Ator, roteirista, diretor, produtor. Warren Beatty já cumpriu todas as frentes possíveis no cinema, na maior parte das vezes, com louvor. Irmão mais novo da atriz Shirley McLaine e casado há mais de 20 anos com a também estrela Annette Bening, um detalhe curioso é que Beatty se igualou ao cineasta Orson Welles ao ser indicado ao Oscar no mesmo ano como ator, diretor, roteira e produtor pelos filmes O Céu Pode Esperar (1975) e Reds (1981).
Além de ter um Oscar em casa por seu trabalho como cineasta, o eterno Clyde já ganhou outras 38 estatuetas e foi indicado a 38 prêmios. Apesar de andar sumido desde o fracasso da comédia Ricos, Bonitos e Infiéis (2001), Beatty retorna aos cinemas em 2015 com um projeto ainda sem título. Enquanto aguarda o retorno do multifacetado astro, a equipe do Papo de Cinema resolveu homenagear o galã, que completa 77 anos no dia 30 de março de 2014, com seus cinco melhores filmes – e, é claro, aquele que merece ser redescoberto.
Por Marcelo Müller
Dois jovens reprimidos protagonizam Clamor do Sexo, clássico dirigido por Elia Kazan. A trama se passa em 1928, numa cidadezinha agrícola do Kansas. Bud Stamper (Warren Beatty, em sua estreia no cinema) é capitão do time da escola e sofre a pressão do pai, um homem bem-sucedido no ramo do petróleo, para que vá à universidade, para que “seja alguém”. Já Deanie Loomis (Natalie Wood) é cerceada pelos preceitos religiosos e morais de sua família. Estão apaixonados, mas acuados por esses elementos externos que tratam de diminuí-los enquanto gente, ceifando aos poucos o individualismo do pensar, do sentir e do fazer, se vêem impossibilitados de consumar o desejo sexual que existe entre eles e, portanto, se afastam. A separação traz consequências nefastas para ambos, sobretudo a Deanie, vítima de um colapso nervoso. Toda situação é agravada pela quebra da Bolsa de Valores de 1929. Tirando do casal a possibilidade do amor e do tesão, a sociedade americana se mostra em sua crueza mais primitiva, por meio da qual reduz o homem à sua profissão e a mulher à submissão. A crítica de Kazan é aberta e feroz. Grande filme.
Por Willian Silveira
Vitória da insistência do seu produtor contra a desconfiança da Warner Bros., Bonnie e Clyde conseguiu a árdua tarefa de fazer o cinema – que é tanto arte quanto negócio – pensar sobre si próprio. Inspirado na história real do casal de ladrões de banco Clyde Barrow e Bonnie Parker, o filme de Arthur Penn passou do possível fracasso apontado pelos executivos da produtora para exemplo de cinema moderno. Ao se desvincular das amarras dramatúrgicas tradicionais, como da necessidade de um protagonista em quem o público se reconheça, e se tornar o segundo maior sucesso da Warner, o filme abriu precedente para novas abordagens estéticas, o que culminaria na Nova Onda Americana (American New Wave), em clara referência à francesa, conhecida há pelo menos meia década. Responsável não apenas por assinar como produtor, Warren Beatty também interpretou Clyde de forma singular e marcante, visivelmente envolvente e complexo, a ponto de desestabilizar a cartilha de Hollywood à época. Seu esforço ao lado de Bonnie (Faye Dunaway) rendeu dois Oscars ao filme, tão justos quanto necessários.
Por Yuri Correa
Dirigido, escrito e protagonizado por Warren Beatty, tal qual alguns de seus mais apreciados filmes da época, Reds conta em seu elenco com Diane Keaton, Jack Nicholson, Gene Hackman e Maureen Stapleton (vencedora do Oscar por seu trabalho aqui), além de ter sua trilha composta por Sephen Sondheim – compositor vencedor do Tony e autor de musicais icônicos como Into the Woods, West Side Story e Sweeney Todd – e um trabalho de fotografia de Vittorio Storaro, responsável pela imagem de filmes como Último Tango em Paris (1972), Apocalypse Now (1979) e O Último Imperador (1987). E mesmo que já saindo com um currículo destes na mão, Reds ainda se mostra um filme sensível guiado por um personagem principal cheio de ideais, que nos conduz através de um dos muitos conflitos que acompanhou em sua carreira. Contando a história do jornalista e autor John “Jack” Reed (Beatty), o filme acompanha principalmente os bastidores de seu mais famoso livro, Os Dez Dias que Abalaram o Mundo, enquanto desenvolve seu relacionamento com a escritora e poeta Louise Bryant (Keaton), intervindo aqui e ali com depoimentos de personagens reais desta história, em um incrível toque de humanidade de seu diretor. Uma obra necessária.
