Definitivamente, a Mulher Maravilha não tem sorte nas telas. Ícone do feminismo de apelo popular e primeira super-heroína a quebrar o tabu de que quadrinhos não são apenas “coisas de meninos”, a personagem não consegue ser lançada de forma decente nos dias de hoje para o cinema e a televisão. Digo isso porque a última tentativa, alguns meses atrás, foi de um episódio piloto para um novo seriado produzido pela Warner Bros – que acabou rejeitado pela NBC ao ver o resultado (escabroso, diga-se de passagem).
Sabe quando no primeiro minuto que coloca o olho em um filme, seriado, novela ou qualquer narrativa do gênero, você sente que vai dar tudo errado? Pois é assim que o projeto cancelado se mostra. Uma sucessão de erros que já começa pelo que deveria ser o principal – a escolha da atriz que encarna a amazona mais famosa do mundo. Adrianne Palicki, da série Friday night lights, foi a escolhida para viver a protagonista. Ok, ela é bonita – mas não linda. É sem carisma, despreparada e ainda falta o principal que qualquer Mulher Maravilha tem que ter: demonstrar a força da personagem.
Óbvio que a “trama” (se é que podemos chamar assim) não ajuda. O pretenso episódio começa com um rapaz dando a notícia para a família que ganhou uma bolsa de estudos. Em seguida, ele começa a ter um ataque e sangra pelo nariz, olhos, etc. Corta para a cena em que vemos um ladrão fugindo e, é claro, Diana, a princesa amazona, a nossa Mulher Maravilha, correndo atrás dele. Espere um minuto… Diana correndo atrás de quem? Da Mulher Leopardo? De Ares? Não, de um ladrão. Tem certeza? Já percebe-se que começa mal. Mas acalme-se, tudo pode piorar. Após a prisão do sujeito, descobrimos um pouco mais sobre a vida pessoal da heroína. Ela é a comandante das Indústrias Themyscira (?!?) que financiam seu combate ao crime com a venda de bonecas (!?!) e sua fiel escudeira, Etta Candy, é uma espécie de assistente ou secretária. Se ainda interessar, a Mulher Maravilha tem que descobrir o que sua concorrente, Veronica Cale, está fazendo para jovens como o do início do episódio estarem correndo risco de vida. Praticamente a “história” do totalmente esquecível Mulher-Gato, com Halle Berry e Sharon Stone, lembra?
O problema de adaptações é quando falta alguém com a cara dos seus personagens favoritos e também alguns conceitos-chave das histórias. Criada em 1941 pelo psicólogo William Moulton Marston, Diana é a princesa de Themyscira, ou Ilha Paraíso, filha da rainha das amazonas, Hipólita. Ela foi moldada em uma imagem de barro a qual cinco deusas do Olimpo deram vida e presentearam com superpoderes. Quando cresceu, participou escondida de uma competição entre as amazonas para saber qual iria ao “mundo dos homens” para espalhar uma missão de paz, bem como lutar contra o deus da guerra, Ares.
Amazonas. Themyscira. Ilha Paraíso. Deuses. Olimpo. Palavras-chave para se construir uma boa história de Diana que não foram nem um pouco aproveitados no seriado, que graças à Hera, não passou de um episódio. O contrário aconteceu com Smallville, que durou dez temporadas e contou a trajetória de Clark Kent até virar “o homem de aço”. Não sou fã do Superman e nem deste seriado, mas não tem como não dizer que ali sim foi feito um bom trabalho de adaptação em que os conceitos foram explorados ao máximo sem serem subvertidos.
O engraçado é saber que há dois anos a Mulher Maravilha – a personagem – teve uma animação lançada diretamente em DVD e que contou esta origem de forma excepcional, adaptada aos dias de hoje, com apenas uma mudança lá que outra. Mas como toda animação estrelada por uma mulher e voltada ao público masculino, ávido pelo reinado sombrio de Batman, pelas palhaçadas do Homem Aranha ou pela tecnologia do Homem de Ferro, este também não vingou.
O maior sucesso da personagem foi nos anos 1970, quando Lynda Carter, uma modelo recém iniciante como atriz, se transformou na amazona em três temporadas na televisão. O seriado era bobinho, mas começou muito bem com a origem da personagem e, mesmo com as tramas recheadas de nazistas e de soluções fáceis, a realmente linda Carter personificou a Mulher Maravilha como ninguém: além da beleza, estavam lá a inteligência, a meiguice, a ira guerreira e outros tantos atributos que cabem à personagem. Tudo talvez de forma limitada, até pela inexperiência da atriz na época. Porém, se Lynda se transformou num ícone de toda uma geração, a Mulher Maravilha alcançou uma popularidade a nível mundial como nunca.
Resta saber qual vai ser a próxima tentativa. Fica a dica para os produtores: pensem em Charlize Theron ou Jennifer Garner. Boas atrizes e com experiência em ação. Quem sabe uma delas se transforme na Mulher Maravilha do século XXI e nos faça esquecer desta bobagem de Indústrias Themyscira?
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