (2004), refilmagem do clássico de Eduardo De Filippo encomendada pela televisão, e justamente por isso, pouco conhecida no Brasil. Porém, com O Divo, o mundo inteiro parou para prestar atenção no que a dupla estava fazendo. Indicado ao Oscar de Melhor Maquiagem, tal reconhecimento foi mais do que necessário pelo extenuante trabalho de caracterização do protagonista, Toni Servillo, que em cena se transformou no político italiano Giulio Andreotti, que foi primeiro-ministro da Itália nada menos do que sete vezes desde a redemocratização do país, em 1946. Este verdadeiro épico ganhou o Prêmio Especial do Júri no Festival de Cannes e nada menos do que sete estatuetas no David di Donatello, entre elas – é claro – a de Melhor Ator, mais uma vez para Servillo. Sorrentino voltaria a convocar o seu ator preferido em outra cinebiografia de uma importante – e controversa – figura política, o primeiro-ministro Silvio Berlusconi, em Silvio e os Outros (2018), noutra impressionante transformação do ator.
A Grande Beleza (La grande bellezza, 2013)
Um é pouco, dois é bom… e, pelo jeito, três é melhor ainda! Sorrentino e Servillo conquistaram o mundo com essa nova parceria. Como Jep Gambardella, Servillo reviveu um sentimento há muito perdido, com alusões ao clássico A Doce Vida (1960), de Federico Fellini. Desfilando com uma imperturbável familiaridade por alguns dos cenários mais estonteantes de uma Itália perdida no tempo, Servillo faz de Gambardella o seu personagem-assinatura, o mais icônico, aquele pelo qual será lembrado até o final de sua (não menos impressionante) carreira. Além do Oscar, o longa ganhou ainda o Bafta, o Globo de Ouro e o Prêmio Guarani, oferecido aqui pelo Papo de Cinema, enquanto que seu protagonista somou à sua extensa lista de premiações outro David di Donatello, o European Film Award e o Golden Ciak (Itália), entre outros.
A Mão de Deus (È stata la mano di Dio, 2021)
Sorrentino voltou a ser indicado ao Oscar quase dez anos após sua vitória, e dessa vez por uma obra semi-autobiográfica, que narra a história de um menino na tumultuada Nápoles dos anos 1980, quando sua vida enfrenta diversas transformações ao mesmo tempo em que o maior ídolo do futebol em todo o mundo acaba de se mudar para a sua cidade, realizando um sonho quase inacreditável. Dessa vez Toni Servillo aparece não como protagonista, mas como o pai desse, uma presença tão fundamental para a jornada do herói que, mesmo quando ausente, acaba por se mostrar determinante nas decisões do jovem. Indicado ainda ao Bafta, ao Critics Choice, ao Globo de Ouro e ao European Film Awards, A Mão de Deus rendeu a Toni Servillo sua primeira indicação ao David di Donatello como Ator Coadjuvante (e a décima primeira de toda a sua carreira), comprovando a versatilidade do intérprete quando em função de uma narrativa familiar e cativante.
A Estranha Comédia da Vida (La Stranezza, 2022)
Personagens reais nunca faltaram à filmografia de Toni Servillo, e dessa vez ele acrescenta mais um de destacada relevância: o escritor Luigi Pirandello, vencedor do Prêmio Nobel e um dos maiores nomes da cultura italiana em todo o mundo. Aqui, no entanto, ele é visto em um momento de crise: indeciso sobre qual será sua próxima obra, acaba se envolvendo com uma dupla de agentes funerários apaixonados pela dramaturgia. Vê-los em cena será suficiente para reacender a criatividade do autor, além de lembrá-lo de outras paixões há muito esquecidas. Eleito o “Filme do Ano” pelo Sindicato dos Jornalistas de Cinema da Itália, A Estranha Comédia da Vida parte de um episódio verídico para traçar uma história de fantasia e reflexão, combinando elementos reais com outros apenas imaginados, sempre pontuados por um bom humor inesperado – e contagiante. O filme marcou também a terceira colaboração entre Servillo e o diretor Roberto Andò – os dois fizeram juntos antes a comédia Viva a Liberdade (2013) e o suspense As Confissões (2016).
+1
O Labirinto (L’uomo del labirinto, 2019)
Mesmo com todo sucesso e popularidade que desfruta, Toni Servillo ainda não chegou a se aventurar em uma produção internacional – ou quase isso. Afinal, o mais perto que chegou de uma experiência desse nível foi neste thriller escrito e dirigido por Donato Carrisi e que conta com o ator como protagonista ao lado de ninguém menos do que o hollywoodiano Dustin Hoffman! Os dois aparecem como dois homens – um investigador profissional (Servillo), o outro um psicólogo renomado (Hoffman) – em busca de uma garota desaparecida, em um mistério de muitas – e inesperadas – surpresas. A combinação entre italiano e inglês nem sempre funciona de acordo com o esperado, mas a investida não deixa de ter méritos, e justamente por isso talvez mereça uma segunda chance, se não pelas histórias dos bastidores (há boatos de que os dois atores não se entenderam bem durante as filmagens), mas, sim, pelos diferentes estilos de interpretações que desfilam em cena, em um embate de curiosa sintonia. Carrisi, aliás, é diretor também de A Garota na Névoa (2017), outra trama policial também estrelada por Servillo – menos ousada, mas eficiente dentro do gênero a que se propõe.
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