5+1 :: Vittorio De Sica

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Vittorio De Sica não é apenas um dos mais importantes cineastas do Neorrealismo Italiano. Sua carreira, longeva, cheia de filmes inesquecíveis e premiadíssimos, o colocam no rol dos maiores diretores da história do cinema. Começando como ator, o italiano nascido em Lazio em 7 de julho de 1901 teve trajetória forte na frente das câmeras até decidir mudar de lado e dividir seu olhar realista com o público. Oito anos depois de ter iniciado seus trabalhos como cineasta e já assinava uma de suas obras-primas, um dos principais títulos do Neorrealismo Italiano: Ladrões de Bicicleta (1948). Vencedor de um Oscar honorário e indicado como Melhor Roteiro, o filme mostrava a dura realidade da Itália pós-guerra e mostrou ao mundo o talento de Vittorio De Sica.

Com passagens vitoriosas em festivais como Veneza, Cannes, Berlim, sem contar as diversas indicações e louros no prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas e no David Di Donatello (o Oscar da Itália), De Sica é, até hoje, mais de quarenta anos após sua morte, um dos mais cultuados cineastas de todos os tempos. Para a nossa homenagem no 5+1 desta semana, resolvemos escolher os títulos que fizeram bonito em suas passagens pelos festivais de cinema e premiações ao redor do mundo. Temos aqui três premiados no Oscar, um vencedor em Cannes, dois vencedores do David Di Donatello e outros festivais importantes. Confira nossa lista e faça a sua própria. Filmes memoráveis é que não faltam na carreira deste grande ator e cineasta.

 

Ladrões de Bicicleta (Ladri di Biciclette, 1948)
O que seria do neorrealismo italiano sem esta obra de Vittorio De Sica? Uma das referências máximas do movimento, este longa é um retrato cru e realista da Itália destruída após as duas guerras mundiais que levaram à falência do país. O desemprego e as ruas sujas dominam a tela, as pessoas vivem à flor da pele no desespero de conseguirem se manter ou simplesmente sobreviver. Assim seguimos a história de Antonio Ricci (Lamberto Maggiorani), pai que faz de tudo para sustentar sua esposa, Maria Ricci (Lianella Carell) e seu filho Bruno (Enzo Staiola). Eis que ele consegue um emprego de colar cartazes de filmes do Cinema de Roma. E eis que vem o título que dá todo este sentido à história: seu meio de transporte, a bicicleta, é roubada logo no início da narrativa, o que o deixa na corda bamba do emprego. A trajetória para conseguir o veículo de volta é uma batalha tão grande quanto a própria miséria em que o personagem se encontra, expondo o pior e o melhor do ser humano. Tarefa que apenas um cineasta com olhar crítico consegue imprimir com alma. – por Matheus Bonez

 

Milagre em Milão (Miracolo a Milano, 1951)
Vittorio De Sica faz da tragédia comédia neste marcante conto urbano do neorrealismo italiano que, curiosamente, aposta alto no humor, no pensamento mágico e na poesia visual para criticar a falência social, comentar a luta de classes e fazer um elogio ao humanismo. No paupérrimo pós-guerra milanês, o menino Totò (Francesco Golisano) perde a mãe adotiva e acaba sem-teto. Após crescer em um orfanato, organiza uma comunidade pobre nos arredores da cidade, tornando-se um líder naturalmente carismático apesar de sua visão ingênua sobre o mundo. A descoberta de água e petróleo no terreno desperta o interesse do mercado imobiliário, que decide expulsar os moradores do local. Porém, Totò recebe uma ajudinha do além para manter a esperança dos oprimidos. Com roteiro de Cesare Zavattini, a direção de De Sica garante que a disputa pela terra se torne uma comédia de fundo social com diversos pontos altos, incluindo a dança coletiva pelo sol no inverno rigoroso, uma tensa negociação entre investidores raivosos que acaba literalmente aos latidos, e a bela cena em que um faminto vendedor de balões flutua pelos ares de tão magro que está. Assim, o cineasta comprova que humor crítico é um teto onde sempre podemos nos abrigar. – por Danilo Fantinel

 