Por Robledo Milani
Após provar que era mais do que um rapaz bonito com o oscarizado Reds (1981), o irmão mais novo de Shirley MacLaine passou seis anos sem filmar, apenas para retornar com a comédia Ishtar (1987), uma das maiores bombas de sua carreira. Para dar a volta por cima, o astro precisou ter muito cuidado em sua próxima escolha. Porém, ao invés de trilhar um caminho seguro, Warren Beatty apostou na inovação e investiu na realização de um sonho: a versão carne e osso das histórias em quadrinhos de Chester Gould, Dick Tracy. Sucesso desde os anos 1930, o detetive de capa amarela nunca havia recebido uma adaptação cinematográfica à altura do fenômeno popular que tantos conheciam e adoravam. Para tanto, Beatty se cercou dos melhores, com astros do calibre de Al Pacino e Dustin Hoffman em papéis secundários, uma fulgurante Madonna como femme fatale e um visual impressionante, que literalmente dava vida às tramas dos gibis. Como resultado, mais de US$ 100 milhões somente nas bilheterias norte-americanas e sete indicações ao Oscar, vencendo em três categorias. O Batman (1989) de Tim Burton pode ter chegado um ano antes, mas foi Dick Tracy que consolidou o universo dos heróis dos quadrinhos como uma opção viável também no cinema!
Por Rodrigo de Oliveira
Quando Bugsy foi indicado a 10 Oscars na festa da Academia em 1992, muitos apontavam o longa-metragem como o bicho-papão da premiação. Quem conhece a história sabe muito bem que apenas duas das dez indicações foram convertidas em louros (Direção de Arte e Figurino) em um filme que servia como veículo para Warren Beatty mostrar versatilidade como ator. O temperamento explosivo de Benjamin, mesclado ao seu bom coração, seriam material suficiente para isso. Por um lado, deu certo: o ator foi indicado a vários prêmios por sua interpretação. Por outro, a criação do personagem soa exageradamente falsa e, desde que o filme estreou, existe a dúvida se não pintaram Bugsy de forma romântica demais. Na trama, acompanhamos Benjamin “Bugsy” Siegel (Beatty) na principal empreitada de sua vida: construir um cassino hotel no deserto de Nevada, dando início a Las Vegas que conhecemos hoje. O elenco de apoio é cheio de nomes conhecidos e com boas performances, nenhum com muito tempo para expandir seus personagens. Annette Bening é a única que ganha espaço, mas não consegue sair da sombra de Warren Beatty. Se algo serviu para ambos, foi o casamento que se iniciou logo depois das filmagens e que permanece duradouro.
+1
Por Dimas Tadeu
Quase dez anos depois de convencer Hollywood de que não era só um rostinho bonito (com sua indicação ao Oscar de Melhor ator por Bonnie e Clyde) Warren Beatty se permitiu fazer o inusitado caminho contrário com a comédia Shampoo. Nela, o ator vive George, um cabeleireiro dos idos de 1969 que fazia a cabeça da mulherada, em mais de um sentido. O filme tem ares farsescos, de sátira social e não por acaso se passa na véspera da eleição que colocara Nixon no poder – uma sacada esperta do roteiro co-escrito por Beatty. Mas Shampoo marca mesmo pelo imaginário que criou: o personagem de Warren inspirou inclusive ícones da cultura pop brasileira, indo das pornochanchadas até o cabeleireiro Jacques Leclair, das novelas da Globo. Em Hollywood, o fascínio por esse universo é tanto que Trapaça (2013), que faz alusão direta a Shampoo (a festa com os “casais trocados” é praticamente a mesma), faturou 10 indicações ao último Oscar. Saiu sem nenhum, porque o estilo é datado, mas reconhecê-lo é essencial para entender a carreira de Beatty e uma importante parte da cultura pop atual.