Duas Mulheres (La Ciociara, 1960)
Durante a Segunda Guerra Mundial, a bela Cesira (Sophia Loren), viúva e dona de uma mercearia, decide fugir dos bombardeios em Roma levando sua filha, Rosetta (Eleonora Brown), para Ciociaria, região onde nasceu. Lá elas enfrentarão todas as dificuldades do conflito ao lado de outros refugiados. Grande nome do neo-realismo italiano, o diretor Vittorio De Sica sempre flertou com um cinema mais comercial, e aqui esta faceta se torna ainda mais evidente, gerando uma mistura de estilos que funciona perfeitamente. O filme apresenta discursos sociais e políticos, especialmente através da figura do jovem de tendências comunistas interpretado por Jean-Paul Belmondo, mas de um modo bastante acessível, balanceando a narrativa entre o humor e o drama. Desta forma, De Sica transforma sua trama em um sensível conto sobre a perda da inocência, retratando os efeitos devastadores da guerra sobre as pessoas comuns. Outro ponto alto do trabalho do cineasta é a direção de atores, com destaque para a musa Loren. Sob o comando de De Sica, ela entrega uma atuação poderosa como uma mulher que faria qualquer coisa para defender sua filha, em um esforço que lhe valeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes e também no Oscar. – por Leonardo Ribeiro

 

Ontem, Hoje e Amanhã (Ieri, oggi, domani, 1963)
De Sica, cuja figura se destacou também à frente às telas – seu nome aparece nos créditos de mais de 160 produções entre 1917 e 1973 – foi também – e acima de tudo – um realizador de mão cheia. E após ter dado um Oscar para Sophia Loren (Duas Mulheres, 1960) e tê-la feito sua musa em títulos como O Ouro de Nápoles (1954) e O Condenado de Altona (1962), oferece a ela, enfim, o desafio final: viver as diferentes facetas da típica e múltipla mulher italiana em um mesmo projeto. A estrutura é a mesma de Boccaccio ’70 (1962) – em que ele ousou colocá-la como prêmio de uma disputadíssima rifa – porém sem colegas para dividir as responsabilidades dos episódios: Vittorio assume o comando pleno das três histórias sobre essas donas – sempre vividas por Loren – e os homens com quem se envolvem (invariavelmente sob o rosto de Marcello Mastroianni). A dupla de protagonistas deu tão certo que voltariam a atuar sob a batuta do cineasta em Matrimônio à Italiana (1964) e Os Girassóis da Rússia (1970), deixando claro quão bem o trio funcionava. Mas foi aqui esse primeiro passo, consagrado com o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e com o David (o Oscar da Itália) para os dois protagonistas! – por Robledo Milani

 

Matrimônio à Italiana (Matrimonio All’italiana, 1964)
Sophia e Marcello. Estes eram certamente os maiores atrativos para as audiências que lotavam as sessões do agridoce drama cômico Matrimônio à Italiana (1964), indicado aos Oscars de Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz. Ainda assim, trata-se de um filme do grande Vittorio De Sica, que aqui explana sua genialidade autoral na análise da tempestuosa relação entre uma prostituta e um playboy. Enquanto grandes eventos marcam a história mundial, o casal se dedica aos seus próprios problemas, como uma atração irresistível, crianças ilegítimas e um casamento fraudulento. De Sica, sempre genial na construção de personagens verossímeis e sofredores, ainda inclui nessa equação alguns sacrifícios, reconciliações e o tal casamento italiano do título, porém seus protagonistas não se aproximam do amargor e ressonância emocional de um par de ladrões de bicicletas ou um idoso e seu cachorro que vivem na rua, por exemplo. Aqui as atenções se voltam para Loren e Mastroianni, apresentados ao fim da vida enquanto rememoram – cada um em sua perspectiva particular – duas décadas do amor e ódio que os mantiveram sempre juntos. Eis um dos filmes mais indicados para introduzir alguém ao universo de De Sica, antes de seguir para outros de seus dramas mais pesados e realistas. – por Conrado Heoli

 

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Umberto D. (Umberto D., 1952)
Itália, esta constante promessa. Trinta anos como funcionário público do Ministério do Trabalho pareceriam suficientes para que Umberto Domenico Ferrari (Carlo Battisti) tivesse uma vida digna com a chegada da aposentadoria. Mas não na Europa dos anos 50, tomada pela grave crise econômica do pós-guerra. Sem conseguir pagar o aluguel do quarto em que mora, acompanhamos o protagonista caminhar pelas ruas da cidade em busca de dinheiro, vendendo de relógio a livros. No terno bem cortado de Umberto, resquícios de outra época. Sem família e abandonado pelos amigos, restou à figura do simpático cachorro Flike, companheiro durante as tristes peregrinações, o alento derradeiro por compaixão. Pouco conhecido, em especial se comparado ao icônico Ladrões de Bicicleta (1948), Umberto D. é um dos melhores filmes do neorrealismo italiano. Intenso e comovente, o longa passa ao lado do sentimentalismo e da pieguice, como muitos títulos do gênero, e se debruça sobre o drama social da época abordando a decadência por meio de um lirismo melancólico. – por Willian Silveira

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